O presidente da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confecção (ANIVEC) portuguesa manifestou hoje o interesse de Portugal participar no desenvolvimento do sector em Angola, sendo o objectivo primordial “criar o ecossistema”. Mais do mesmo, seis por meia dúzia é a habitual receita.
César Araújo, igualmente CEO da Calvelex, falou à agência Lusa, à margem do evento de inauguração das novas instalações do ISQAPAVE, empresa prestadora de serviços nas áreas da inspecção, fiscalização, controlo de qualidade e ‘rop acess’ (trabalhos em altura).
Segundo o responsável, é preciso quebrar as barreiras existentes entre os dois países, salientando que “não faz sentido que Portugal não tenha uma presença em Angola e ao mesmo tempo que Angola também não tenha uma presença forte em Portugal”.
O responsável associativo frisou que a indústria do vestuário portuguesa fez um plano estratégico e definiu Angola como uma das suas prioridades.
“Sabemos que Angola tem muita dificuldade na criação do ecossistema e eu estou cá desde quarta-feira a apoiar o Luanda Fashion Week e notei a dificuldade dos jovens talentosos, criadores, em fazer as suas colecções”, disse.
Nesse contexto, prosseguiu o presidente da ANIVEC, “o objectivo primordial é criar o ecossistema, desde vestuário, calçado, e ajudar Angola a ser um grande produtor destes produtos”, quer para o mercado interno, quer para exportar.
Além de procurar lucros, é preciso “pôr a semente para que ela possa crescer”, defendeu o empresário com um brilhantismo de raciocínio digno de constar nos primeiros lugares do anedotário luso-angolano.
“Nós o que apostamos agora é na criação destas indústrias e formação. Nós temos que qualificar as empresas, os trabalhadores angolanos, juntamente com Portugal, para que daqui a dez anos, a indústria têxtil, calçado, vestuário e moda de Angola seja uma referência mundial”, vincou.
De acordo com César Araújo, o Governo angolano tem manifestado grande interesse de cooperação, lembrando que o secretário de Estado da Economia português, João Neves, que se encontra em Angola, já teve reuniões com as autoridades angolanas “para que haja uma ligação e um compromisso entre Governos”.
“Já falamos com alguns membros do Governo angolano, que estão também muito entusiasmados e que acham que esta parceria faz todo sentido”, destacou.
“Portugal tem que fazer parte do desenvolvimento económico e social de Angola, não faz sentido nós não estarmos presentes, mas é preciso dar uma nota, Portugal é um país pequeno, somos dez milhões de habitantes, mas queremos estar presentes neste desenvolvimento mesmo sendo pequenos”, acrescentou.
Por curiosidade, repesquemos uma noticia do Folha 8 de Outubro de… 2014: A Associação Empresarial de Paços de Ferreira (AEPF) e o Conselho Empresarial do Tâmega e Sousa (CETS), ambas do Norte de Portugal, organizaram, de 25 de Outubro a 1 de Novembro de 2014, uma Missão Empresarial a Angola (Luanda e Benguela).
Esta Missão teve como equipa consultora a SplendBorn, que organizará localmente uma missão empresarial multissectorial a Angola, centrada nos sectores indicados pela AEPF/CETS, designadamente da construção civil, metalomecânica, calçado, confecção, indústria alimentar, mobiliário, serralharia civil e carpintaria, com o objectivo de promover a oferta portuguesa e o conhecimento entre empresas portuguesas e agentes económicos angolanos. Esta deslocação permitirá ainda às empresas portuguesas adquirirem ou reforçarem conhecimento do mercado, de forma a detectar oportunidades de negócio ou projectos de parceria local.
Neste sentido, e para melhor se conhecer Angola, levou a cabo uma sessão de esclarecimento sobre o mercado angolano.
A Missão foi financiada pelo QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional) no âmbito do projecto de internacionalização da AEPF para 2014-2015, sendo as empresas participantes reembolsadas em 45% ou 50% dos montantes elegíveis.
Mais recentemente, Janeiro de 2021, a Raff Military Textile, empresa turca, previa instalar-se em Angola, através de uma parceria com a empresa angolana Alaide Têxtil, para dar resposta às necessidades locais e regionais em matéria de equipamento militar de alto padrão. No dia 6 de Fevereiro de 2018 o então ministro da Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, general Pedro Sebastião, declarou que as Forças Armadas deviam ser auto-suficientes e contribuir, em tempo de paz, para o desenvolvimento económico e social da nação.
De acordo com uma nota do Ministério da Indústria e Comércio, a intenção foi abordada entre os representantes das duas instituições e o titular da pasta da Indústria e Comércio angolano, Victor Fernandes, que manifestou a abertura do país para todo o tipo de investimento, que vise ajudar o Governo angolano no seu objectivo de diversificar a economia.
A Raff Military Textile, empresa especializada na produção de equipamentos para as forças de defesa e segurança, pretendia adquirir localmente a matéria-prima, desde que a capacidade instalada responda às suas necessidades de produção.
