As remessas dos emigrantes portugueses em Angola caíram 17,3%, para 26,5 milhões de euros em Julho, enquanto que as remessas dos angolanos a trabalhar em Portugal desceram 3,4%, para 830 mil euros. Culpado? Tudo indica que é o famoso “irritante”. Existe, aliás, uma galopante praga de “irritantes”…
De acordo com os dados divulgados hoje pelo Banco de Portugal, o dinheiro enviado pelos portugueses a trabalhar em Angola passou de 32,08 milhões de euros, em Julho de 2017, para 26,51 milhões de euros, o que influencia decisivamente o saldo entre Portugal e os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP).
Como é habitual, o Banco de Portugal não divulga os dados especificados por países africanos lusófonos, divulgando apenas o valor mensal para Angola e o agregado para os PALOP.
Olhando para a totalidades destes países lusófonos, as remessas dos emigrantes portugueses caíram 16,3%, passando de 32,85 milhões, em Julho do ano passado, para 27,49 milhões, em Julho deste ano.
Em sentido inverso, os africanos lusófonos a trabalhar em Portugal enviaram para os seus países de origem 3,19 milhões de euros em Julho deste ano, o que representa uma descida de 1,8% face aos 3,25 milhões de euros enviados em Julho de 2017.
No total, as remessas dos emigrantes portugueses caíram 7,7%, descendo de 364,7 milhões em Julho do ano passado, para 336,4 milhões em Julho deste ano.
Pelo contrário, as remessas dos estrangeiros a trabalhar em Portugal aumentaram 14,2%, subindo de 40,78 milhões para 46,58 milhões de euros entre Julho de 2017 e Julho deste ano.
Alguns “irritantes” cálculos
Angola já recuperou da recessão económica de 0,7%, em 2016, e vai crescer 1,9% em 2017 e 2,7% até 2019, de acordo com o relatório das Nações Unidas sobre a Situação Mundial e Perspectivas Económicas (WESP). Nada como ver para crer a validade de um relatório que, como outros, em breve será… revisto.
O relatório elaborado pelo departamento de Assuntos Económicos e Sociais da ONU, a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) e as cinco comissões regionais afirmava que o crescimento angolano será sustentado “no aumento da actividade industrial e na melhoria da oferta de energia”.
O crescimento angolano em 2017 era, ainda assim, bastante inferior à média entre 2009 e 2016, que registou um valor de 3,5%, e ainda mais abaixo de 2012 e 2013, anos em que a economia de um dos maiores produtores de petróleo da África subsaariana cresceu 8,5% e 5,0%, respectivamente.
Os peritos das Nações Unidas sustentavam que a inflação está a diminuir, “apesar de se manter alta, devido a pressões sobre a moeda externa e taxas de câmbio paralelas desvalorizadas”.
“A perspectiva de evolução para África permanece sujeita a vários riscos” internos e externos, nota o documento apresentado em Nova Iorque, nomeadamente na vertente financeira.
“Do ponto de vista externo, um aumento superior ao esperado nas taxas de juro globais ou um aumento nos juros dos títulos de dívida soberanos pode diminuir o acesso ao financiamento, que se tornou nos últimos anos uma fonte cada vez mais importante para o investimento nacional, e colocar em perigo a sustentabilidade da dívida”, lê-se no texto.
A descida dos ‘ratings’, das exportações ou uma inversão do crescimento dos preços das matérias-primas são alguns dos factores que podem fazer diminuir o Investimento Directo Estrangeiro e as remessas dos emigrantes, o que pode ameaçar o fôlego da retoma, notavam os analistas das Nações Unidas.
Internamente, concluíam, os maiores riscos para os países africanos, que deverão crescer 3,5% e 3,7% nos próximos dois anos, estão na ausência de políticas de ajustamento aos preços mais baixos das matérias-primas.
Esta falta de políticas, afirmavam, “pode pôr em causa a estabilidade macroeconómica e a tendência de crescimento em muitos países”, que enfrentam também a possível escalada de violência por causa de ameaças à segurança, “especialmente na região do Sahel e na Somália, e instabilidade política em vésperas de eleições no Egipto, Nigéria e África do Sul”.
Perspectivas não são certezas
De uma forma geral todas as análises apontam para uma recuperação económica na África Subsaariana, alavancada pelo desempenho do seus principais motores, a Nigéria e a África do Sul e, também, pelo crescimento continuado dos seus melhores actores, a Etiópia, a Costa do Marfim e, (mais recentemente), o Gana.
O crescimento será guiado por um aumento da produção de petróleo (de forma mais destacada no Gana, na República do Congo, na Nigéria e em Angola), pelo reforço do investimento em infra-estruturas na África Ocidental e Oriental, e pela melhoria das condições climatéricas que fazem pressagiar bons anos agrícolas.
O reforço da actividade económica, para além de uma melhoria moderada nos preços do petróleo e dos minerais, irá ajudar a diminuir o défice actual, mas a pressão sobre as moedas da África Subsaariana irá permanecer.
A segunda tendência emergente aponta para o facto de o sector do gás da África Ocidental se vir a tornar um grande centro de actividade em 2018, do Senegal até Angola, com o desenvolvimento de gasodutos, plataformas flutuantes de gás natural liquefeito (FLNG) e de grandes projectos de campos de gás.
Os governos dos países do Golfo da Guiné e de toda a África Ocidental intensificaram os seus esforços para assegurar o fornecimento de gás, de modo a impulsionar a criação doméstica de energia e assim diversificar as suas receitas para além do petróleo.
Desregular o mercado do gás e permitir preços do gás regidos pelo mercado será a chave para desbloquear o posterior investimento em infra-estruturas em toda a região.
Outra tendência sugere que a inovação em finanças e tecnologia em África irá acelerar em 2018, impelida por uma nova geração de africanos “nativos digitais”. A proliferação de “hubs” tecnológicos em África (de forma mais destacada na África do Sul, no Quénia, no Ruanda, na Nigéria, no Gana e na Costa do Marfim), irá alimentar a próxima onda de “startups” africanas e ajudá-las a entrar em contacto com investidores.
A inovação digital na África Subsaariana está a ser conduzida pela cada vez maior utilização de telemóveis, permitindo que os consumidores africanos ultrapassem modelos de negócios e tecnologias empresariais já existentes.
As empresas africanas das áreas das finanças e da tecnologia estão cada vez mais a conduzir esta inovação, apresentando ferramentas digitais para construírem perfis digitais para os até aqui ‘sem acesso aos bancos’, proporcionando electricidade a agregados familiares rurais que se encontravam até então fora da rede, usando até inteligência artificial para diagnosticar problemas de saúde de forma remota.
Folha 8 com Lusa