ESPECTRO DA GUERRA PAIRA EM MOÇAMBIQUE

O presidente da Renamo, Ossufo Momade, acusou hoje o chefe de Estado moçambicano (Filipe Jacinto Nyusi) de tentar “empurrar o país para uma nova guerra” face à repressão policial de marchas que contestam os resultados eleitorais, considerando que o seu partido não vai recuar.

Ossufo Momade afirmou hoje, durante uma conferência de imprensa realizada em Maputo, que “inquieta aos moçambicanos que o senhor Filipe Jacinto Nyusi, Comandante-em-chefe das Forças de Defesa e Segurança, esteja a demonstrar, com a sua voz de comando, que pretende empurrar o país para uma nova guerra”.

Em causa está a repressão policial das marchas lideradas pela Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) para protestar contra os resultados das eleições de 11 de Outubro, onde a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder há 48 anos) foi anunciada como vencedora em 65 das 64 autarquias, à excepção da Beira, ganha pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM), terceiro partido parlamentar.

Ossufo Momade reiterou que o seu partido não vai recuar até que se reponha a “verdade eleitoral”, considerando que a Renamo tem provas (editais/actas) que mostram que o partido venceu em diversas autarquias.

“Exortamos a todos os amantes da paz, democracia e do bem-estar a continuarmos firmes na luta pela reposição da vontade expressa no dia 11 de Outubro, porque somos por eleições livres, justas e transparentes”, declarou.

O presidente do principal partido de oposição em Moçambique criticou também a actuação da polícia moçambicana (tal como em Angola com o MPLA é uma força afecta à Frelimo) durante os protestos em diversos pontos de Moçambique, denunciando uma comprovada perseguição aos seus membros.

“Há perseguição e detenções arbitrárias de cidadãos, bem como invasão e cerco às delegações políticas do partido Renamo, como é o caso da cidade de Nampula e Maputo-cidade, nesta última onde inclusivamente houve vasculha no terraço do edifício”, afirmou Momade.

“É inexplicável que nesta senda de autêntico terrorismo da Polícia contra os cidadãos e o Estado estejam envolvidos cidadãos vestidos à civil empunhando e disparando armas como se tratasse de mercenários”, acrescentou o líder da Renamo, em alusão a um grupo de homens armados, presumivelmente da polícia, que foram vistos, à paisana, procurando manifestantes no meio da agitação em Maputo.

As sextas eleições autárquicas em Moçambique decorreram em 65 municípios do país no dia 11 de Outubro, incluindo 12 novas autarquias, que pela primeira vez foram a votos.

O principal partido da oposição tem promovido, um pouco por todo o país, marchas de contestação aos resultados das eleições de 11 de Outubro, juntando milhares de pessoas que denunciam a mais do comprovada, até pelos observadores internacionais, “megafraude” no escrutínio.

Um agente da polícia e um jovem morreram durante manifestações ocorridas em Nampula e em Nacala contra os resultados das eleições autárquicas, segundo o Centro de Integridade Pública (CIP), uma Organização Não-Governamental (ONG) moçambicana que observa as eleições.

O agente terá sido morto em retaliação pela morte a tiro de uma criança de dez anos, à saída da escola, numa acção enquadrada na reacção das autoridades às manifestações contra as eleições autárquicas na cidade de Nampula.

Na cidade de Nacala, também na província de Nampula, um jovem morreu depois de ter sido atingido por um objecto contundente no Mercado Central de Nacala, durante escaramuças entre populares e a polícia, avançou o CIP.

Os óbitos avançados pela ONG não foram ainda confirmados pelas autoridades, que admitiram, no entanto, que pelo menos 10 pessoas ficaram feridas e outras 70 foram detidas durante as escaramuças.

De acordo com a legislação eleitoral moçambicana, os resultados do escrutínio ainda terão de ser validados e proclamados pelo Conselho Constitucional (CC), máximo órgão judicial.

O Governo moçambicano e a Renamo foram os protagonistas do conflito armado mais longo que Moçambique conheceu: a guerra civil durante 16 anos.

A última base da Renamo, agora desmilitarizada, foi encerrada em Vunduzi, distrito de Gorongosa, em Junho deste ano, mais de 30 anos depois do fim da guerra civil moçambicana.

O encerramento da última base faz parte do Acordo de Paz e Reconciliação Nacional assinado entre o Governo da Frelimo e a Renamo em Agosto de 2019.

O entendimento foi o terceiro assinado entre as partes, tendo sido os dois primeiros violados e resultado em confrontação armada, na sequência da contestação de resultados eleitorais pela Renamo.

Recorde-se que a Embaixada dos Estados Unidos emitiu um comunicado no dia 16 em que disse existir muitos relatórios credíveis de irregularidades no dia da votação e durante o processo de apuramento dos votos e pediu que haja uma resolução justa sobre esses alegados ilícitos eleitorais.

A representação americana afirmou que as eleições decorreram “de um modo geral, pacífico”, mas reconheceu que “existem muitos relatórios credíveis de irregularidades no dia da votação e durante o processo de apuramento dos votos”.

Nesse cenário, defendeu que a “Comissão Nacional de Eleições (CNE) deve garantir que todos os votos são contados de forma exacta e transparente”.

Também o Alto Comissariado do Canadá, a Embaixada da Noruega e a Embaixada da Suíça manifestaram a sua preocupação com as irregularidades denunciadas no dia das eleições autárquicas, e no processo de apuramento dos votos e pediram que o quadro jurídico dê resposta aos processos entretanto apresentados.

Por sua vez, a União Europeia (UE) manifestou preocupação com as notícias de irregularidades nas eleições autárquicas de Moçambique e afirma estar a acompanhar de perto o rescaldo do processo eleitoral.

“A sociedade moçambicana mostrou-se activamente empenhada e participou em grande escala”, destaca, em comunicado, a UE, manifestando depois preocupação com “as notícias de irregularidades”, desejando que “estas sejam devidamente tratadas para garantir um resultado pacífico e satisfatório do processo eleitoral, no pleno respeito pelo Estado de direito e pelos princípios democráticos”.

Folha 8 com Lusa

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