IMUNIDADES DE QUEM NÃO FOI ELEITO

Os deputados angolanos divergiram na análise sobre a atribuição de imunidade aos antigos vice-presidentes no quadro da discussão da Proposta de Lei sobre o Estatuto dos Antigos Presidentes da República.

Ao longo do debate, os deputados Mihaela Webba e Jorge Vitorino, ambos da UNITA, opuseram-se à atribuição de imunidade aos antigos vice-presidentes na Proposta de Lei em análise, com o argumento de que tal preceito viola a Constituição.

Para a deputada Mihaela Webba, se o legislador constituinte quisesse estender as imunidades do vice-presidente ao Estatuto Presidencial, constante do número 2 do artigo 133 da Constituição, o teria feito mesmo na carta magna.

Adiantou que tal como os deputados, vice-presidentes e os auxiliares do Titular do Poder Executivo todos são figuras relevantes do Estado, “mas o legislador constituinte só quis atribuir este estatuto especial ao Presidente da República”.

Em reacção, o ministro de Estado e Chefe da Casa Civil do Presidente da República, Adão de Almeida, aclarou que a Proposta de se garantir imunidade aos antigos Presidentes da República não é inconstitucional, mas visa dar dignificação a uma alta função do Estado.

“Parece-nos ser coerente que exista como opção legislativa (não há proibição constitucional) que alguém na posição de vice-presidente da República tenha um estatuto de dignificação da sua posição constitucional”, vincou, lembrando que a temática não é nova, já consta da lei em vigor 16/17, sobre o Estatuto dos Antigos Presidentes.

Adão de Almeida disse ser importante que, para a dignificação constitucional desta função de vice-presidente da República, uma vez terminado o seu mandato goze também de uma certa protecção e de um conjunto de regalias e direitos definidos por lei e não pela Constituição.

Adão de Almeida argumentou, também, que no sistema constitucional angolano o vice-presidente é eleito nos mesmos termos que o Presidente da República. Isto, é claro, se se ocultar que ninguém elege o Presidente e o vice-Presidente, mas apenas o cabeça-de-lista e o número dois do partido mais votado em eleições para a Assembleia Nacional. Ou seja, por exemplo, João Lourenço foi eleito deputado e não Presidente da República.

“Não estamos a falar de uma função qualquer, estamos a falar de uma alta função do Estado”, assinalou.

Ainda a esse propósito, o presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais e Jurídicos da Assembleia Nacional, deputado Reis Júnior, sustentou que a Assembleia Nacional tem legitimidade para poder legislar sobre todas as matérias que não sejam da competência do Presidente da República. Quem diria? Tirando o que não pode… pode tudo o resto.

“Não será inconstitucional atribuir imunidade aos vice-presidentes”, disse, aconselhando os colegas legisladores a entrarem numa solução técnica, “que é mais razoável do que excluir posições dos outros”.

Reis Júnior lembrou que na feitura da Constituição de 2010, pela Assembleia Nacional, tinha sido determinado que o Presidente da República nomeasse o vice-presidente e que esse podia ocupar o cargo de Presidente, até ao fim do mandato, em caso de vacatura, cujo pressuposto viria a ser chumbado pelo Tribunal Constitucional (TC).

O TC alegou, na altura, que o vice-presidente para exercer o cargo de Presidente até ao fim de mandato, em caso de vacatura, tinha que ser eleito. E lá voltamos a lembrar os iletrados génios do regime que ninguém elegeu o Presidente pois, corrobore-se, em Angola não há eleições presidenciais.

Segundo o relatório de fundamentação, os antigos Presidentes da República e vice-presidentes deixam cargos de inquestionável liderança nacional e legitimidade popular, nos quais estiveram à frente de toda a máquina administrativa do Estado incluindo a militar. Quando cessam funções têm consigo uma larga malha de informações e conhecimentos que os torna elementos fundamentais ao Estado.

A Proposta de Lei, em concretização e desenvolvimento do artigo 133.º da Constituição estabelece, entre outros direitos, subvenção mensal vitalícia, correspondente ao salário base do Presidente e vice-presidente da República em funções, seguro de saúde, extensivo ao cônjuge e aos filhos menores e médico pessoal.

Estabelece ainda moradia familiar, atribuída e suportada, ente outros, pelos 20 milhões de pobres, desde que o antigo Presidente ou vice-presidente da República, não opte por morar em residência própria, caso em que é atribuído um subsídio anual de manutenção da residência, viatura protocolar e de apoio, fornecidas e assistidas pelo Estado e segurança, garantida pelos órgãos competentes do Estado.

Engloba, ainda, Gabinete de trabalho e quadro de pessoal de apoio ao gabinete, com respectivo orçamento, subsídio de fim de mandato, protecção pessoal, extensiva ao cônjuge, oficial às ordens, passaporte diplomático, extensivo ao cônjuge e aos filhos menores.

Os principais deveres estabelecidos pela Proposta são os do sigilo e da confidencialidade sobre todos os assuntos que os Antigos Presidentes e vice-presidentes tiveram conhecimento durante o exercício do cargo, para além dos deveres previstos no regime do segredo de Estado.

Os antigos presidentes e vice-presidentes ficam impedidos de exercer qualquer actividade no sector privado por um período de 3 anos, mas este impedimento, segundo a proposta, não abrange as actividades de docência, investigação científica ou prestação de serviço em entidades sem fins lucrativos.

Folha 8 com Angop

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