Várias pessoas morreram e outras estão em estado crítico na província do Cuanza-Norte em consequência de um acidente de viação ocorrido na terça-feira, 12, na estrada que liga o município de Cambambe ao Cazengo daquela mesma circunscrição.
Por Domingos Miúdo
O sinistro envolveu um autocarro Marcopolo do grupo Rosalina Express de mais de 30 lugares que transportava várias personalidades de Cambambe, dentre eles autoridades tradicionais, professores e estudantes de diversas escolas, que, por orientações superiores, foram obrigados a participar do acto de inauguração do Hospital Geral do Cuanza-Norte – Mário Pinto de Andrade, protagonizado pelo Presidente João Lourenço.
A viatura capotou enquanto descia o morro do Binda, uma zona que, dadas as complicações rodoviárias, já conta com muitos registos de acidentes.
Os estudantes, em particular, foram mais uma vez usados e coagidos a abdicarem das aulas para irem sorrir, aplaudir e acenar a alguém que, para além de inaugurar tantos hospitais, continua a deixar a saúde do país cada vez mais doente. E nada poderia ser tão triste quanto o regresso de uma viagem que nunca poderia ter sido feita, terminado em estrangulamento de pessoas inocentes.
Dentre as mortes confirmadas, consta também a do soba da comuna de Danje-ya-Menha, do município de Cambambe.
A isso, surge o grito de repúdio da sociedade civil que diz que já é altura de líderes do MPLA repensar seriamente nas absurdas ideias.
“A arrogância dos que nos dirigem, vai continuar a matar-nos, directa e indirectamente, além da fome ou da corrupção. Há quem queira dizer que ‘não é o momento de apontar dedos e que isso acontece’. Mas todos sabemos que só tem este discurso quem não foi afectado, quem não sente a dor na primeira pessoa, quem não perdeu um filho, uma filha, um irmão, uma irmã, um esposo ou uma esposa”, começou por lamentar Jordão Cooper.
E, retoricamente, questionou: “O que é que um estudante vai fazer na inauguração de um hospital? Por que é que deve ser obrigatória a presença deles? Lá onde o Presidente vai não tem pessoas?”.
Jordão Cooper, também professor de Geografia em Cambambe, avançou que, apesar da soberba dos incompetentes, chegou a criticar e reprovar a ideia de obrigar alunos e professores a participarem do acto. “Infelizmente aconteceu com os outros, com os inocentes para piorar. Sim, com os inocentes, aqueles que não valem muito, para eles, porque depois de tudo, depois de 3 dias, serão esquecidos e repetiremos o feito na próxima inauguração de um serviço que ao fim de tudo não teremos como aderir, na maior parte das vezes, pela burocracia e a falta de materiais ou médicos no momento em que precisarmos. Essas pessoas, as que foram, só são lembradas em momentos do género. Elas andam milhares de quilómetros a pé até chegarem às escolas, nunca ninguém pensou em transporte público para elas”, desabafou.
Em consonância com o argumento do professor, Clemente Cambanze, também morador da província, ao compreender que tal façanha estará a transformar-se em hábito, se ainda não o é, sugeriu que o povo, como o lado que mais sofre com isso, deveria envidar esforços para travar isso. E contou que em 2017 quase partiu a coluna só para subir ao comboio com destino a Ndalatando, tudo por conta do comício de João Lourenço. Daí ter jurado nunca mais sofrer por causa de um senhor que se acha Deus.
“O sangue desses pobres miúdos irá pesar na consciência desses desprezíveis dirigentes ou gestores públicos. Eu acredito que foram obrigados sob penas de ser reprovados ou sob duras sanções, e no final vidas se foram. É triste isso, temos que repensar as próximas vezes, não há necessidade para isso”, disse David João.