Definitivamente Angola deixou de ser um país e passou a ser, apenas e só, um reles bordel muito, mas muito mesmo, mal frequentado. Basta ver que o MPLA, ou seja João Lourenço, determinou que o novo Aeroporto Internacional de Luanda, em construção na localidade de Icolo e Bengo, vai chamar-se “Dr. António Agostinho Neto” e o de Benguela “Paulo Teixeira Jorge”?
Por Orlando Castro
O Presidente João Lourenço pediu em 26 de Maio de 2021 desculpas em nome do Estado angolano pelas execuções sumárias levadas a cabo nos massacres de 27 de Maio de 1977, salientando que se trata de “um sincero arrependimento”. Mas, é claro, o assassino responsável pelos massacres, Agostinho Neto, continua incólume e a ser, por imposição expressa de MPLA, o único herói nacional. E até vai ter o seu nome no principal aeroporto do reino. É fartar vilanagem.
“Não é hora de nos apontarmos o dedo procurando os culpados. Importa que cada um assuma as suas responsabilidades na parte que lhe cabe. É assim que, imbuídos deste espírito, viemos junto das vítimas dos conflitos e dos angolanos em geral pedir humildemente, em nome do Estado angolano, as nossas desculpas públicas pelo grande mal que foram as execuções sumárias naquela altura e naquelas circunstâncias”, disse o chefe do executivo e líder do MPLA.
João Lourenço dirigia-se ao país numa comunicação transmitida pela Televisão Pública de Angola, na véspera da passagem dos 44 anos sobre os massacres de milhares e milhares de angolanos, ordenados por Agostinho Neto, então Presidente da República Popular de Angola e Presidente do MPLA e ainda hoje considerado oficialmente o único herói nacional, em 27 de Maio de 1977, que foi pela primeira vez assinalado com uma homenagem em memória das vítimas, mas sem beliscar a imagem do seu principal responsável.
“O pedido público de desculpas e de perdão não se resume a simples palavras e reflecte um sincero arrependimento e vontade de pôr fim à angústia que estas famílias carregam por falta de informação quanto aos seus entes queridos”, acrescentou.
O pedido de desculpas era uma reclamação dos sobreviventes e das organizações que representam as vítimas e os seus descendentes, agrupadas na Plataforma 27 de Maio.
Em Abril de 2019, o Presidente do MPLA ordenou a criação de uma comissão (a CIVICOP), para elaborar um plano geral de homenagem às vítimas dos conflitos políticos que ocorreram em Angola entre 11 de Novembro de 1975 e 4 de Abril de 2002 (fim da guerra civil).
Em Angola, o Dia do Herói Nacional é uma comemoração partidária transformada, por força da ditadura, em nacional angolana em memória do nosso maior genocida, do nosso maior assassino, António Agostinho Neto.
Estávamos a 17 de Setembro de 2016. O então ministro da Defesa de Angola e vice-presidente do MPLA, João Lourenço (alguém sabe quem é?), denunciou tentativas de “denegrir” a imagem de Agostinho Neto, primeiro Presidente angolano.
João Lourenço discursava em Mbanza Congo, província do Zaire, ao presidir ao acto solene das comemorações do dia do Herói Nacional, feriado alusivo precisamente ao nascimento de Agostinho Neto.
“A grandeza e a dimensão da figura de Agostinho Neto é de tal ordem gigante que, ao longo dos anos, todas as tentativas de denegrir a sua pessoa, a sua personalidade e obra realizada como líder político, poeta, estadista e humanista, falharam pura e simplesmente porque os factos estão aí para confirmar quão grande ele foi”, afirmou o general João Lourenço, hoje presidente do MPLA, da República (do MPLA) e Titular do Poder Executivo (do MPLA), certamente já perspectivando em guindá-lo a figura de nível mundial. Hitler que se cuide…
“A República de Angola está a ser vítima, mais uma vez, de uma campanha de desinformação, na qual são visadas, de forma repugnante, figuras muito importantes da Luta de Libertação Nacional, particularmente o saudoso camarada Presidente Agostinho Neto”, afirmou o Bureau Político.
Na intervenção em Mbanza Congo, João Lourenço, que falava em representação do seu então querido, carismático e divino chefe, o “escolhido de Deus” e chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, sublinhou que Agostinho Neto “será sempre recordado como lutador pela liberdade dos povos” e um “humanista profundo”.
