A resolução de conflitos (em África) é um problema de todos os africanos e Angola quer partilhar experiências e trazer contributos para este debate na Bienal de Luanda, disse à Lusa o secretário de Estado da Cultura angolano, Aguinaldo Cristóvão.
A não-violência é um dos temas de destaque na Bienal de Luanda – Fórum Pan-Africano para a Cultura de Paz que começa quarta-feira, em Luanda, e se prolonga até domingo.
Em África “temos alguns problemas relacionados com conflitos, temos violência, mas estes problemas não podem ser vistos de modo estanque”, disse Aguinaldo Cristóvão, sublinhando que a resolução dos conflitos deve ser partilhada por todos os africanos.
“A resolução da violência na África do Sul não pode ser vista apenas como um problema da África do Sul; é um problema nosso, enquanto africanos. É um problema da região”, reforçou.
Aguinaldo Cristóvão indicou que o Estado angolano “tem uma experiência em matéria de resolução de conflitos muito importante”, que quer partilhar, e uma filosofia de apoio aos outros países, tentando “encontrar mecanismos de desenvolvimento conjunto”, tendo sido esta uma das razões por que decidiu acolher a Bienal de Luanda.
A fazer fé na “partilha” de resolução de conflitos que o Governo do MPLA (o único que o país teve desde 1975) praticou internamente, de que são exemplos os massacres de 27 de Maio de 1977 e a Batalha do Cuito Cuanavale, todo o cuidado é pouco.
A Bienal terá vários fóruns de reflexão onde serão discutidos vários temas, como “os desafios” que se colocam à juventude, propondo soluções relacionadas com criatividade, inovação e empreendedorismo, bem como “boas práticas” trazidas por outros países, revelou o mesmo responsável. Fica por saber que novidades o Governo vai tirar da cartola sobre, por exemplo, a promessa da criação de 500.000 novos empregos.
Os fóruns incidirão também sobre a resolução de conflitos, “que é o principal objectivo”, reforçou Aguinaldo Cristóvão, focando ainda o Fórum da Mulher, onde será abordado o papel da mulher na implementação de soluções, sendo necessário “criar condições para que as mulheres tenham melhores ferramentas para educar os seus filhos e famílias”.
Se calhar a criação basilar seria que as nossas crianças não fossem geradas com fome, nascessem com fome e morressem pouco depois com… fome. Talvez os nossos 20 milhões de pobres possam dar uma ajuda.
O secretário de Estado sublinhou ainda que vários dos conflitos que ocorrem no continente africano “radicam num problema de identidade cultural” e relacionam-se com o facto de “não olhar o outro encarando a diferença neste mesmo olhar”. É verdade. Veja-se o caso de Angola onde coabitam pacificamente os verdadeiramente angolanos (os que são do MPLA) e os outros…
“A Bienal assume que os desafios para o desenvolvimento dos países exigem que, cada vez mais, haja uma parceria sólida entre os próprios países. Estamos a falar da necessidade de haver um maior conhecimento entre os próprios países africanos, entre os próprios cidadãos e isso pode ser facilitado com eventos como a Bienal” que visa facilitar o relacionamento entre países e regiões, reforçou o responsável angolano.
“Nós não temos um corredor cultural que permita ligar o continente africano e neste momento, a Bienal de Luanda é o primeiro evento que está a criar esta parceria. É feita para os países e com os países”, prosseguiu Aguinaldo Cristóvão.
A Bienal de Luanda – Fórum Pan-Africano resultou de uma decisão dos chefes de Estado da União Africana “que acharam que havia necessidade de promover um mecanismo, a nível do continente africano” que se centrasse numa abordagem sobre a não-violência e a resolução de conflitos com base no diálogo, recordou.
O desafio “foi assumido pela UNESCO”, que formalizou em Dezembro de 2018 um acordo com o executivo angolano para a realização da Bienal em 2019 e 2021.
Aguinaldo Cristóvão admite que venha a realizar-se uma terceira edição, “dependendo da avaliação dos resultados” dos eventos anteriores.
O Governo angolano investiu 512 mil dólares (cerca de 463 mil euros) no projecto e Aguinaldo Cristóvão está confiante no retorno da iniciativa, enfatizando a promoção da cultura angolana (a do MPLA, como é timbre) e do próprio turismo, “elementos muito fortes” e “com uma grande margem de sustentabilidade”.
A oferta hoteleira na baixa de Luanda está praticamente ocupada a 100%, salientou. Se a essa percentagem se adicionar o número de semi-angolanos que, com raro sentido de oportunidade e já tarimbados no assunto, vão passar a pente fino os caixotes do lixo das principais unidades hoteleiras…
São esperados no evento 800 delegados provenientes de todo o mundo que vão juntar-se a outros mil participantes nacionais, directamente envolvidos na Bienal de Luanda, que vai decorrer no Memorial Agostinho Neto (aí está o reconhecimento da resolução de conflitos versus 27 de Maio), na Fortaleza de São Miguel (Museu Nacional de História Militar) e no Centro de Convenções de Talatona.
Foram convidados 14 países e Portugal vai ter um pavilhão próprio, contando com a presença do ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, na cerimónia de abertura oficial.
“A relação histórico-cultural que existe entre Angola e Portugal torna indispensável a presença de um e de outro nos eventos que cada um realiza”, afirmou Aguinaldo Cristóvão.
Além do pavilhão no Fórum das Culturas, Portugal terá uma exposição, promovida pela Fundação Calouste Gulbenkian, sobre o património histórico de origem portuguesa no mundo, que ficará patente a partir de quarta-feira no Museu Nacional de História Natural de Angola.
“Todos os dias, os diferentes países terão a possibilidade de apresentar as suas manifestações culturais”, adiantou o secretário de Estado da Cultura.
A Bienal tem como focos temáticos a juventude, paz e segurança, a criatividade, empreendedorismo e inovação, num festival de culturas, que inclui cinema, música, artes plásticas e visuais, teatro, dança, moda, design, banda desenhada, jogos vídeo, poesia, literatura, tradição oral e artesanato.
As presenças confirmadas para o evento são do presidente da União Africana, Abdel-fatah Al-Sisi; da directora geral da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), Audrey Azoulay; do Prémio Nobel da Paz 2018, o médico congolês Denis Mukwege, e do ex-jogador de futebol Didier Drogba.
Folha 8 com Lusa