10% DAS CRIANÇAS TÊM AULAS DEBAIXO DA MANGUEIRA

Na versão oficial do Governo, cuja credibilidade é duvidosa, um em cada dez estudantes angolanos do ensino primário tem aulas ao ar livre, sendo as províncias do Cunene e da Huíla as que mais alunos têm nestas condições, segundo estatísticas do Ministério da Educação. E Angola é (supostamente) independente e tem no Poder, há 50 anos, sempre o mesmo partido, o MPLA.

Segundo o Anuário Estatístico da Educação 2022/2023, divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística e elaborado pelo Gabinete de Estudos, Planeamento e Estatística (GEPE) do Ministério da Educação, foram matriculados no ano lectivo de 2022/2023 um total de 8.800.047 alunos, mais 3,8% face ao ano lectivo anterior, sendo o ensino primário o que concentra mais estudantes (61,2% do total, mais de 5 milhões de crianças).

No que concerne à distribuição por níveis de ensino, na classe de Iniciação estavam matriculados 824.628 alunos, no Ensino Primário 5.383.867 alunos, no I Ciclo do Ensino Secundário 1.631.988 e no II ciclo do Ensino Secundário 959.564 alunos, de acordo com o documento consultado pela Lusa.

O anuário constata uma “nítida concentração dos alunos” matriculados na educação não superior em Angola nas províncias de Luanda, Benguela, Huambo, Huíla, Uíje, Bié, Cuanza Sul e Malanje, que absorveram 75,4% do total dos alunos, estando os restantes distribuídos por outras dez províncias.

Angola contava nesse ano com 12.967 escolas, maioritariamente do ensino público (8.666 escolas), concentradas essencialmente em oito províncias: Luanda, Huíla, Benguela, Huambo, Bié, Uíge, Malanje e Cuanza Sul.

Acolhiam o ensino primário 8.261 escolas, com 62.395 salas de aula, de um total de 107.962 salas de aula em funcionamento. Do total de escolas do ensino primário, com 109.142 turmas, 11.849 tinham aulas ao ar livre (10,9%).

Luanda, com zero crianças ao ar livre, era a excepção entre as províncias enquanto Cunene (38,3%) e Huíla (23,2%) eram as que tinham mais alunos fora da sala de aula, indica o anuário consultado pela Lusa.

No caso do I ciclo do ensino secundário existiam apenas 838 turmas ao ar livre (1,4% do total) e uma percentagem residual de 0,12% no II ciclo (33 turmas num total de 26.416)

Os dados revelam também um número de professores insuficientes para os alunos, já que os 205.784 professores que leccionaram no ano 2022/2023, concentrados sobretudo no ensino primário (47%), tinham uma média de 40 alunos.

O rácio era superior no ensino primário (56 alunos por professor), diminuindo para 45 alunos na classe de iniciação e descendo significativamente no I ciclo do ensino secundário (29 alunos) e no II ciclo (27 alunos).

Em termos de aproveitamento, os alunos da iniciação tinham a maior taxa de aprovação (90%), seguindo-se o ensino primário (75% de alunos aprovados), números que decresciam nos ciclos seguintes de aprendizagem (72% no I ciclo e 70% no segundo ciclo).

Também a taxa de conclusão era menor quanto maior era o grau de ensino, com 58% dos alunos a concluir o ensino primário, 44% a concluir o I ciclo e apenas 12% a terminar o II ciclo.

Em 2023 a ministra da Educação, Luísa Grilo, disse que o Governo pretende acabar com as escolas precárias e improvisadas, até 2027, no âmbito da implementação do Projecto de Empoderamento da Rapariga e Aprendizagem para Todos (PAT II). “Portanto, estamos a assumir os desafios de, até 2027, zero escolas precárias, zero escolas improvisadas”, sublinhou a ministra. As crianças que estão fora do sistema de ensino, cerca de 5 milhões, fartaram-se de rir.