Além de fornecer vestuário militar e de polícia da Turquia, a empresa atende igualmente a Organização do Tratado Atlântico Norte (OTAN) e países como a Geórgia, Albânia e Iraque.
Ao instalar-se em Angola, a empresa poderá igualmente garantir respostas às solicitações que tem recebido de outros países da região, nomeadamente a Zâmbia, África do Sul, Namíbia, Congo, Marrocos, Argélia, Guiné Equatorial, Líbia, Senegal, Chade, Togo, Mauritânia, Mali e Sudão.
No dia 6 de Fevereiro de 2018 o então ministro da Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, general Pedro Sebastião, falou da possibilidade das Forças Armadas serem auto-suficientes no provimento das suas necessidades principais em termos logísticos no que respeita à produção alimentar, mediante projectos agro-pecuários bem concebidos, destinados, numa primeira fase, ao autoconsumo. Por outras palavras, deviam trocar as armas por enxadas, as balas por sementes. Não estava mal, reconheça-se.
Pedro Sebastião, um perito com estágio no exército colonial português, informou que o Comandante-em-Chefe das FAA, João Lourenço, já colocara à disposição meios para as tornar auto-suficientes e, em alguns domínios, contribuir para a poupança de divisas, diversificação da economia e criando empregos.
A actual crise económica e financeira exige de todos, incluindo por isso as Forças Armadas, a exemplo de outros seguimentos, rigor na gestão e execução do orçamento disponibilizado.
Sublinhava Pedro Sebastião que saber fazer melhor com menos se impõe no cumprimento dos programas e planos de trabalho, superiormente orientados, e que compete às chefias militares papel decisivo para uma racional e eficaz organização na utilização dos meios.
O ministro de Estado sugeriu o contínuo fomento da cooperação no âmbito da região Austral com base em consultas, apoio operacional, instalação e operações conjuntas visando a prevenção de conflitos, o restabelecimento e consolidação da paz ou em operações humanitárias.
Recorde-se que, em Junho de 2017, o Governo anunciou que iria investir mais de 10 milhões de euros na criação de uma empresa pública para produzir calçados e uniformes militares.
A constituição da Empresa Fabril de Calçados e Uniformes – Empresa Pública (EP) foi aprovada em reunião de Conselho de Ministros a 7 de Junho de 2017 e o decreto presidencial com a sua formalização publicado em Julho.
O documento refere a “necessidade de se reduzir os custos de importação de uniformes e calçados militares” para justificar a criação desta fábrica estatal, mas também a “importância estratégica” que representa essa produção, sobretudo para os efectivos militares.
A empresa, com sede na zona industrial do Cazenga, arredores de Luanda, poderia ainda estabelecer filiais ou sucursais noutros pontos do país ou mesmo representações no exterior do país, conforme previsto no seu estatuto orgânico.
A sua criação implicava um capital estatutário inicial, público, de 1.920 milhões de kwanzas (10,1 milhões de euros), entre capital fixo e circulante, ficando sob tutela do Ministério da Defesa Nacional.
Apesar de ter por “objecto principal a confecção de calçados e uniformes militares”, a empresa poderá exercer outras actividades comerciais “desde que não prejudiquem a prossecução do seu objecto principal”.
Os três ramos das Forças Armadas Angolanas integram actualmente mais de 100.000 militares, somando-se ainda as forças de segurança, bombeiros e protecção civil.
Recorde-se ainda que em 2015 foi noticiado que Angola aprovou a compra de fardamento e outro equipamento militar no valor de 44,6 milhões de dólares (quase 40 milhões de euros) a uma empresa chinesa.
Um despacho do Presidente angolano autorizava a compra, o negócio envolvia a China Xinxing and Export Corporation, que segundo informação da própria empresa conta com 180.000 trabalhadores e mais de 50 subsidiárias da área militar, como fábricas de vestuário, calçado e protecção individual.
A empresa chinesa refere ter negócios com 40 países africanos, para onde vende anualmente mais de 100 milhões de dólares (88,9 milhões de euros) em equipamentos.
Registe-se também que, falando na Assembleia Nacional, em Luanda, em Outubro de 2015, o então vice-Presidente da República, Manuel Vicente, ao ler o anual discurso sobre o estado da nação em nome do Presidente da República, explicou que as FAA e a Polícia Nacional deviam igualmente avançar com programas próprios que contribuam para a produção de alimentos, vestuário ou calçado, e para satisfazer as suas necessidades, bem como para a construção de infra-estruturas civis, utilizando as capacidades da engenharia militar para apoiar o Estado.
“Há experiências similares bem-sucedidas no Egipto, em Cuba, na China e em França nas quais nos podemos inspirar. Não nos podemos esquecer que nos chamados Estados Providência, em que os governos davam quase tudo de graça aos cidadãos, os seus regimes entraram em crise ou foram à falência”, afirmou o então vice-Presidente Manuel Vicente.
Legenda: João Lourenço durante a inauguração de uma fábrica têxtil, em Benguela, em Fevereiro de 2021.
Folha 8 com Lusa