A Vida TV, um dos canais suspensos desde Abril pelo governo angolano por “inconformidades” fecha portas no final de Julho, deixando no desemprego mais de 300 profissionais, depois do anúncio da rescisão do contrato com a DSTV.
A direcção da empresa comunicou a decisão internamente aos seus colaboradores, depois de ter recebido a notificação da operadora sul-africana, que rescindiu o contrato por incumprimento, segundo uma fonte ligada ao canal.
Tchizé dos Santos, foi uma das investidoras iniciais do canal, mas de acordo com uma fonte contactada pela Lusa, que pediu para não ser identificada, a filha do ex-presidente José Eduardo dos Santos foi convidada a sair do projecto poucos meses depois do início da operação, “por causa dos seus interesses pessoais e políticos”. Se se chamasse Tchizé Lourenço tudo seria diferente…
“Nunca tivemos nenhuma contribuição da senhora, nunca ninguém a viu por aqui e ninguém estava a trabalhar sob a sua orientação ou agenda, basta olhar para o conteúdo produzido. Mas ficámos pelo caminho por causa dessa infeliz associação”, disse a fonte, sublinhando que “quem aqui está [na Vida TV], só queria trabalhar, não quer saber de política”. Ou seja, deveria estar sempre de acordo com quem manda na política (e em tudo o resto), o que significa na actualidade João Lourenço.
“A senhora vai continuar rica, como diz várias vezes nas redes sociais e a passear pela Europa e nós vamos voltar para a casa dos nossos pais. Enquanto o país continuar refém do interesse dos políticos, só o povo é que sofre. Infelizmente aqui temos mais um triste exemplo. O ministério, com a suspensão, quis acabar com o canal, já está, conseguiu”, prosseguiu.
No dia 21 de Abril, o governo angolano suspendeu os canais Record TV África, ZAP Viva e Vida TV, medida justificada com “inconformidades legais”, deixando também suspensos os registos provisórios dos jornais, revistas, páginas web (site) de notícias e estações de rádio sem actividade efectiva nos últimos dois anos, cuja lista nunca foi divulgada.
Seguir-se-ão todos aqueles que, não tendo “inconformidades legais”, têm graves inconformidades em relação à ordem superior que a todos obriga a considerem como única verdade o que for dito pelo MPLA,
No caso da Record TV África, detida pela Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) envolvida em várias polémicas e processos judiciais em Angola, o Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social (MINTTICS) alegou que a empresa tinha como director executivo um cidadão estrangeiro, bem como jornalistas estrangeiros que não estavam acreditados nem credenciados no Centro de Imprensa Aníbal de Melo.
Por outro lado, as empresas fornecedoras de televisão por assinatura, nomeadamente, a TV CABO S.A, a DSTV ANGOLA, SA, a FINSTAR — detentora da ZAP TV, da empresária e também filha do anterior presidente angolano, Isabel dos Santos, estão devidamente legalizadas, mas “distribuem os canais ZAP Viva, Vida TV e Rede Record sem o registo para o exercício da actividade de televisão em Angola”, o que determinou a suspensão.
Na altura, o MINTTICS disse que a sua actuação visava permitir ajustar o processo de atribuição do título de registo definitivo do exercício da actividade às empresas de comunicação social e não deu mais explicações até à data.
Organizações como o Sindicato dos Jornalistas Angolanos e o Instituto para a Comunicação Social da África Austral (MISA-Angola) manifestaram preocupação face a esta decisão, por pôr em causa a pluralidade de informação passou a ser veiculada apenas por canais públicos, controlados pelo estado angolano (leia-se MPLA), e questionaram as leis invocadas para a suspensão.
Por sua vez a ERCA – Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana, continua no seu revolucionário processo de garantir que, conforme ordens superiores do seu patrão (o MPLA), todos os jornalistas devem “transferir” o cérebro para os intestinos e a coluna vertebral para a sede do MPLA, de modo a não serem abrangidos pelas “inconformidades legais”
A antiga deputada do MPLA, Tchizé dos Santos, afirmou na altura que a medida expunha a “ditadura” de João Lourenço e voltou a queixar-se de perseguição política aos familiares do antigo presidente, ligados a dois dos três canais suspensos (Zap Viva e a VIDA TV).
O Instituto para a Comunicação Social da África Austral (Misa) Angola considerou no passado dia 28 de Maio que a liberdade de imprensa no país “está asfixiada”, lamentando o “silêncio” das autoridades sobre a suspensão de vários órgãos privados. Parafraseando João Lourenço a propósito dos massacres de 27 de Maio de 1977, o MPLA pedirá desculpas e perdão e fornecerá certidões de desemprego… gratuitas.
“Trazemos este debate, porque nos últimos anos temos estado a sentir um recuo, uma asfixia a nível da liberdade de imprensa, achamos que é importante trazermos essa reflexão porque vamos olhando, enquanto Misa, com alguma preocupação”, afirmou o jornalista Guilherme da Paixão, do Misa Angola.
A preocupação do instituto cinge-se, sobretudo, pelas “medidas brutas” usadas para o encerramento de muitos órgãos privados que não se coadunam “com um Governo sério e responsável”, acrescentou.
Aludindo, particularmente, à suspensão das actividades das televisões Zap Viva, Vida TV e Record no país, Guilherme da Paixão lamentou o procedimento das autoridades, considerando que a medida inicial “seria uma advertência”.
No dia 28 de Maio, à margem da conferência “Liberdade de Imprensa em Angola: Situação Actual e Perspectivas”, em Luanda, o dirigente do Misa Angola lamentou o “silêncio das autoridades” sobre o processo.
“O Governo é o mesmo, e como é que agora lhes é tirada essa possibilidade, de emitir? E ainda que tenham cometido alguma coisa deviam ter sido chamados à atenção, com uma advertência”, frisou.
“Essas empresas, pelo que dizem, não foram notificadas, foram apanhadas de surpresa, e é isto que nos preocupa também enquanto Misa Angola”, notou.
O responsável do Misa questionou ainda: “E será que o Estado vai ressarcir o dinheiro dos cidadãos que pagaram os pacotes para terem acesso aos serviços dessas televisões hoje suspensas o seu serviço durante esses dois meses?” “Achamos que não e isso é também um atropelo à sua liberdade”, afirmou.
Para Guilherme da Paixão existe no país uma “evidente asfixia” dos órgãos privados que deriva igualmente da “falta de apoios, de financiamento” e da publicidade que não aparece, pelo que, considerou, “são muitas liberdades que ficam coarctadas”.
Folha 8 com Lusa