A governante, que falava à margem da 1ª Sessão Ordinária da Comissão Multissectorial para a Implementação do PAT II), orientada pela Vice-Presidente da República, Esperança da Costa, frisou que a estratégia de combate à precariedade nas escolas passa também pela reabilitação dos sanitários e a criação de condições para que as crianças, com realce para as mulheres, possam ganhar melhores condições de aulas.

A sério, senhora ministra? A estratégia de combate à precariedade nas escolas passa também pela reabilitação dos sanitários… e por melhores condições de aulas? Quem diria…

Luísa Grilo avançou que este era, é, será um dos projectos destinados a ajudar a combater a existência de escolas precárias, uma vez que tem uma componente de construção e reabilitação de infra-estrutura escolares.

Nas contas da ministra, foram catalogados 68 municípios com escolas improvisadas, com destaque para as províncias de Benguela, Huíla e Uíge. Adiantou ainda, num brilhante exemplo da ligação directa do cérebro ao intestino grosso, que o mapeamento permitiu identificar as lacunas, em termos de infra-estruturas escolares, e com isto projectar a construção de escolas em locais onde há carência. Todos esperávamos que a construção de escolas fosse em locais onde não há carência…

De igual modo, Luísa Grilo frisou que o projecto ia, vai, irá também capacitar os gestores das escolas para a melhoria e a elevação das aprendizagens, através de uma gestão mais participativa, com o envolvimento das comunidades, comissão de pais e encarregados de educação. E que tal envolver também uns catuituís a cantar melodias de embalar?

“Quero dizer, com isso, que pretendemos que este projecto esteja cada vez mais voltado à qualidade da educação, através da articulação e interacção com os demais órgãos do sector”, enfatizou.

A governante esclareceu que esta componente iria fazer com que as raparigas e os meninos consigam terminar o ensino secundário, sem ter uma gravidez, numa fase em que ainda não estejam preparados para serem mães ou pais.

“Para isso temos um incentivo, com a atribuição de uma bolsa, em que a rapariga ou o rapaz possa ter algum valor que possibilite superar dificuldades para ir à escola, bem como comprar material”, disse.

A ministra reforçou que o PAT II inclui bolsas de estudos em benefício de estudantes matriculados, a partir da sétima classe, com um subsídio para ajudar as famílias, sobretudo as mais carentes, no quesito do transporte e compra de material escolar, como forma de incentivar a permanência destes nas salas de aula.

Luísa Grilo deu ainda a conhecer que, no quadro da implementação da fase piloto, na capital do país, numa primeira fase 500 alunos, dos municípios de Viana e Icolo e Bengo, beneficiam já do subsídio de 8 mil kwanzas mês.

Esclareceu ainda que o projecto previa, na fase piloto, beneficiar 300 mil crianças e, até ao final do projecto, atingir as 900 mil. Para além disso, referiu que os alfabetizadores enquadrados no PAT II também estão a beneficiar de um subsídio para que as crianças não percam as aulas.

TENHA VERGONHA. DEMITA-SE!

A ministra Luísa Grilo considerou no dia 17 de Outubro de 2022 que o protesto contra a falta de carteiras organizado por um professor de uma escola de Luanda, alvo de um processo disciplinar, foi uma “precipitação” e defendeu mais diálogo. Como o professor sabe, e nós também, “diálogo” para o MPLA significa estar sempre de acordo com o… MPLA.

Luísa Grilo admitiu, no entanto, a falta de carteiras, indicando que existia um programa de distribuição, que já teria permitido o apetrechamento de várias escolas, de acordo com os planos definidos pelos municípios. Há 50 anos no Poder, o MPLA nem consegue dotar as escolas com carteiras, é obra!

“Infelizmente, tivemos esse incidente por precipitação. Era possível, através da direcção da escola, terem conversado, e saberiam do programa de distribuição de carteiras e qual a planificação para solucionar este problema”, afirmou, referindo-se à Escola 5108, no distrito da Estalagem, município de Viana, onde uma manifestação de alunos culminou na detenção de um professor.