“Como atestam as populações mais carenciadas de Cabo Verde, a quem Agostinho Neto tratou gratuitamente, mesmo estando ele nas condições de preso politico. É assim como será sempre lembrado, por muitas que sejam as tentativas de denegrir”, afirmou – sabendo que estava a mentir e a ser conivente com um dos mais hediondos crimes cometidos em África – o então ministro da Defesa e hoje Presidente da República.
“Em contrapartida”, disse ainda João Lourenço, os “seus detractores não terão nunca uma única linha escrita na História, porque mergulhados nos seus recalcamentos e frustrações, não deixarão obra feita digna de respeito e admiração”.
“Não terão por isso honras de seus povos e muito menos de outros povos e nações. A História encarregar-se-á de simplesmente ignorá-los, concentremos por isso nossas energias na edificação do nosso belo país”, disse João Lourenço.
Terá João Lourenço alguma coisa, séria, honesta e reconciliadora a dizer aos angolanos sobre os acontecimentos ocorridos no dia 27 de Maio de 1977 e nos anos que se seguiram, quando milhares e milhares de angolanos foram assassinados por ordem de Agostinho Neto? Pedir desculpa em nome do Estado não chega. Chegaria, estamos em crer, se colocasse Agostinho Neto no nível a que o Estado alemão colocou Adolf Hitler.
Numa só palavra, quando este MPLA sente o poder ameaçado, não hesita: humilha, assassina, destrói, elimina, atira aos jacarés. É a sua natureza perversa demonstrando não estar o MPLA preparado para perder o poder e, em democracia, com a força do voto se isso vier a acontecer, a opção pela guerra será o recurso mais natural deste partido, não é general João Lourenço?
“Não vamos perder tempo com julgamentos”, disse no pedestal da sua cadeira-baloiço, o maior genocida do nacionalismo angolano e da independência nacional, Agostinho Neto. João Lourenço sabe que isto é verdade, mas – apesar disso – enaltece o assassino e enxovalha a memória das vítimas. E isto não é, nunca será, “um sincero arrependimento”.
Desde 1977 que Angola, o Povo, aguarda pela justiça, mas com as mentes caducas no leme do país, essa magnanimidade de retratação mútua, para o sarar de feridas, não será possível, augurar uma Comissão da Verdade e Reconciliação, muito também por não haver um líder em Angola.
Fuba do mesmo saco
O Presidente República, do MPLA e Titular do Poder Executivo, João Lourenço, prestou homenagem, em Havana, Cuba, ao pelos vistos único fundador da nação angolana, António Agostinho Neto, com a deposição de uma coroa de flores no busto erguido em sua memória. O que diria o mundo se, por exemplo, a Alemanha prestasse homenagem a Adolf Hitler?
Ouvidos os hinos nacionais de Angola e Cuba e depois de se ter inclinado invertebradamente sob o busto do maior genocida de Angola, Agostinho Neto, João Lourenço agradeceu o espírito altruísta de Cuba na ajuda a vários povos, como em Angola, nos momentos difíceis em que os cubanos ajudaram a matar milhares e milhares de angolanos, como foi o caso dos massacres de 27 de Maio de 1977.
João Lourenço disse que a homenagem era extensiva a todos os líderes fundadores africanos, sendo visível que se referia exclusivamente aos que ajudaram o MPLA.
As autoridades cubanas disseram lembrar Agostinho Neto como poeta e médico dos pobres, que lutou para a libertação do seu povo do jugo colonial. Pois. Em castelhano ou numa espécie de português, bem que o MPLA e o Partido Comunista de Cuba tentam reescrever a História. Mas não vão conseguir. É que não são as estátuas, os discursos demagógicos ou os decretos presidenciais que vão fazer prescrever a verdade.
No parque dos Próceres Africanos, no município de Playa, Agostinho Neto está entre Marien Ngouabi, do Congo, e Eduardo Chivambo Mondlane, o fundador da FRELIMO. Reconhecem-se também as efígies de Oliver Tambo, do ANC da África do Sul, Nkwame Nkruma, do Ghana, Amílcar Cabral, da Guiné Bissau e Cabo Verde.
Despontam ainda no parque dos Próceres os bustos de Sekou Toure, Guiné Conacry, Patrice Emery Lumumba, da RDC, Abdelkader El Djazaire, da Argélia, Gamel Abdel Nasser, do Egipto, e Seretse Khama, do Botswana.
