A Anaso, organização não-governamental angolana, considerou que o “aumento” de novas infecções por VIH/Sida e de mortes relacionadas com doença no país justificam mais acções e disponibilidade de mais fundos e lamentou a “redução” de actividades comunitárias em 2022.
A Rede Angolana das Organizações de Serviços de Sida e Grandes Endemias (Anaso), em mensagem de balanço de 2022 e perspectivas para 2023, disse que no ano passado registou “limitações no acesso aos anti-retrovirais e rotura de stock” de outros produtos de saúde.
“Voltamos a registar um aumento de casos de transmissão dolosa e das práticas de estigma e discriminação associadas ao VIH que estão a afastar as pessoas vivendo com a doença na luta contra a epidemia em Angola”, lê-se na mensagem.
A Anaso disse também que não se conseguiu resgatar os diferentes serviços comunitários de VIH que foram encerrados na altura da Covid-19 e que registou o encerramento de serviços de organizações comunitárias por falta de fundos.
Em 2022, “houve uma grande redução das actividades comunitárias de VIH/Sida que podem comprometer os esforços do país para que possamos acabar com a sida com um problema de saúde pública até 2030”, acrescentou.
A ONG defendeu que o aumento de novas infecções por VIH e de mortes relacionadas com a sida justificam a realização de mais acções e a disponibilidade de mais fundos.
Segundo a Anaso, que estima que vivam no país mais de 300 mil pessoas seropositivas, Angola está entre os 25 países com maior número de novas infecções por VIH entre os adolescentes e jovens no mundo.
Pelo menos 16.000 pessoas morrem anualmente em Angola vítimas do VIH/Sida, como apontou a Anaso em Outubro de 2022. Cada dia, referiu, “cerca de 20 novas infecções por VIH ocorrem entre os adolescentes e jovens dos 15 aos 24 anos em Angola”.
Os grandes desafios para 2023 passam pela “melhoria da coordenação” entre o Governo e a sociedade civil, através do funcionamento da Comissão Nacional de Luta contra a Sida e Grandes Endemias.
De acordo com a nota assinada pelo presidente da organização, António Coelho, o outro grande desafio é a maior participação das organizações da sociedade civil que trabalham em VIH nos espaços de concertação social a nível provincial e municipal para o aprofundamento dessas questões.
Já em Janeiro de 2020, a Anaso mostrava-se preocupada com o aumento de novos casos de infecção, exigindo melhorias na resposta à doença. Antes, em Novembro de 2018 referia que Angola “continua a perder a guerra” contra a sida”, com o registo de 28 mil novas infecções e 13 mil mortes por ano. Nada de novo, portanto.
“A situação da Sida em Angola continua preocupante. Apesar dos esforços do governo e da sociedade civil, o número de novas infecções por HIV tem estado a aumentar, com cerca de 28 mil novas infecções por ano, e o número de mortes também tem estado a aumentar com 11 a 12 mil mortes por ano “, disse António Coelho, então presidente da Anaso.
O responsável da Anaso falava à margem de uma reunião de alto nível, em Luanda, entre o Governo de Angola e o Fundo Global de Luta Contra a Sida, Tuberculose e Malária.
“Temos boas políticas, temos boas estratégias, mas se se for ao terreno não há implementação das acções porque não há fundos”, sublinhou o responsável, acrescentando que o Governo “tem grande dificuldade em colocar dinheiro” para responder a doenças como o HIV/Sida.
Considerando necessário que se criem condições para alterar comportamentos e responder melhor ao problema, António Coelho salientou então que “é preciso melhorar a vontade política”, melhorando a “liderança política”, que está “comprometida” pelo mau desempenho da Comissão Nacional de Luta Contra a Sida e Grandes Endemias.
Há também “sérios problemas na recolha e tratamento dos dados”, continuou o dirigente da Anaso, referindo que a taxa de prevalência de 2% “vem de há 10 anos” o que significa que existem entre 350 mil a 500 mil pessoas a viver com HIV no país, das quais só 78 mil estão a fazer tratamento.
Angola está também entre os países como mais alta taxa de transmissão vertical do HIV (de mãe para filho), na ordem dos 28%.
O responsável da Anaso indicou que é também necessário ultrapassar as limitações financeiras: “Continuamos como há alguns anos atrás de mãos estendidas e a olhar para organizações internacionais, temos de inverter a situação e, sobretudo, melhorar a contribuição do governo angolano no âmbito da luta conta Sida”.
Nesse âmbito, adiantou estar “a olhar para contribuições como a do Fundo Global que está em Angola desde 2004, com um apoio acumulado superior a 350 milhões de dólares [318 milhões de euros], que infelizmente tem diminuído nos últimos anos”. O Fundo Global é um dos principais parceiros do Governo no combate às grandes endemias como o HIV/Sida, Malária e Tuberculose.
António Coelho sublinhou “a necessidade de Angola demonstrar a contrapartida do Governo angolano na luta contra as três doenças”, já que o Fundo entende que, nos últimos anos, não teve evidências claras da contrapartida angolana, o que pode “comprometer a continuidade”.
Para expressar a importância deste apoio, o presidente da Anaso disse que hoje a nível de medicamentos sobrevive-se “graças ao Fundo Global”.
“Estamos em crer que haja apenas um ruído na comunicação, não me parece que o Governo angolano não esteja a cumprir a sua parte, mas é preciso que haja evidências”, de que a contribuição financeira angolana está a ser aplicada, notou.
O presidente do conselho do Fundo Global, Donald Kaberuka, esteve em Luanda no encontro de alto nível em que participaram também as ministras angolanas da Saúde, Sílvia Lutucuta, e de Estado para a Área Social, que então era Carolina Cerqueira.
“Precisamos de resolver o problema da sustentabilidade da resposta comunitária ao VIH/Sida, pelo que temos de lutar para que a Anaso seja uma instituição de utilidade pública”, sublinhou.
Aumentar o acesso da população aos cuidados primários de saúde, “e isso significa investir em saúde”, e a elaboração de uma política nacional de saúde comunitária estão ainda entre os desafios apontados pela organização para 2023.
Folha 8 com Lusa