COMO A MALÁRIA SÓ MATA POBRES…

A malária em África matou quase 612 mil pessoas em 2020, mais 68.953 face ao ano anterior, das quais 49 mil por perturbações nos programas e serviços de saúde provocadas pela Covid-19, segundo um relatório divulgado hoje.

O Relatório de progresso sobre a Malária – 2021, elaborado pela União Africana (UA), a Aliança dos Líderes Africanos contra a Malária (ALMA) e a Parceria RBM para o Fim do Paludismo, é apresentado no âmbito da 35ª sessão ordinária da conferência da UA, que decorre em Adis Abeba, na Etiópia.

A apresentação do documento esteve a cargo do presidente da República do Quénia e líder da Aliança dos Líderes Africanos contra a Malária (ALMA), Uhuru Kenyatta.

Segundo o relatório mais recente sobre esta doença, registaram-se 232 milhões de casos de malária (96% do total global) e 611.802 mortes causados por esta doença (98% do total global) em África, em 2020.

Estes números revelam um aumento de 68.953 mortes por malária, face a 2019, com 49 mil destas mortes a serem atribuídas a perturbações dos programas de malária e dos serviços de saúde, provocadas pela pandemia de Covid-19.

No início da pandemia, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tinha alertado para o risco de uma duplicação da mortalidade por malária, devido às consequentes interrupções das campanhas de pulverização e da distribuição de mosquiteiros tratados com insecticida.

O facto de este aumento se ter ficado pelos 9% reflecte as medidas tomadas pelos Estados-membros da UA para impedir o pior cenário possível.

Segundo as estimativas revistas da OMS, citadas no documento, o número de mortes por malária é significativamente mais elevado do que se julgava: 2,1 milhões de mortes adicionais em África desde 2000, um aumento de 19%.

Perante estes dados, os autores do documento concluíram que o continente africano não está no bom caminho para eliminar a malária até 2030, uma meta ambiciosa que os países – quando falam nos grandes areópagos da política internacional – dizem almejar.

“África não atingiu o seu objectivo de reduzir a incidência e mortalidade do paludismo em 40% até 2020, com apenas seis Estados a atingirem pelo menos um dos objectivos.

Apesar destas dificuldades, 15 Estados-Membros da UA alcançaram a sua meta para 2020 ou fizeram progressos significativos nesse sentido.

Reduziram a incidência em pelo menos 40% a Etiópia, a Mauritânia, Cabo Verde, Gâmbia e o Gana, enquanto o Essuatíni (antiga Suazilândia), a Guiné Equatorial, o Quénia, o Ruanda, o Senegal e o Togo reduziram a incidência da malária entre 25% a 40%.

O relatório refere que, em relação à mortalidade, esta foi reduzida em 40% na Etiópia, África do Sul. O Níger, a Serra Leoa e o Togo tiveram a mortalidade reduzida (25% a 40%), enquanto Cabo Verde e São Tomé e Príncipe foram os países da UA sem mortes causadas pela malária desde 2018.

Os autores alertam para o facto de cerca de 63% das actividades dos planos estratégicos nacionais contra a malária não estarem actualmente financiados, em parte devido ao esforço mundial que foi necessário para combater a Covid-19, sublinhando a necessidade de aumentar os recursos contra esta doença.

Malária é doença de pobres

Angola registou, entre Janeiro e Maio de 2021, 3.799.458 casos de malária e 5.573 óbitos, representando um acréscimo de casos, mas uma redução de mortes face ao período homólogo, segundo a ministra da Saúde angolana. Enquanto a malária não entrar nos “bunkers” dos donos do reino, continuará a ter livre trânsito para matar os pobres.

Sílvia Lutucuta apresentou no dia 17 de Junho de 2021 os dados numa conferência de imprensa em Luanda, notando que a malária tem sofrido um ligeiro (segundo os dados oficiais que, contudo, estão muito longe da realidade) incremento no número de casos nos últimos três anos, com ligeiro decréscimo do número de óbitos. Recorde-se que, no dia 25 de Abril de… 2012, o órgão oficial do MPLA, o Jornal de Angola, dizia em manchete: “Malária em Angola em vias de extinção”.