A ministra, que falava à margem da apresentação de um programa de bolsas escolares, apontou, além do número insuficiente, a existência de material degradado e indicou que muitas carteiras são vandalizadas, destruídas ou roubadas pela própria comunidade escolar, defendendo mais diálogo entre a escola, família e comunidade para evitar incidentes e conflitos.

Na altura, questionada sobre o professor que organizou o protesto, Luísa Grilo considerou que a atitude do professor “não foi ingénua” e lamentou que tenha desrespeitado a direcção da escola.

No seu entender, o professor foi “imprudente” ao movimentar crianças na via pública, o que “exige cuidados redobrados” e afirmou e que esse momento deveria ter sido articulado com as autoridades para não parecer “uma arruaça”.

Também o então administrador municipal de Viana, Demétrio António Braz, falou de “instrumentalização das crianças” que foram colocadas “numa das vias mais movimentadas do município”, com riscos para a sua segurança, criticando o professor por não ter cumprido os requisitos legais do direito à manifestação.

Recorde-se também que Luísa Grilo defendeu, em Setembro de 2021, em Moçâmedes, que as tecnologias digitais deviam estar ao dispor de todos e o seu uso aproveitado como uma nova forma de alfabetizar. Os 20 milhões de angolanos pobres… agradeceram, assim como os jovens estudantes que nem carteiras têm.

A ministra, que falava no acto central do Dia Mundial da Alfabetização, que decorreu sob o lema “Alfabetizar para aumentar a inclusão digital em tempos de pandemia”, disse que as novas tecnologias devem ser geridas para as áreas da formação, comunicação, informação, trabalho, entretenimento e na aproximação entre as pessoas em todos os enquadrantes.

BARRIGA VAZIA, MATACO NO CHÃO

No dia 28 de Janeiro de… 2025, o Governo disse pela voz de Luísa Grilo que vai alargar a merenda escolar com o Programa Nacional de Alimentação Escolar, que prevê a distribuição de uma refeição quente, adequada à cultura alimentar das comunidades. Vão aquecer as lixeiras onde as crianças, e os adultos também, procuram comida?

O projecto de decreto presidencial, que foi nesse dia analisado em Conselho de Ministros, visa incentivar e garantir a frequência e permanência dos alunos e contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial das crianças nas escolas. De fora ficam, desde logo, os cinco milhões de crianças que estão fora do sistema de ensino.

Em declarações à imprensa, a ministra da Educação, Luísa Grilo, disse que o Programa Nacional de Alimentação Escolar surge da necessidade de reestruturar o programa de merenda escolar que vinha sendo oferecido até agora.

“Fundamentalmente porque a merenda escolar não tinha os nutrientes necessários para o desenvolvimento integral das nossas crianças, por um lado. Por outro lado, o programa de merenda escolar não abrangia todas as crianças nem todos os municípios, era um programa que acabava por discriminar a população escolar”, referiu a ministra. Coisa espantosa. Luísa Grilo a reconhecer – embora de forma superficial – que o MPLA discrimina os angolanos.

Luísa Grilo salientou que o Programa Nacional de Alimentação Escolar, a ser implementado já este ano, vai potenciar a agricultura familiar, para serem os primeiros fornecedores da alimentação para a escola. Demorou mas a ministra chegou à conclusão de que há uma substancial diferença entre a estrada da Beira e a beira da estrada.

“A escola adquire no seu meio e confecciona de acordo com as regras nutricionais, elaboradas por técnicos qualificados, nutricionistas do Ministério da Saúde, em função da idade e do desenvolvimento de cada uma das crianças e das necessidades nutricionais”, frisou.

O programa tem como objectivo fundamental fazer uma educação nutricional para as crianças na idade pré-escolar e no ensino primário. Isto diz o MPLA. Mas, na verdade, o objectivo é a propaganda, é trocar seis por meia dúzia.

A ministra apelou à participação das empresas público-privadas e privadas que já fornecem merenda escolar e a sua integração nos conselhos de alimentação escolar municipais, que têm como principal responsável o administrador municipal.

