Os processos-crime abertos pela Procuradoria-Geral da República contra diversas individualidades que contribuíram para a depredação desbragada e amoral do erário nacional têm trazido alento a diversos sectores da sociedade angolana que, antes cépticos em relação ao discurso anticorrupção de João Lourenço, reconhecem agora haver um combate tanto contra a corrupção como contra o peculato, o tráfico de influências e outros males que levaram Angola ao marasmo económico-financeiro.
Por Nuno Álvaro Dala
Neste sentido, e por inerência de funções, o Procurador-Geral da República, Hélder Fernando Pitta Gróz, tem-se apresentado como o cicerone de um processo que tem produzido um estado de opinião favorável a Angola na arena internacional. O Presidente João Lourenço e o Procurador-Geral da República são as principais figuras de peso que personificam o propalado combate contra a corrupção e males correlatos.
Entretanto, é necessário que os Angolanos e as Angolanas saibam que o Procurador-Geral da República, Hélder Fernando Pitta Gróz, é ladeado por uma figura altamente corrupta e tóxica à (nova) imagem e reputação da Procuradoria-Geral da República.
Trata-se do Procurador-Geral Adjunto da República, Beato Manuel Paulo, que, mais do que estar envolvido em polémicas, é titular de diversos negócios sinistros que constituem verdadeiros crimes, e que, em condições normais, estaria exonerado e constituído arguido em diversos processos. É um magistrado corrupto, cujo comportamento é digno de um mafioso.
1 – O esquema de extorsão e chantagem
O Procurador-Geral Adjunto da República, Beato Manuel Paulo, criou e pôs em funcionamento uma rede criminosa que recorre à extorsão e à chantagem como formas de ganhar dinheiro. Relataremos aqui dois casos paradigmáticos que ilustram eloquentemente o carácter corrupto e criminoso do testa-de-ferro do Procurador-Geral da República.
Caso 1: em 2014, as cidadãs Cássia Manuela da Costa Macedo António e Lídia Jerónimo Quinepangue viram as suas contas bancárias, domiciliadas no BPC (Banco de Poupança e Crédito, sob os números 0265-G719930-012 e 0265 – 648261-012, respectivamente), bloqueadas pelo referido banco, em obediência a uma ordem baseada na suspeita de que as referidas contas serviam como instrumentos de lavagem de dinheiro. As diligências que as duas cidadãs levaram a cabo junto da DAI (Direcção de Auditoria e Inspecção) e da DPC (Direcção de Provedoria de Clientes) do BPC não surtiram qualquer efeito.
O processo passara para outro nível, e o representante das senhoras solicitou a intervenção do Vice-Procurador-Geral da República, Mota Liz, que, depois de ter em prazo razoável estudado o caso, o remeteu ao Procurador-Geral Adjunto da República junto da Polícia Económica, Beato Manuel Paulo. Este deu um tratamento, inicialmente, adequado. Ouviu o representante do BPC e as duas cidadãs com as contas bloqueadas. Preparou posteriormente um ofício ao banco, a ordenar o desbloqueio. Todavia, o magistrado servindo-se de um intermediário, informou às senhoras e ao seu representante que tinha recebido autorização do Procurador-Geral da República para acertar os valores da comissão.
O intermediário afirmou que o magistrado Beato Manuel Paulo tinha sido colocado naquela posição para fazer negócio. Os acertos foram feitos, mas, dias depois, o representante das senhoras foi chamado de urgência ao gabinete de Beato Manuel Paulo, que lhe comunicou que o Vice-Procurador Mota Liz retomara o processo, tendo suspendido o envio do ofício. Mais do que isto, o processo tinha sido encaminhado para a Direcção Nacional Contra a Corrupção, sob a responsabilidade do magistrado Azevedo Lucondo Jeremias.
Usando os seus capangas Serafim Coelho, José Maria Tchimbaca e Domingos Serafim, Beato Manuel Paulo, em conluio com outro magistrado de nome Vitangue, exigiu de Cássia Manuela da Costa Macedo António e de Lídia Jerónimo Quinepangue a astronómica quantia de Kz 400 000 000 00 (quatrocentos milhões de kwanzas).