Os casos reportados em 2021, com uma taxa de letalidade de 0,1%, significavam mais 322.717 casos e menos 102 óbitos relativamente aos primeiros cinco meses de 2020.

Entre Janeiro e Março de 2021, face ao mesmo período de 2020, a situação da malária foi de baixa intensidade e, a partir de Abril, após a época chuvosa houve um aumento superior ao registado no mesmo período de 2020, adiantou a governante.

A malária é a principal causa de morte do país, afectando mais as mulheres grávidas e as crianças com menos de 5 anos, em termos de mortalidade. No caso das famílias vulneráveis, a anemia severa e a malnutrição são complicações frequentemente associadas à malária, provocando maior número de óbitos.

Na altura, continuou Sílvia Lutucuta, as províncias mais afectadas foram Luanda, Lunda Norte, Malanje, Uíje, Bié, Benguela, Huambo e Huíla onde havia uma procura elevada da população, aumentando a pressão assistencial nas unidades sanitárias, mais visível no atendimento pediátrico.

Além da malária, que é endémica, é de grande preocupação (é uma afirmação que tem 46 anos de vigência) para o executivo angolano, actualmente, a dengue, que ocorre em muitos casos associada à chikungunya ou catolotolo, à leptospirose e à Covid-19.

Neste período foram notificados 249 casos de dengue, sem óbitos, sendo a província mais atingida o Namibe, e 533 casos de chinkungunya ou catolotolo.

Ao contrário do que diz Sílvia Lutucuta (putativa vice-presidente da República se o MPLA ganhar as eleições), as principais medidas para combater estas doenças era ter governos competentes e sérios. Como não tem, a ministra fala de eliminação dos focos criadores de mosquitos, através de acções enérgicas de saneamento ambiental e combate químico, através do uso de insecticida nas áreas infestadas, bem como sensibilização da população para a mudança de comportamentos ambientais, de forma a tratar as causas e não as consequências.

O Ministério da Saúde (Minsa) está a reforçar (diz o mesmo há 46 anos) as suas orientações metodológicas, cabendo às províncias e municípios a sua operacionalização. Está também a implementar um plano de contingência multissectorial de resposta à malária, bem como um plano emergencial relativo às arboviroses, a reforçar a vigilância e a busca de casos, bem como a logística para o tratamento de casos e melhoria de fluxos para atendimento de doentes.

Foi iniciada em Benguela, Luanda e Huambo, a criação de unidades-satélite para tratamento de malária e dengue, sobretudo nas unidades pediátricas, disse ainda a responsável do ministério.

A malária, doença que tem ceifado a vida de milhares de pessoas e que constitui uma emblemática demonstração da incompetência governativa do MPLA nos últimos 46 anos, pode ser eliminada em Angola até 2030, admitiu em Luanda o coordenador nacional do Programa de Luta Contra a Malária, José Martins, numa mesa-redonda inserida nas Primeiras Jornadas Multidisciplinares do Hospital Geral de Luanda.

Relembre-se que a malária é a principal causa de morte em Angola e é igualmente a responsável pela maior taxa de absentismo escolar e profissional. A doença representa cerca de 35% da demanda de cuidados curativos, 20% de internamentos hospitalares, 40% das mortes perinatais e 25% de mortalidade materna.

O quadro epidemiológico de Angola é caracterizado por doenças transmissíveis e parasitárias, com destaque para as grandes endemias como a malária, o HIV/SIDA e a tuberculose, juntando-se as doenças tropicais negligenciadas, como tripanossomose humana africana. O norte do país continua a ser mais afectado devido às suas características geográficas, sendo as regiões mais endémicas as províncias de Cabinda, Zaire, Uíge, Cuanza Norte e Sul, Malange, e as Lundas Norte e Sul.

