Abel Chivukuvuku (CVK, como o chamávamos no Jornal Folha 8) é um homem tão cheio de sorte na vida, que a falta de sorte que se destaca é transversal às angolanas e angolanos: o azar colectivo de termos uma ditadura. Mas a sorte também se constrói, e CVK construiu a dele muito bem.
Por Sedrick de Carvalho
Mergulhei na leitura do livro “Vidas e Mortes de Abel Chivukuvuku” e pensei: “que bela aliança de escritor e biografado”. O livro começa como gosto que comece: com acção. Agualusa fez-me lembrar a acção no livro “Beasts of No Nation” do nigeriano Uzodinma Iweala, cuja edição da Antígona prefaciou.
O primeiro capítulo começa em 1992 com uma perseguição terrível que acaba com CVK baleado e capturado, mas antes acompanhamos-lhe a ouvir pelo telefone o primo Eliseu Chimbili a ser morto.
“– Estão a correr na minha direção. Estão a disparar… Ai, que morro!… Estou a morrer!…”, p. 17.
Horrível! Horrível! Fechei o livro e contactei logo o Tavares Chimbili. Julguei que fosse o pai dele. É também pai, irmão mais velho do pai. Pai grande. Vemos aqui como a história das guerras de Angola nos toca a todos.
Recuperei o fôlego e recomecei a leitura. CVK fez coisas em Kinshasa (Operação Cabinda) que se assemelham aos feitos do espião egipto-israelita Eli Cohen na Síria. O trabalho sobre Cabinda é interessante para quem estuda a Questão Cabinda. Alianças!
As mortes de mulheres e crianças na fogueira, as de Tito Chingunji e Wilson dos Santos e suas respectivas famílias (mulheres e filhos menores) são reveladoras sobre quem era Jonas Savimbi. Tio Félix Miranda é tio do Wilson e partilhou connosco, no Folha 8, como soube do assassinato do sobrinho e sua família. Abel não titubeia:
“Na sequência da crise do Tito, americanos e europeus decidiram abandonar o velho Jonas”, p. 153.
A história de deputados presos, que iam ao parlamento com vigilância policial, daria um excelente filme. Angola a ultrapassar a ficção. As vidas e mortes de CVK dariam um bom filme.
CVK passa por mais uma reinvenção de si mesmo, depois da morte política da CASA-CE, que previ e alertei membros da direcção de que isto aconteceria, sendo a manutenção de CVK inviável para os interesses do grupo coligado que o derrubou.
O Velho Abel faz 66 anos de idade no dia 11 de Novembro, menos um à altura da morte do Velho Jonas. Na posição em que se encontra, precisa da última grande sorte para ser o presidente de Angola, presságio em que acredita com veemência, e bem faz em acreditar.
Nasceu no dia da independência do país e, como revela este livro, não há dúvidas da sua independência perante os poderosos do seu tempo, a começar pelo Velho Jonas, que o acusou reiteradas vezes de traidor sem nunca provar. Pelo contrário, CVK provou lealdade aos seus ideais.
Parabéns ao kota Agualusa e ao Mano Abel, e que continue firme, continue a ressuscitar!