Funcionários dizem que na
Luanda Medical Center
há escravatura e racismo

O Folha 8 torna pública a carta aberta enviada à nossa Redacção pelos funcionários angolanos da clínica Luanda Medical Center (LMC), localizada no Largo Serpa Pinto, na Mutamba, Luanda, onde consta a exposição daquilo que designam de “uma escravatura moderna”.

O grito de socorro daqueles funcionários é, afirmam, contra actos de racismo, rescisão de contratos sem aviso prévio, ameaças, obrigação de trabalhar aos domingos e feriados, ilegalidade dos turnos nocturnos, discriminação remuneratória, não subida de salários, realização de cirurgias ilegais, fuga ao fisco, contratação de estrangeiros ilegais e com cadastro sujo em nos seus respectivos países.

Os trabalhadores, designadamente, recepcionistas, enfermeiros e outros, pedem a intervenção do Ministro do Trabalho e Segurança Social, da Inspecção Geral do Trabalho, e do Serviço de Migração e Estrangeiro (SME).

Leia a carta na íntegra:

«Nós, funcionários nacionais do Luanda Medical Center (LMC), vimos por meio desta pedir encarecidamente a todas as entidades que tomem o conhecimento sobre o abuso de poder, discriminação racial, ameaças de despedimento, opressão, incumprimento da Lei Geral do Trabalho, e fuga ao fisco.

Desde Janeiro de 2015, que o LMC funciona e nunca nos foi apresentado um regulamento interno, e quando cobrado a direcção afirma que já está pronto e que falta anexar. Estamos a caminho do 4º ano de funcionamento e nada nos foi apresentado até hoje. Por isso, todos querem mandar e chegamos a um ponto em que ninguém sabe quem é quem. As ordens são dadas da noite para o dia, sem aviso prévio e nada por escrito, cada um vem e dá a informação à sua maneira, e ainda acham que temos a obrigação de as cumprir.

Existe uma classe de funcionários nacionais que foram despedidos sem aviso prévio. A algumas foi-lhes dito que, para angolanas, estão a ganhar muito (nomeadamente duas técnicas de cardiologia, responsáveis pelas realizações de prova de esforço, MAPA e ECG), segundo o director dos Recursos Humanos, Renato Filipe, e de enfermagem, João Manuel Sousa, para assim colocarem alguém das suas conveniências.

O ex-director de Enfermagem ainda avisou a classe de enfermagem que o homem que o iria substituir seria pior que ele. Dito e certo, pois o novo director, João Manuel da Silva Sousa, está cá apenas pelos interesses da clínica, pelos seus interesses e das suas compatriotas, uma vez que ele reúne apenas com as mesmas. A pergunta é: Quem está a lutar pelos nossos interesses?

A instituição paga formação no exterior apenas para os expatriados e obriga os nacionais a dar formação aos recém-admitidos ou aos que foram mudados de sector. A pergunta que nunca calou: Como o Director de Enfermagem, uma vez que está na área administrativa, vai fazer a formação do Suporte Avançado de Vida na África do Sul, sendo que o mesmo não lida directamente com os pacientes e já não está na assistência? Será que nenhum angolano era digno de fazer a formação, uma vez que quando eles abandonarem as nossas terras, somos nós, os donos, quem ficamos e vamos precisar formar os demais, apesar de sermos tratados como estrangeiros no nosso próprio país?

O horário de funcionamento da clínica, de segunda a sexta-feira, é das 7:30 às 22 horas e muitas das vezes alguns funcionários saem às 23 horas, e aos sábados o horário é das 7:30 às 15 horas. Acerca de quase um ano, a direcção da instituição decidiu alargar o horário de sábado até às 18 horas, decisão esta de carácter obrigatório mas que seriamos recompensados com um valor acrescido a cada final do mês pelas horas extraordinárias trabalhadas e até hoje, nenhum funcionário angolano beneficiou desse acordo.

Gostaríamos que o Senhor Ministro do Trabalho e Segurança Social nos esclarecesse se é justo o novo Director de Recursos Humanos, Renato Filipe, zerar as nossas horas para começarmos tudo de novo a partir de Janeiro do ano corrente? As horas que nós trabalhamos a mais são pra ser esquecidas? Foram 10,5 horas trabalhadas durante vários meses e nunca nos foi compensado, nem com folga, tão pouco com valor monetário.

O mesmo Renato Filipe (recém chegado) chamou uma das médicas nacionais colaboradora para assinar a rescisão do contrato, sem aviso prévio, alegando que a instituição já não precisava dos seus serviços. A mesma que muito sabe sobre a lei confrontou-o, onde o Dr. do RH afirmou categoricamente que em Angola, para se demitir um funcionário não é necessário aviso prévio porque as leis aqui não funcionam. Um indivíduo arrogante, e com grandes complexos de superioridade, que mal chegou cá e já nos sai com essas? Quem ele pensa que é? O que ele sabe sobre Angola?

Mas vale dizer que a instituição comunicou-nos que a partir do dia 17 de Julho de 2017, passaríamos a fazer a refeição na instituição, mas que em momento algum fez a dita proposta: ou vos serão reajustados os salários, ou passarão a almoçar cá, paga pela mesma. Acreditamos que se tivéssemos o direito de escolha preferiríamos o reajuste. Mas que na verdade, uma coisa não tem nada a ver com outra. Essa refeição custou o reajuste salarial aos funcionários.

Racismo

Uma revelação engraçada é que quando comunicaram que brancos e pretos passariam a almoçar juntos, muitos dos brancos deixaram de frequentar o restaurante (O Patriarca), situado no último andar da clínica.