Os principais desafios da malária em Angola que descreveremos a seguir têm como base os dados do Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitário 2012-2025, aprovado pelo Executivo, e a Declaração de Abuja (2000) da qual Angola é subscritora.

– Redução da mortalidade infantil resultante da doença. Em cada mil crianças que completam o primeiro ano de vida, 25 morrem entre o primeiro e o quinto aniversário. Numa comparação com cinco países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) – Namíbia, Zâmbia, República Democrática do Congo, Lesoto e Moçambique -, o inquérito revela que Angola está atrás apenas da Namíbia.

– Pulverização intra e extra domiciliar direccionadas para os municípios tidos como de alto risco, distribuição de redes mosquiteiros e campanha de consciencialização da população sobre os métodos de prevenção à malária.

– Adopção de instrumentos legislativos no Sistema Nacional de Saúde para implementar as medidas de prevenção e controlo das emergências de saúde pública de importância nacional e internacional.

– Assegurar a formação contínua pós-graduada e a sustentabilidade de recursos humanos e de serviços de saúde de qualidade.

Actualmente, cerca de 36% da população angolana vive abaixo da linha de pobreza e com dificuldade de acesso aos serviços públicos básicos (água, saneamento, energia, saúde, educação e habitação).

O governo de Angola aderiu à iniciativa Roll Back Malária/Fazer Recuar o Paludismo (RBM), lançada por algumas Agências das Nações Unidas, como a OMS, UNICEF, PNUD e Banco Mundial em 1998, e desde então foram definidas politicas e estratégias para estar em sintonia com as componentes técnicas da declaração de Amsterdão e das metas da Declaração de Abuja sobre o combate a malária e revitalização do sistema nacional de saúde.

É importante destacar que o governo cessante, liderado por José Eduardo dos Santos, tomou a Iniciativa Presidencial contra a Malária em reforço ao Plano Estratégico do Programa Nacional de Controlo da Malária 2011-2015 do ministério da Saúde.

No dia 4 de Agosto de 2019, o Presidente João Lourenço felicitou o médico angolano Filomeno Fortes pela sua eleição como director do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) de Portugal. (Quase) todos os angolanos – mesmo os que o MPLA não considera angolanos – se juntaram às felicitações.

Numa nota postada na sua conta Twitter, o chefe de Estado angolano, igualmente Presidente do MPLA (partido no Poder desde 1975) e Titular do Poder Executivo, considerou que essa eleição representa o reconhecimento da dedicação de Filomeno Forte aos estudos e ao trabalho e que “este é o caminho do sucesso”.

“Parabéns ao prof. Doutor Filomeno Fortes pela conquista, ao atingir por mérito o prestigiado lugar de director do Instituto de Medicina Tropical de Portugal”, escreveu o Presidente João Lourenço.

A eleição de Filomeno Fortes, especialista em doenças tropicais e coordenador do doutoramento em Ciências Biomédicas da Universidade Agostinho Neto, em Luanda, ocorreu, em Lisboa, depois de um concurso internacional em que teve como outro finalista o médico brasileiro Roberto de Andrade Medronho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Na apresentação pública da sua proposta de acção para o IHMT para o período de 2019-2023, Filomeno Fortes defendeu o reforço do prestígio nacional e internacional do instituto, bem como as parcerias com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).

Filomeno Fortes já desempenhou vários cargos em Angola, incluindo os de director nacional de Controlo de Endemias, chefe do Departamento de Controlo de Doenças da Direcção Nacional de Saúde Pública e director do Programa de Controlo da Malária.

A nível internacional foi nomeado, em 2012, secretário-geral da Federação Internacional das Doenças Tropicais.

Filomeno Fortes é o primeiro estrangeiro a assumir a direcção do IHMT, instituição que coordena todos os programas de saúde a nível da CPLP.

Folha 8 com Lusa

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