Segundo a ministra, o programa vai ajudar a elevar os níveis de aproveitamento escolar e contribuir para a redução das taxas de abandono escolar. Se Luísa Grilo o diz é mesmo… mentira. Basta ver que o MPLA está há 50 anos no Poder e aplica sempre a mesma receita: mais do mesmo.

Para melhor se compreender a arte de trocar seis por meia dúzia, que o MPLA pratica há 50 anos, reproduzimos a íntegra o artigo “Merendar continua a ser uma utopia”, publicado aqui no Folha 8 (onde mais poderia ser?) no dia 1 de Novembro de… 2023.

«O Governo angolano está a aplicar, este ano lectivo, 36 mil milhões kwanzas para a merenda escolar, de modo a – diz a propaganda do general João Lourenço (Presidente do reino, Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo) – maximizar o aproveitamento escolar no ensino primário. A tese propagandística é da ministra da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, Ana Paula do Sacramento Neto.

Sem a mínima referência às mais de cinco milhões de crianças (angolanas) que estão fora do sistema de ensino, o Governo diz que oito milhões 933 mil e 125 alunos do ensino geral e universitário estão a frequentar o ano lectivo e académico 2023/24, nos subsistemas geral e universitário no país. Um milhões 560 mil e 308 são crianças que ingressaram pela primeira vez no sistema de ensino.

Falando no programa Grande Entrevista da televisão privada do MPLA (TPA), a governante disse que esta acção faz parte do Programa Integrado de Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza.

Porém, a ministra reconheceu ser ainda insuficiente o valor disponibilizado para a merenda escolar, pelo que apelou às empresas, no âmbito da responsabilidade social, que façam o que deveria ser feito pelo governo, ou seja, aderir ao programa nas áreas onde desenvolvem a sua actividade. É que o MPLA tem de estar mais preocupado em… roubar.

A governante referiu que o país começou a executar as necessidades aliadas à merenda escolar com as verbas do Orçamento Geral do Estado (OGE), mas “ainda há muito pela frente, pois o valor disponibilizado não é suficiente”. A ministra reconhece assim, certamente por descuido, que as prioridades do governos estão mais viradas para a repressão do que para a educação, do que para a alimentação, do que para o respeito pelos direitos humanos.

A ministra Ana Paula do Sacramento Neto referiu que existem boas iniciativas de jovens que estão a trabalhar nesse quesito, bem como algumas mulheres que se juntaram e confeccionam merendas escolares para as escolas, tornando-as mais nutritivas e menos dispendiosas.

“Reconhecemos que a situação económica não é boa e que há muitas famílias em situação de vulnerabilidade, entretanto, há cenários de crianças que são exactamente pobres, mas também crianças que simplesmente saem de casa para aproveitar os bens que de lá vem, ai requer toda a corrente de solidariedade para colmatar tais questões”, disse Ana Paula do Sacramento Neto num devaneio filosófico.

Durante a entrevista, Ana Paula do Sacramento Neto referiu-se ao Programa Integrado de Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza, detalhando que é implementado nos municípios, que têm a incumbência de identificar, planificar e determinar as acções a serem executadas com base em critérios identificados, tendo em conta as verbas disponibilizadas pelo Ministério das Finanças.

Para tal, prosseguiu, estão disponíveis 300 mil milhões kwanzas para programas directos que devem ser executados com base no decreto 140, que estabelece as balizas para o qual o município deve realizar as suas actividades. Este programa abarca cinco eixos, 11 domínios de intervenção e 186 acções.

As 186 acções estabelecidas, disse, dão margem para que o administrador municipal construa escolas (debaixo das árvores), postos médicos, pontecos, melhorar as vias de acesso para o escoamento dos produtos, tratar da acessibilidade e dos meios de compensação para as pessoas com deficiência, agricultura familiar e outras.

Esclareceu ainda que, apesar das verbas serem insuficientes tendo em conta o índice populacional e os municípios que não arrecadam receitas, “o mais importante é racionalizar os recursos e fazer muito com pouco”.»

Artigos Relacionados

Leave a Comment