O bispo de Saurimo, José Manuel Imbamba, considerou que mais do que “a euforia dos 50 anos de independência” de Angola, o jubileu deve ser um momento de reflexão, porque “muitos problemas” que se deviam resolver com a independência não estão ainda resolvidos.
Por Orlando Castro (*)
Em declarações à Lusa, José Manuel Imbamba diz que “o jubileu de 50 anos deve ser um jubileu de viragem, de um novo recomeço do país e de reflexão. Mais do que vivermos a euforia da festa em si, é um momento de reflectirmos, porque muitos problemas que a independência devia resolver, ainda não resolveu”.
Para o bispo, também presidente da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), é preciso que os angolanos se sentem e analisem porque é que Angola libertada há 50 anos (sempre nas mãos do MPLA, recorde-se) “ainda continua prostrada, ainda continua a não saber dar o melhor para os seus filhos e filhas, ainda não consegue unir os seus filhos, ainda não consegue ter uma linguagem comum de nação”.
Questionado sobre o que seria já alcançável nestes 50 anos de independência e ainda não foi, o presidente da CEAST enumerou “a vitória sobre a pobreza, a intolerância, a discriminação partidária, as assimetrias sociais e culturais que ainda existem”.
“É muita coisa que tínhamos que já ter ultrapassado, mas que ainda nos colocam de costas viradas para o futuro”, citou.
José Manuel Imbamba disse que a igreja como “um instrumento de salvação, que abre consciências, abre inteligências” jogou um papel fundamental “na criação do próprio nacionalismo antes da independência”.
“Basta ver que os fundadores dos movimentos de libertação de Angola todos são filhos de igrejas, protestantes e católicos”, referiu.
O bispo destacou ainda que “o anúncio do Evangelho é por si libertador e por isso a igreja jogou um papel muito importante, nesta luta pela independência, pela liberdade e continua a fazê-lo”.
Segundo José Manuel Imbamba, a independência é um trabalho contínuo, de afirmação, de desenvolvimento, de satisfação, de construção do bem comum e de elevação da dignidade da pessoa humana.
“Por isso, é um trabalho contínuo que continuamos a fazer como Igreja. E, neste quadro concreto, muitos padres, muitos cristãos, deram o melhor de si para que Angola pudesse hoje ascender à independência e assim poder viver como um país soberano”, afirmou.
O prelado realçou que a Igreja está a organizar, no âmbito dos 50 anos de independência, que se assinalam no dia 11 de Novembro, um Congresso Nacional da Reconciliação, com o objectivo de “na diversidade política, social e cultural”, olhar para Angola enquanto “casa de todos”.
“Por isso, nós não queremos só ficar na exaltação pela exaltação, mas fazer o exame de consciência, para ver se de facto o meu contributo como cidadão está a ser útil e fecundo para o bem do país que nós queremos construir, por isso é orando, é reflectindo, auto criticando-nos para assumirmos um compromisso sério e responsável pela nação e por todos angolanos”, frisou.
Olhar para os próximos 50 anos de Angola “é um sonho” que “nunca deve ser pessimista”, observou o bispo.
“Nós somos a esperança, e a esperança leva-nos exactamente a essa realidade nova, a esta Angola nova, esta Angola irmanada, Angola desenvolvida, Angola de paz, Angola onde todos nós nos sintamos úteis e necessários para a sua a formação de construção contínua”, disse José Manuel Imbamba, a propósito do futuro do país nas próximas cinco décadas.
Os bispos católicos angolanos manifestaram-se no passado dia 17 de Setembro preocupados (quem diria não é senhores prelados?) com o agravamento da pobreza em Angola (o reino que o MPLA gere há 50 anos “só” tem 20 milhões de pobres), considerando que os tumultos registados em Julho passado “revelaram buracos sociais, familiares e institucionais muito profundos” que devem despertar o país para “urgente transformação”.
Na sua qualidade de presidente da CEAST, José Manuel Imbamba, afirmou que “não podemos fechar os olhos à realidade do nosso país, marcada ao mesmo tempo por avanços significativos e recuos assustadores. No meio de tantas coisas boas e dignas de aplausos que temos vindo a fazer, assistimos, todavia, com preocupação, à persistência e ao agravamento da pobreza das famílias angolanas, um flagelo que atinge a dignidade de muitos dos nossos concidadãos”.
Para o arcebispo angolano, a pobreza em Angola, “infelizmente, não é apenas material”, mas “é também, e sobretudo, social, política, cívica, cultural e espiritual, minando a confiança nas instituições e no futuro”. Por culpa de quem? João Lourenço garante que o “MPLA fez mais em 50 anos do que os portugueses em 500”…
Em declarações na abertura da II Assembleia Plenária da CEAST, que decorreu no Santuário da Muxima, Diocese de Viana, José Manuel Imbamba referiu que a sociedade angolana, maioritariamente jovem, é marcada por um “acentuado estado de ansiedade, medo, incerteza e frustração”.
Assinalou também que a situação deriva da falta de emprego, de iguais oportunidades e das assimetrias abismais que ser registam em Angola. Isto porque, recordamos nós ao presidente da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé, o MPLA fez com que Angola, um país rico, em vez de produzir riqueza tenha produzido milionários.
“A instabilidade social e a falta de perspectivas para os jovens têm gerado um sentimento de desesperança e irreverência”, salientou o religioso, para quem os tumultos “revelaram buracos sociais, familiares e institucionais muito profundos”.
“Esses tumultos devem despertar-nos e empenhar urgentemente na transformação interior, para que o diálogo entre os governantes e governados seja mais frequente, justo e frutuoso, evitando o uso exagerado e desproporcional da força”, apelou.
José Manuel Imbamba (condecorado por João Lourenço com a medalha Paz e Desenvolvimento) recordou que o país celebra os 50 anos de independência, um momento que considerou propício para uma mudança urgente e necessária de atitudes e de mentalidade.
“Não basta mudar e renovar as estruturas, é preciso mudar, sobretudo, o coração e a mente das pessoas (…). Daí, o exame de consciência nacional que se impõe enquanto famílias, governantes, legisladores, magistrados, políticos, jornalistas, funcionários, intelectuais, religiosos e cidadãos”, notou.
Segundo o presidente da CEAST, Angola, com toda a exuberância do mosaico cultura que os seus filhos e filhas ostentam, “merece este compromisso co-responsável” que implica a incorporação contínua, corajosa e dedicada de atitudes transformadoras, motivadoras e enriquecedoras.
No seu olhar sobre a realidade sociopolítica e económica do país, o também arcebispo de Saurimo apelou à instauração, em Angola, de uma nova cultura social e política, baseada na ética, na solidariedade efectiva e na responsabilidade partilhada.
Observou, contudo, que, para isso, são necessárias “reformas profundas no aparelho do Estado, que deve estar exclusivamente ao serviço da cidadania e da prossecução do bem comum para a felicidade e dignificação de todos”.
“É nosso dever apelar e educar para a cultura da paz, da justiça, da reconciliação e da tolerância. As soluções não virão de fora, mas de um compromisso sério de todos nós, enquanto angolanos”, concluiu.