As autoridades policiais angolanas detiveram 2.735 pessoas, de Julho à presente data, no âmbito de uma operação, denominada “Cacimbo”, realizada para combater o aumento da criminalidade no país, com destaque para os homicídios. Isto já para não falar dos criminosos dos 400 parafusos da linha do Caminho-de-Ferro de Luanda.
Os resultados da operação iniciada em 2 de Julho passado e que deverá terminar em Setembro, foram hoje apresentados pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC), que resolveu levar a cabo esta acção depois de analisados os dados estatísticos dos níveis de criminalidade registados no período de Janeiro a Junho, em todo o país, com maior pendor para Luanda, a capital.
No período em referência, foram realizadas 811 micro-operações, que permitiram o esclarecimento de 1.588 crimes de natureza diversa, que levaram à detenção 2.735 elementos, bem como o desmantelamento de 20 associações criminosas.
Entre os crimes esclarecidos, na sequência de investigações, as autoridades policiais destacam 50 homicídios, dos quais 31 qualificados, 13 simples, seis negligentes e duas tentativas de homicídio.
A lista integra ainda 328 roubos, 190 furtos, cinco ofensas à integridade física, 42 de tráfico e venda de drogas, nomeadamente cocaína, canábis e estupefacientes, 31 de tráfico e posse de armas proibidas, 16 falsificações de documentos, 22 agressões sexuais, 17 abusos sexuais de menores de 14 anos, 13 burlas por defraudação e nove associações de malfeitores. Nove casos de uso de documentos falsos, quatro roubos de viaturas, três sequestros, e uma tentativa de roubo também constam da lista.
No balanço são destacados ainda o esclarecimento de 342 crimes de natureza económica, que permitiram a detenção de 334 elementos, dos quais 74 estrangeiros envolvidos fundamentalmente na violação das normas de abastecimento regular ao público consumidor.
No período em referência, foram apreendidos diversos meios, sendo 157 armas de fogo de diversos modelos e calibres, 39 carregadores, 161 munições, um engenho explosivo (granada F-1), 141 viaturas de marcas e modelos diversos, 161 motorizadas, 74 telemóveis, 994,831 quilogramas de estupefacientes, 29 gramas de cocaína, e 173.398 litros de combustível.
O destaque para os crimes mais relevantes esclarecidos vai para o caso de sequestro, concorrido com homicídio voluntário, em 26 Julho, no bairro Rocha Pinto, numa acção praticada por três elementos já detidos, com idades entre 22 e 45 anos.
Os detidos são suspeitos da morte de um jovem de 15 anos, que executaram e posteriormente queimaram “com intenção de não deixar vestígios”, refere o comunicado. De acordo com as investigações, o móbil do crime era a extracção do órgão genital masculino para suposto ritual de feitiçaria.
“Neste sentido importa realçar que não se tratou de tráfico de órgãos humanos, como vem sendo badalado nas redes sociais e alguns órgãos de comunicação social, pois este facto enquanto tipicidade criminal, careceria de outros pressupostos que estão reunidos”, salienta a nota.
Um outro homicídio qualificado, em Junho, em Luanda, por disparo de arma de fogo do tipo AKM, concorrido com o roubo da viatura, foi igualmente esclarecido.
O crime registou-se no interior de uma residência e a vítima era solteira, de 45 anos, e enfermeira do Hospital Américo Boavida. Estão detidos, quatro cidadãos de 21 a 31 anos, encontrados com o telemóvel da vítima.
“Quanto aos crimes de homicídio em Luanda, dar nota que são infundadas informações de registo de 35 homicídios, como circula num áudio nas redes, pois nem a nível do país, nunca se registou num só dia 35 homicídios”, lê-se na nota.
Apesar dos números, o SIC caracteriza como “estável” a situação de segurança pública no país, e de forma particular em Luanda.
Recorde-se, sem pretender cacimbar a operação “Cacimbo”, que Paulo de Almeida, o ilustríssimo comandante da Polícia Nacional (do MPLA) disse em Outubro de 2018 durante uma formatura dos efectivos da corporação no âmbito da “Operação Resgate”, que pelo menos um efectivo da polícia angolana, em média, e “a coberto da farda”, se envolvia diariamente em acções criminosas.
Paulo de Almeida lembrou que a operação policial iria estender-se a todo o país, visava essencialmente o “resgate do civismo, da ordem, da conduta sã e da dignidade”, pelo que “a ordem deve começar no seio da polícia”, reconhecendo que vários agentes praticam “burlas, falsificações e extorsões a cidadãos”.
Discursando perante milhares de efectivos da Polícia, em cerimónia que teve lugar no Instituto Superior de Ciências Policiais e Criminais de Angola, em Luanda, e sem especificar números, Paulo de Almeida manifestou-se “preocupado” com número de agentes da polícia envolvidos no crime.
“Estou preocupado com o número de polícias envolvidos em acções criminais. Todas as semanas, para não dizer dias, registamos a participação de um ou outro agente da polícia envolvido em acções criminais. Isso tira-nos a autoridade”, lamentou.
“Retira a nossa capacidade, frustra a nossa acção. Quero aqui dizer que, em representação de toda a polícia do país, temos de combater essas batatas podres no nosso seio”, adiantou Paulo de Almeida.
O, na altura, comissário-geral da Polícia assegurou mesmo a necessidade de “neutralizar agentes que, a coberto da farda, cometem diariamente crimes diversos”, apelando à “vigilância” aos agentes da polícia e à sociedade para que “denunciem essas práticas”.
Para Paulo de Almeida, se a Polícia Nacional tenciona impor a ordem é necessário, inicialmente, que os efectivos da corporação que tutela “sejam ordeiros e disciplinados para que a operação decorra sem máculas”.
“Não queremos realizar uma operação com essas manchas no nosso seio. É preciso que cada um seja o vigilante do outro, é preciso que cada um identifique e denuncie aqueles que estão com comportamentos marginais no nosso seio. É preciso ganhar e resgatar a confiança da população à polícia nacional”, exortou o oficial superior.
Durante a sua intervenção, o comandante geral da Polícia disse que há elementos da corporação que se dedicam à “burla e à falsificação”, considerando que os “batuqueiros e penteadores” serão “banidos da corporação”.
“Não é a extorsão ou o crime, que vos vai (efectivos da Polícia) dar glórias ou oportunidades. As grandes glórias vão sair do vosso empenho e desempenho”, realçou.
Ciente das dificuldades que a Polícia ainda enfrenta, como a carência de “infra-estruturas, de meios de locomoção e dificuldades técnicas e logísticas”, Paulo de Almeida admitiu que as dificuldades “não serão superáveis a curto prazo”.
“Mas a nossa firmeza e determinação vai fazer com que nós ultrapassemos isto. Sem esforço não haverá êxitos na nossa missão”, assegurou.
Folha 8 com Lusa