As duas senhoras recusaram-se atender às exigências de Beato Manuel Paulo, que, para legitimar as suas exigências, alegou que partilharia, isto é, dividiria os valores com o Procurador-Geral da República, Hélder Fernando Pitta Gróz.
Caso nº 2: em meados de 2018, acossado por uma dívida gigantesca que tinha contraído com o Presidente do Conselho de Administração do Grupo Delta, Francisco Yoba Capita, e pela possibilidade que o mesmo adiantara de recorrer às autoridades para reaver o seu dinheiro, o coronel José Ricardo Tchiwana recorreu ao Procurador-Geral Adjunto da República, Beato Manuel Paulo, a fim de encontrar junto dele uma solução.
Tendo ouvido a explanação do primeiro, o magistrado concordou em ajudar, mas na condição de que recebesse metade do valor da dívida que o coronel contraíra, em nome da UGP (Unidade da Guarda Presidencial). Na verdade, para dar o primeiro passo no processo, Beato Manuel Paulo recebeu do coronel a quantia de Kz 50 000 000 00 (cinquenta milhões de kwanzas). Em consequência, o magistrado abriu um processo-crime contra Francisco Yoba Capita, sob a acusação de burla por defraudação.
Os dois casos, envolvendo três vítimas, demonstram claramente que o Procurador-Geral Adjunto da República, Beato Manuel Paulo, é corrupto. Não possui autoridade moral para continuar na magistratura.
2 – A máquina de perseguição a uma magistrada
Beato Manuel Paulo é também o responsável de uma máquina que nos últimos 2 anos tem estado a perseguir uma colega sua, a magistrada Cláudia Monteiro de Araújo, esposa de Francisco Yoba Capita.
Em Agosto de 2018, quando se encontrava em repouso médico depois de ter sido submetida a uma intervenção cirúrgica, a magistrada recebeu uma chamada do seu superior hierárquico, Beato Manuel Paulo, alegando que tinha necessidade de falar com ela. A magistrada respondeu dizendo que estava em processo de convalescença, pelo que, não estava em condições de atender à injunção. Em vão.
O Procurador insistiu para que Cláudia Monteiro de Araújo fosse ao seu gabinete no horário das 5h00 às 6h00. Ela recursou-se reiterando que, dada a sua condição de saúde, não estava sequer em condições de subir às escadas. Ele insistiu dizendo secamente que escada era problema de todos. Transcorridos alguns dias, Beato Manuel Paulo voltou a ligar com o mesmo tom autoritário e deixando claro que Cláudia Monteiro de Araújo não tinha opção senão obedecer. Sugeriu que o encontro corresse no Hotel Vitória Garden, localizado nas proximidades do Estádio 11 de Novembro, na Via Expresso. Pouco depois disse que não seria mais aí o encontro, mas, sim, no Camama, junto a uma pensão. Por razões de segurança, a magistrada foi acompanhada do esposo.
Ao notar que ela não estava sozinha, como queria, Beato Manuel Paulo não conseguiu concretizar o seu objectivo. Desdobrou-se em pedidos de desculpas, fingindo que não sabia que a senhora estava naquele estado de saúde. A presença do parceiro da magistrada deixou-o especialmente embaraçado. Pouco tempo depois, usando o grupo de perseguição que criara, o Procurador-Geral Adjunto da República, Beato Manuel Paulo, deu início a um período de terror, marcado por ameaças de agressão e de morte ao casal e seus filhos, vigilância à residência, ameaças aos trabalhadores domésticos, instrumentalização dos agentes da UPIP (Unidade de Protecção de Individualidades Protocolares) destacados na residência do casal, tentativa de revista e apreensão na mesma, tentativa de implantação de drogas na residência e, mais do que isto, o grupo às ordens de Beato Manuel Paulo deteve e colocou em cárcere privado um dos guardas.
