ARMADILHAS DA DEMOCRACIA EM ANGOLA

A democracia é hoje tão aceite que os países que a não implementaram são encarados com reticências. E os países que aderiram e implementaram a democracia são realmente livres?

Por Velho Ekumbi (*)

A saúde da democracia depende, necessariamente, da educação, portanto, a formação da sociedade. Foi isto que intuiu Sócrates ao propor a educação para a juventude, guardiã dos sonhos da democracia. Todavia, Grécia que, por causa do conceito de República, fazia a bandeira da liberdade drapejar sem entraves, não soube conviver com a liberdade de opinião de Sócrates, porque a elite política sabia do perigo da educação, que poderia pôr em questão a legitimidade de certos políticos vazios de conteúdo e que têm a arrogância como a arma ideal para governar, por isso, assassinaram Sócrates, o primeiro que percebeu que sem uma base formativa – educar para – a democracia cairia em saco roto, o que explica o seu discípulo Platão falar dos filósofos como verdadeiros candidatos para governar, exactamente, devido a perspectiva libertária que faz a verdadeira filosofia epistemológica.

Desde as oficinas gregas, a gente percebe que a democracia teve problemas de construção: em Atenas, capital da liberdade, havia escravos, e dependia do trabalho dos escravos para o desenvolvimento da “polis grega”. Como se depreende, a escravatura é paradoxal aos direitos democráticos. Por isso, um dos seus filósofos mais notáveis, influenciado pela mentalidade, sugeriu que alguns nasceram para governar outros para serem governados, alguns nasceram para serem artesãos e outros príncipes, ideia que está na contramão do conceito de democracia.

Todavia, o pensamento foi amadurecendo até às revoluções liberais, onde a França foi pioneira no derrube de ditaduras e na redefinição do conceito de liberdade, nas suas três divisas: liberdade, igualdade e fraternidade. Desde aí, foi-se percebendo que a democracia correspondia melhor aos desejos incubados dos povos oprimidos e explorados.

E em Angola? Apesar de se ter implementado o socialismo, logo a seguir à independência, foi a democracia que desenhou o rosto da actual Angola. Porém, tal como na Grécia, também há uma contradição em Angola: a democracia consiste em falar bem do partido no poder, o contrário é visto como ofensa ou difamação a. Foi isto que levou Rafael Marques à cadeia, a morte e perseguição de jornalistas e manifestantes, a prisão dos 15+2… E assim nos perguntamos: o governo angolano sabe mesmo o que é a democracia ou está presa no imaginário opressor da Grécia antiga?

O partido no poder, em Angola, é de matriz ideológica comunista, o embuste e a desinformação fazem parte do seu modo de ser e governar, o que explica a reclamação por uma educação de qualidade, mas o governo tapar os ouvidos à reclamação dos professores e fechar os olhos às péssimas qualidades de ensino, onde um professor foi suspenso por pedir carteiras para os seus alunos, num país onde se exporta sem respeito ecológico à madeira de Cabinda e do Moxico, um país que se atreve a ter um satélite, um país que os da elite política ostentam carros de 200 mil dólares, mas onde também as estradas parecem do séc. XVIII. É este, o país democrático que temos, de prioridades invertidas, onde os governantes têm uma alergia aguda às críticas.

Devido aos direitos democráticos, fala-se de liberdade de expressão e de opinião, mas quando os jovens se manifestam para reivindicarem os seus direitos, alguns jovens sem compromisso patriótico infiltram-se para sabotarem as manifestações pacíficas, para assim legitimarem as prisões arbitrárias e a violência que leva à morte, morte de jovens cujos crimes têm sido apenas de sentir fome e exigir respeito pelas suas vidas ostracizadas.

A democracia em Angola está armadilhada pela ignorância. E como o governo manda em tudo e em todos, os seus académicos, reféns, aparecem a usar sofismas sem substrato lógico para ludibriar o povo inocente e conquistar a empatia dos distraídos. Governar as massas é muito fácil! Olhemos, por exemplo, para o caso bíblico do processo da condenação de Jesus: a multidão, na véspera, recebeu apoteoticamente Jesus; logo a seguir, a mesma multidão, orientada por um grupinho que lhes incomodava o modo de ensinar de Jesus, manipulou a mesma multidão que gritou: “crucifica-o”. Aí está o perigo da democracia sem formação/educação. Os beneficiários disto, dizem: a democracia é mesmo assim, é aceitar a opinião da maioria. Mas que maioria? Se tal maioria nem conhece os seus direitos? O problema nosso é servir-se da maioria inocente e ignorante, para alcançarmos o sucesso por cima do desmazelo do país.

O mal que estamos a fazer hoje ao nosso país, herdarão os nossos familiares mais próximos amanhã, quando o dinheiro que tivermos ganhado hoje por meio do suborno, não nos servir para mais nada. Porque não seremos jovens e gananciosos para sempre. Cuidado com as armadilhas da democracia criadas pelo regime, que confunde o nosso discernimento e nos leva a amar Barrabás e a odiar Jesus… as consequências disso: miséria moral e pobreza antropológica, e com isto, a democracia. hoje depende de quem tem a imprensa em suas mãos.

Por isso, muitos insistem em dizer que Angola está sendo bem governada!

(*) Protótipo da Polémica

Nota. Todos os artigos de opinião responsabilizam apenas e só o seu autor, não vinculando o Folha 8.

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