O Presidente João Lourenço deslocou-se igualmente, como não poderia deixar de ser, ao Cemitério de Colón, onde rendeu homenagem aos combatentes internacionalistas (mercenários) cubanos, alguns mortos em Angola.
João Lourenço reafirmou a gratidão do povo angolano aos cubanos que sacrificaram as suas vidas na defesa da soberania do MPLA (não de Angola, como diz) e da libertação da África Austral do regime segregacionista do Apartheid, então vigente na África do Sul.
Nós sabemos que João Lourenço abomina todos quantos usam a cabeça para pensar, bem como todos aqueles que têm memória. Mais furioso fica quando encontra quem em simultâneo, como acontece no Folha 8 e na TV8, pensa e faz – desde 1995 – Jornalismo com memória. Tenha paciência, Presidente. Connosco a verdade nunca prescreverá.
OUTRO HERÓI, PAULO TEIXEIRA JORGE
Em 2001, o então secretário para as relações exteriores do MPLA, Paulo Teixeira Jorge, afirmou que Governo português não deveria permitir que “portugueses de ocasião” interferissem nos assuntos internos de Angola, sendo que esses “portugueses de ocasião” , tal como os “angolanos de ocasião”, são todos os que dizem algo que seja diferente da verdade oficial.
Na altura, Paulo Teixeira Jorge ainda não teria ouvido falar de democracia. Não sabia o que era e, por isso, julgava-se no direito de dar palpites sobre um Estado de Direito, algo que não se podia dizer (ainda não se pode) a propósito de Angola, em cujos quintais proliferam acéfalos do tipo deste secretário do MPLA ou do actual Presidente.
“Existe o princípio universal da não ingerência nos assuntos internos (de outro Estado) e eu creio que Portugal, através dos órgãos competentes, poderia recomendar a esses ditos portugueses (elementos afectos à UNITA que vivem em Portugal) para não se meterem nos assuntos internos (de Angola)”, afirmou Paulo Teixeira Jorge, referindo-se ao facto do relatório do então mecanismo de fiscalização das sanções contra a UNITA apresentar Portugal como a principal base de apoio do movimento de Jonas Savimbi na Europa.
E, a fazer fé no muito que se vai lendo, as teses de Paulo Teixeira Jorge fizeram escola. Portugal hoje, como em 2001, convirá que todos o entendam de uma vez por todas, é uma nação livre. Coisa que não existe em Angola. No reino de João Lourenço não existe nação nem liberdade.
Seja como for, todos aqueles que catalogam os angolanos em duas classes, os de primeira (afectos ao MPLA) e de segunda (afectos aos outros partidos ou sem partido), devem perceber que angolano não é sinónimo de cor ou de filiação partidária.
“… Eles são portugueses de ocasião, fundamentalmente são angolanos que se tornaram portugueses depois da evolução da situação em Angola”, afirmou na altura Paulo Teixeira Jorge, para quem o Governo português também deveria “chamar a atenção” dos elementos da Frente de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC) que se encontravam em Portugal.
Paulo Teixeira Jorge também disse que Angola deveria “rever as relações bilaterais” com Portugal na sequência das conclusões do relatório do mecanismo de fiscalização das sanções contra a UNITA.
Na altura, importa recordá-lo, nas declarações que prestou à Rádio Nacional de Angola, Paulo Teixeira Jorge também criticou as posições que a Igreja Católica tinha tomado no âmbito do processo de paz, considerando que “num Estado laico, a Igreja não pode permitir-se interferir nos assuntos do Governo”.
Ontem, tal como hoje. Ninguém pode interferir com a lei da selva imposta pelo MPLA. Portugal interfere com Angola, a Igreja interfere com o Governo, os angolanos interferem, a UNITA interfere.
Na altura, recorde-se, referindo-se ao facto do presidente da Conferência Episcopal de Angola e S. Tomé (CEAST), D. Zacarias Camuenho, ter defendido a necessidade de um cessar-fogo bilateral para acabar com a guerra, Paulo Teixeira Jorge afirmou que “D. Zacarias Camuenho devia preocupar-se com os problemas da Igreja, que não são poucos, já que o resto não era da sua competência”.
Mais palavras para quê? É por estas e por outras, é por este e por outros, que os angolanos continuam a vegetar, enquanto os dirigentes vivem, continuam a viver, à grande. Até um dia.