3 – O cárcere privado
A 27 de Dezembro de 2019, Augusto Carimba Quessongo, guarda da família, foi detido e introduzido numa viatura de marca Toyota Hilux com a matrícula LD – 55 – 67 GB, pertencente ao coronel José Ricardo Tchiwana. Os captores fizeram uma enxurrada de perguntas a Augusto Carimba Quessongo, tais como estas: Onde estão os chefes? Quando foram a Portugal? Quantos carros têm? Onde trabalha o chefe? Há mobília nova no interior da casa?
Depois de terem dito que os homens da PGR (Procuradoria-Geral da República) e do SIC (Serviço de Investigação Criminal) acabariam por alcançá-lo no portão, os captores atiraram-no no final da rua. Mais tarde apareceu diante da residência do casal um grupo de cerca de 25 indivíduos, os quais insistiram na tentativa de invadi-la. Romperam os portões, amarram os cães e assumiram posição de disparo. Instantes depois, fez-se presente o magistrado José Matamba Armando, o qual legitimou toda aquela operação ilegal e pejada de falta de tino moral, porquanto, estava ele envolvido num acto de tentativa de invasão de uma colega sua – uma magistrada do Ministério Público.
A quadrilha era composta igualmente por antigos trabalhadores de Francisco Yoba Capita, os quais foram recrutados por Beato Manual Paulo que, com auxílio de um outro magistrado, António Binza Quilombo, executou tais acções.
A figura de Beato Manuel Paulo é tóxica tanto para a PGR como para o País. A luta contra a corrupção, que tem sido levada a cabo ao longo dos último 2 anos esbarra-se com magistrados cujo comportamento é criminoso e mafioso.
Beato Manuel Paulo tem desempenhado tanto o papel de testa-de-ferro como de braço direito do Procurador-Geral da República, Hélder Fernando Pitta Gróz, a quem tem delegado responsabilidades que obviamente não decorrem de mera posição hierárquica na estrutura administrativa da Procuradoria-Geral da República. Por exemplo, no Despacho Nº 58/19 de 26 de Agosto de 2019, o titular da PGR anunciou que, por ausência sua e dos Vice-Procuradores-Gerais da República, indicara «o Sr. Dr. Beato Manuel Paulo, Procurador-Geral Adjunto da República», para «tratar dos assuntos correntes» da instituição.
A 17 de Dezembro de 2019, a Deliberação Nº 11/19 do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público, procedeu a uma série de exonerações e nomeações de magistrados, incluindo Beato Manuel Paulo. Porém, para espanto dos funcionários da PGR, dois dias depois da referida deliberação, quando os exonerados e nomeados preparavam-se para as novas funções, foi feita uma comunicação interna a declarar o seguinte: «[Ponto Único]: todas as exonerações, nomeações e movimentações constantes na deliberação nº 11/19, de 17 de Dezembro, do Plenário do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público, terão efeitos a partir do dia 1 de Fevereiro».
A comunicação interna deixa evidente que a razão oficial de os exonerados e nomeados voltarem às posições antigas devem-se à necessidade de criação de condições matérias, mas o facto é que a referida mudança permitiu que o testa-de-ferro do Procurador-Geral da República realizasse uma série de diligências que resultaram em múltiplos problemas tanto a funcionários da PGR como a cidadãos. Destes últimos destacamos os muitos que foram vítimas de acções de extorsão e chantagem. No primeiro caso, o inferno que a magistrada Cláudia Monteiro de Araújo tem vivido (bem como o parceiro e filhos) é um exemplo. O casal recebeu ameaças extremas até tão recentemente como a 13 de Janeiro!
O facto de Beato Manuel Paulo, uma figura sinistra e altamente improba, ser testa-de-ferro do Procurador-Geral da República, Hélder Fernando Pitta Gróz, lança luzes sobre a própria autoridade ético-moral do titular da instituição cuja atribuição é ser guardiã da legalidade em Angola.