Organizações cívicas angolanas (à revelia das ordens superiores institucionalizadas há 46 anos pelo MPLA) alertam para o “ambiente de intimidação, perseguição e agressão” protagonizados alegadamente pela Polícia Nacional (do MPLA) contra taxistas promotores da greve de segunda-feira e reprovam os actos de vandalismo e a “parcialidade e manipulação” dos órgãos públicos. “Parcialidade”? Quem diria, não é?
Taxistas paralisaram os seus serviços na segunda-feira, 10 de Janeiro, em Luanda, para reivindicar direitos sociais e económicos, mas verificaram-se actos de vandalismo, com a destruição de um autocarro público e de um edifício de um comité do MPLA, partido no poder há 46 anos, no distrito do Benfica.
Numa nota pública sobre os factos registados na segunda-feira, quatro organizações da sociedade civil angolana “condenam todo o tipo de práticas ilegais, sejam elas de autoria de pessoas de direito privado ou de autoridades públicas”.
A Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), a Associação Construindo Comunidades (ACC), a Associação Ame Naame Omunu (ANO) e a OMUNGA são as subscritoras do documento.
As organizações “reprovam a destruição de bens públicos e privados, tal como a parcialidade e a manipulação dos factos pelos órgãos de comunicação social públicos, bem como a omissão do dever de protecção de bens e pessoas pela polícia nacional”.
“Por serem todas elas contrárias à lei”, assinalam, considerando que os direitos fundamentais “devem ser exercidos pelos seus titulares, cabendo às autoridades criar condições para que os cidadãos os exerçam nos marcos da lei”.
Estas organizações acreditam também que os actos de 10 de Janeiro “têm, seguramente, responsáveis e estes devem ser responsabilizados pelos seus actos se for provada a sua autoria”.
A AJPD, ACC, ANO e OMUNGA “condenam” igualmente a “contextualização e o tratamento dos factos difundidos pelos órgãos públicos, recorrentes das velhas práticas de classificar todas as manifestações pacíficas contra o Governo como sendo actos de pura rebelião contra os poderes instituídos, numa inversão dos valores de uma verdadeira democracia”.
“Toda a orquestração exibida pelos órgãos de comunicação social públicos faz parte de uma velha cartilha autoritária, como por exemplo, a campanha que visou fazer crer que a FNLA [Frente Nacional para a Libertação de Angola] comia pessoas”, lê-se na nota.
No entender destas organizações não-governamentais, que “criticam o olhar silencioso” da Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA), sucursal do MPLA, a referida campanha visa “descredibilizar os promotores da greve e criar uma situação de violência suficiente e necessária para justificar uma acção de repressão contra os promotores da greve”.
Criar no seio dos cidadãos “a ideia de que a greve dos taxistas perseguiu fins inconfessos e contrários aos fins a que os promotores se propuseram” constitui também, para essas associações, outro propósito da referida “campanha dos órgãos públicos de comunicação”.
As organizações cívicas chamam ainda a atenção da comunidade nacional e internacional do que consideram de “ambiente de perseguição, intimidação e agressão protagonizadas pela polícia nacional contra os taxistas por terem promovido a greve”.
A AJPD, ACC, ANO e OMUNGA dizem ter tomado conhecimento de denúncias de “maus-tratos” a que estão sujeitos vários cidadãos detidos pela polícia nacional, na sequência dos actos de vandalismo, e “exigem” aos órgãos de justiça, sobretudo dos tribunais, o “exercício do poder judicial apenas de acordo com a lei”.
Numa posição conjunta e unânime, o Presidente do MPLA (João Lourenço), o Titular do Poder Executivo (João Lourenço) e o Presidente da República (João Lourenço) afirmaram que “o que aconteceu na segunda-feira foi um verdadeiro acto de terror, cujas impressões digitais deixadas na senda do crime são bem visíveis e facilmente reconhecíveis e apontam para a materialização de um macabro plano de ingovernabilidade através do fomento da vandalização de bens públicos e privados, incitação à desobediência e à rebelião, na tentativa da subversão do poder democraticamente instituído”.
A UNITA, principal partido da oposição que o MPLA ainda (não se sabe se por muito tempo) permite em Angola, é o único alvo dos ataques do MPLA. E não há como escapar. Este episódio de violência, condenável e cujos autores devem ser punidos, mais não é do que uma, mais uma, tentativa para o MPLA matar dois coelhos com um só tiro: cancela as eleições e poderá terminar o que deixou por acabar em 1992.
Pelos vistos, mau grado o MPLA estar determinado a decapitar (cortar a cabeça) a UNITA, já que as sucessivas tentativas políticas para a transformar num bode expiatório estão a ser um monumental fracasso.
O partido fundado por Jonas Savimbi, apela, por isso, “às famílias angolanas, às Igrejas e à sociedade em geral, a não se deixarem levar por essa onda que procura distrair os angolanos e impedi-los de buscar os caminhos para o progresso e bem-estar de todos”.
A UNITA diz não aceitar “ser transformada em bode expiatório dos problemas de desgovernação do regime, nem da incapacidade congregadora do Presidente da República, João Lourenço” e reitera “o seu compromisso com a liberdade do povo angolano e reafirma a sua pré-disposição para o diálogo com as instituições do Estado para se reverter o actual quadro e abrir caminho para um futuro airoso para os angolanos na sua pátria comum e apela a todos angolanos a manterem-se calmos e serenos”.
Enquanto isso, o MPLA põe em estado de prontidão combativa toda a sua máquina de guerra, ávida de pôr em prática aquela que é a mais nobre tese do MPLA: A força da razão será sempre derrotada pela razão da força.
Segundo João Lourenço, os incidentes apontam para a materialização de um “macabro” plano de ingovernabilidade, através do fomento da vandalização de bens públicos e privados, incitação à desobediência e à rebelião, na tentativa da subversão do poder democraticamente instituído.
“O que ocorreu na segunda-feira foi um verdadeiro acto de terror, cujas impressões digitais deixadas na cena do crime são bem visíveis”, disse o Chefe de Estado, João Lourenço, na abertura da 12ª sessão do Conselho de Ministros.
Por sua vez, em declarações à Televisão Pública de Angola (TPA) esta segunda-feira, o secretário provincial do MPLA em Luanda, Bento Bento, associou – como não poderia deixar de ser – o acto de vandalização à UNITA, o que o partido do “Galo Negro” rejeitou.
Folha 8 com Lusa