Eis o conteúdo de uma carta do Sindicato dos Jornalistas de Portugal remetida ao Ministro da Administração Interna, ao Superintendente-chefe da Polícia de Segurança Pública e ao Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana a propósito do crescendo de violência dos manifestantes anti-vacinas contra os jornalistas.
«A Direcção do Sindicato dos Jornalistas (SJ) encara com grande preocupação o crescendo de violência dos manifestantes anti-vacinas contra os jornalistas que cobrem eventos relacionados com a vacinação para a Covid-19.
Os jornalistas, e o Sindicato que os representa, respeitam e defendem o direito de todas as pessoas e instituições à manifestação, tal como é consagrado na lei, sem violência, com respeito pelos outros e em acordo com o quadro legal vigente.
O Sindicato dos Jornalistas recorda, lamentando ter de o fazer num país democrático, que os jornalistas, e o exercício do jornalismo, são um pilar fundamental da democracia, pelo escrutínio que fazem dos abusos de poder, na denúncia de injustiças e atropelos aos direitos dos nossos concidadãos. O SJ não pode ficar parado, nem indiferente, quando são ameaçados, além das pessoas e profissionais, direitos tão básicos dos cidadãos como o de informar e ser informado, assim como o direito ao trabalho e a exercê-lo em condições de dignidade, segurança e liberdade.
O SJ encara com grande preocupação o anúncio de um protesto de manifestantes anti-vacinas junto à delegação da RTP em Vila Nova de Gaia, temendo que esteja em causa a integridade física dos jornalistas, assim como o direito destes ao trabalho, pelo que apela a Vossa Excelência que diligencie para que sejam garantidas as condições de seguranças destes profissionais, com reforço de meios policiais, se assim as autoridades competentes acharem necessário.
Face a este recrudescer de ameaças inaceitáveis, que, em alguns casos, se materializaram em agressões, como sucedeu na passada quinta-feira, e temendo que estes atentados à integridade física, que infelizmente parecem estar a tornar-se mais frequentes e mais violentos, o Sindicato dos Jornalistas apela, ainda, a Vossa Excelência que seja reforçada a presença da polícia nos locais onde se manifestam estes protestantes, dando, dentro do possível, um suporte de maior proximidade aos jornalistas, que apenas cumprem a missão de informar.
O SJ exorta, ainda, os jornalistas a redobrarem cuidados nestas manifestações e a procurarem protecção policial sempre que sentirem a sua integridade física em risco ou que estão a ser limitados ou impedidos de trabalhar. Insta, ainda, os jornalistas a apresentarem queixa às autoridades, zelando para que os infractores sejam identificados na hora pelas autoridades, bem como apela às direcções dos órgãos de comunicação social para prosseguirem com queixas, até às últimas consequências, para com estas e todas as outras pessoas que não respeitam direitos consagrados constitucionalmente.
O SJ lembra, ainda, que a agressão de jornalistas é um crime público, pelo que quem o testemunhar tem o dever de o denunciar e agir.»
Recorde-se que o vice-almirante Gouveia e Melo, coordenador do grupo de trabalho responsável pela vacinação em Portugal, foi recebido na noite de sábado por cerca de duas dezenas de manifestantes à porta do Centro de Vacinação de Odivelas. O responsável pela task force optou por não evitar ou contornar os manifestantes, gerando-se um momento de alguma tensão, com o militar a ser alvo de insultos.
Questionado pelos jornalistas sobre o que é que os manifestantes lhe tinham dito quando entrou, o vice-almirante afirmou: “Olhe, o que estão a dizer agora, genocídio e assassínio, chamam-me assassino, o que quer que eu lhe diga?”. O responsável da task force salientou que a “única coisa” que tinha a dizer aos manifestantes era que “o obscurantismo no século XXI continua”.
É claro, disse, que as pessoas “têm direito às suas opiniões”, mas “não têm é o direito a impor a sua opinião aos outros”. E, quando essa “opinião é imposta já de forma violenta, deixa de ser democracia, portanto têm direito à sua opinião, têm direito a falar uns com os outros, não têm direito a empurrar, não têm direito a condicionar as pessoas e, por isso, é que eu entrei ali pela porta principal”, sublinhou.
E devolveu as acusações que os manifestantes lhe dirigiram: “O negacionismo e obscurantismo é que são os verdadeiros assassinos.” E sublinhou: “A vacinação é um acto voluntário. Ninguém obriga ninguém a ser vacinado. Mas já se percebeu o que é que mata, não é a vacina. É o vírus.”
Gouveia e Melo visitava Odivelas, nos arredores de Lisboa, no dia em que se iniciou o processo de vacinação dos jovens entre os 16 e os 17 anos. “Já se apresentaram mais de 102 mil jovens e o dia ainda não acabou”, informava Gouveia e Melo.
“Julgo que jovens na sua juventude já demonstram uma maturidade muito superior ao que está atrás de mim neste momento”, acrescentou, referindo-se à manifestação à porta do centro. “Os jovens responderam ‘sim’ [à vacinação].”
Mais tarde, confessou que ver jovens a furar a manifestação “para se virem vacinar” ali em Odivelas tinha sido “dos momentos mais inspiradores” que tinha neste processo de vacinação.
“Ter conversado com jovens que disseram: ‘aqueles senhores andaram a encher-me a cabeça e eu passei pela fila e vim vacinar-me’ enche-me o peito de esperança porque o nosso povo, afinal de contas, tem muito mais sabedoria do que a gente possa pensar”, enfatizou o vice-almirante.
À saída, o vice-almirante saiu por onde entrou, pela porta principal, ladeado por agentes da PSP, por entre gritos de manifestantes a chamarem-no de “assassino”.
À Lusa, uma das organizadoras do protesto repetiu alegações sobre a segurança das vacinas e vangloriou-se pelo facto de o movimento, no sábado de manhã, ter convencido “pelo menos seis jovens” a não terem tomado a vacina durante uma acção na Cidade Universitária, em Lisboa.