Um primeiro módulo, diz-se, da refinaria de Cabinda será inaugurado amanhã por João Lourenço, cuja propaganda afirma que se trata de um bem em benefício de Cabinda, o que não passa de uma mentira grosseira e de uma operação de charme eleitoral que será certamente acompanhada de outras acções que visam embalar e cegar a população do território.
Por Osvaldo Franque Buela (*)
Sim, optei por não me calar sobre este assunto, porque como qualquer cidadão, tenho o direito de me expressar ou de me calar, cuidando para que o nosso silêncio não seja um silêncio culpado, uma marca de desespero, nem um sinal de impotência perante uma situação política no território considerada demasiado perigosa para quem pensa diferente, num regime político onde a liberdade de expressão é limitada, posso compreender que o silêncio também pode ser uma questão de sobrevivência, porque falar pode ter consequências nefastas para o cidadão cabinda e para a sua família.
Se esta infra-estrutura dispendiosa e simbólica, importante para o território, tivesse sido pensada e projectada para ser um bem para o território, o governo teria tido o cuidado de seleccionar futuros engenheiros na província e enviá-los para formação, o que deveria reforçar as capacidades dos executivos nacionais na manutenção e bom funcionamento desta ferramenta económica… mas nada.
Esta refinaria, embora construída nas nossas terras, é propriedade de investidores privados que não nos vieram ajudar por causa dos nossos belos olhos ou da nossa pobreza, utilizará o nosso petróleo e não sei se este petróleo será comprado a preço de mercado ou doado gratuitamente para que os verdadeiros proprietários recuperem rapidamente o seu investimento, é mais uma grande fraude económica aos cofres do Estado cujo petróleo continua a ser a única fonte de segurança para as dívidas do regime, como estamos habituados com este governo.
Tendo em conta o acordo financeiro assinado para esta refinaria, e de um ponto de vista jurídico e político, a refinaria de Cabinda não é propriedade do povo cabindense, mas sim do regime angolano do MPLA, pois Angola, como Estado soberano e internacionalmente reconhecido, exerce a sua soberania sobre a sua colónia, o território de Cabinda. Neste contexto, não é necessário recordar aqui que todos os recursos naturais e infra-estruturas construídos neste território, incluindo os campos petrolíferos e a refinaria, são considerados propriedade do regime angolano, através de acordos financeiros com os seus parceiros estrangeiros, e geridos pelas suas instituições, como a Sonangol e outras empresas de fachada.
Concebida sem a participação dos cidadãos de Cabinda, a quem foi negado o acesso a qualquer documento sobre o impacto ambiental do projecto, a refinaria resulta de uma parceria público-privada cujo menor accionista é o regime, através da Sonangol, e o maior accionista é a investidora Gemcorp, com sede em Londres é a proprietária legal da infra-estrutura, e não a população local.
O povo cabindense só ganhará alguns magros benefícios em termos de empregos como mão-de-obra não qualificada, mas de onde vem o gasóleo e o resto das finanças, não haverá cabindenses porque estas posições já estão reservadas para angolanos que virão de outras cidades, e quero aqui dizer que não sou contra estes angolanos que vão ser recrutados fora de Cabinda para virem trabalhar, é o sistema colonial que funciona assim.
O outro benefício para a população cabindense seria pagar um preço elevado pelo litro de gasóleo, preço que os próprios angolanos recusaram através da manifestação dos táxis, cujas mortes e prisões arbitrárias ainda não são totalmente conhecidas e cujas consequências ainda são visíveis e trágicas no seio das famílias angolanas que não querem este aumento brutal do preço dos combustíveis.
Incapaz de lançar a verdadeira diversificação da economia, como prometido durante as campanhas eleitorais, o incompetente presidente do MPLA (Partido Nacional de Angola) associa esta refinaria, que não é propriedade do Estado angolano, a uma estratégia nacional e emocional para embalar o povo cabinda e limpar a imagem de um presidente cuja população vomitou.
O seu objectivo não é reduzir a dependência do país de produtos petrolíferos refinados importados, aumentando a sua capacidade de produção local, como tentam fazer-nos crer, porque até lá, ninguém sabe quando será produzido o primeiro litro de gasóleo e onde será vendido.
Em Cabinda, nada nos pertence. A nossa identidade é cada vez mais sufocada pelo desejo de a espezinhar. Sem uma política de promoção, a nossa cultura sofre um choque de substituição por culturas vindas do exterior e incentivadas pelo regime colonial do MPLA. A nossa soberania é usurpada, a nossa própria história não é ensinada e, por vezes, acreditamos que até o ar que respiramos vem de Luanda, devido ao facto de, por vezes, se tornar mais difícil aos cabindenses respirar e circular livremente no território sem serem surpreendidos por uma patrulha das forças de ocupação…
Tudo isto com o único objectivo de lavar a imagem de um presidente incompetente, cada vez mais distante do coração do seu próprio povo, imagem que, mesmo depois de gastar milhões de dólares, já não encontra brilho, nem detergente capaz de a fazer brilhar…
Enquanto aguardamos pelo primeiro litro de gasóleo, que Deus abençoe Cabinda e que o seu povo, sobretudo a sua juventude, não caia na ilusão óptica de inaugurações sem impacto directo na vida dos cidadãos…