Salários não aumentam

Foi prometido em uma reunião com o CEO Michael Averbuckh, que a cada ano nos seria reajustado o salário. Já se passaram dois anos e nada, enquanto os preços das consultas aumentam da noite para o dia e com valores absurdos, e somente o salário dos angolanos é que não aumenta ou é reajustado.

Somos, nós angolanos, que fazemos todo e qualquer atendimento e procedimentos aos nossos clientes, enquanto os experientes que cá vieram para nos ensinar, ficam em seus gabinetes a fazerem fofoquinhas, arranjam intrigas, e no final das contas são sempre eles quem ganham os louros porque quando é para falar sobre os planos e projectos do LMC, nós, angolanos, somos sempre postos de lado.

A verdade é que hoje, o LMC é o que é graças a nós que demos o nosso melhor, fomos persistentes, determinados e os nossos clientes que não nos deixam mentir, mas agora, a insatisfação, frustração faz-nos ver que os nossos esforços foram em vão.

Cirurgias ilegais e turnos nocturnos

Uma vez que a instituição é um ambulatório, apenas deveriam ser feitas cirurgias de ambulatório (pequenas cirurgias) e todo e qualquer procedimento deveria ser feito de modo a dar alta ao paciente até no máximo 22 horas, que é a hora legal instituída pelo MAPTSS.

Uma instituição que não tem autorização e nem condições para turnos nocturnos, insiste em fazer cirurgias de grandes proporções e obriga os funcionários a pernoitarem, e depois seguirem o turno no dia seguinte sob a desculpa que o médico que opera não estará a pernoitar e a equipa de enfermagem é obrigada a fazer, mesmo não tendo autonomia para nada. Perguntamos: se o pior acontecer, quem será responsabilizado?

Tudo isto porque o CEO Michael Averbukh, que se diz ser médico mas que na maioria das vezes faz papel de advogado (quando existe conflito judicial com algum funcionário), durante uma reunião, ordenou que os médicos estão expressamente proibidos de rejeitar qualquer cirurgia, independentemente da complexidade da mesma, apesar de não existir condições, muito menos autorizações para tal.

Ameaçados e obrigados a trabalhar aos domingos e feriados

Acreditamos que qualquer alteração no funcionamento de uma instituição, os contratos também deverão ser alterados, já que assinou-se contratos de 44 horas semanais, e não nos foi implementada isenções de horas, nem subsídios de disponibilidade, mas nos foram acrescidos mais 2,5 horas num sábado por mês, e pelo não cumprimento do acordo, alguns funcionários reclamaram e acordaram que passariam a entrar às 10 horas para sair às 18 horas, cumprindo assim com as horas contratuais e prescritas na Lei Geral do Trabalho. Mas não se sentido satisfeitos, agora querem nos obrigar a trabalhar domingos e feriados.

Essa foi uma informação que tomamos conhecimento na terceira semana de Janeiro do ano em curso pela boca da equipa de coordenação, afirmando que a partir de Fevereiro, passaremos a trabalhar domingos e feriados, e que dia 5 do mesmo seria o primeiro dia e que quem não concordasse era só subir ir ter com o Renato Filipe para assinar a carta de demissão.

Discriminação remuneratória

Alguns funcionários reagiram na hora e o Renato deu a conhecer que os que reclamaram seriam levados em conta na próxima renovação do contrato. Nos nacionais, ficou acordado 20% do salário base no final do mês, nos expatriados o equivalente a 300 dólares ao câmbio oficial na mão por cada domingo que trabalharem. Ainda acham que com essa diferenciação e discriminação, têm o direito de nos ameaçar? Onde foi parar a igualdade de direitos? Exigimos direitos iguais. Se os expatriados ganham 300 dólares por cada domingo e feriado, nós também o queremos e merecemos. E se acham que eles merecem mais do que qualquer um de nós nacionais, que vai deixar de estar com a sua família em um dia de descanso que é dado por Lei, então que façam somente eles, já que acham que elas são as melhores.

Por que apenas reuniram com os médicos e funcionários estrangeiros e não com a classe de enfermagem, recepcionistas e farmacêuticas nacionais? Acham que não sabemos falar? Pensam que estão a trabalhar com que tipo de raça? Por que os expatriados vão ganhar por cada domingo e o dinheiro será entregue à mão, e nós angolanos a cada final do mês, como um bónus de 20%, independentemente de quantos domingos e feriados iremos fazer?

Avisamos que estamos cansados de ganhar misérias, de sermos desvalorizados, e que devem nos dar a mesma importância que dão aos demais funcionários.

Visto que muitos sabem sobre leis, ambos os directores de Enfermagem e RH, já disseram que agora não é obrigatório mas que daqui em diante será e por enquanto estão a pedir voluntários. Exigimos o documento legal que nos prove que foram ao MAPTSS e que a mesma autorizou o funcionamento aos domingos e feriados, e pernoitarmos, uma vez que devemos trabalhar 44 horas semanais, e que cumprimos de segunda à sábado. Esses portugueses ainda têm a mentalidade de que os angolanos devem ser explorados, por isso o LMC é uma escravatura moderna.

Fuga ao fisco, estrangeiros ilegais e com cadastros sujos

Nenhum funcionário expatriado paga o Índice de Rendimento de Trabalho (IRT) e muitos trabalham com visto de turismo, vistos de trabalho de outras entidades empregadoras, não estão inscritos nem na Ordem dos Médicos, nem na dos Enfermeiros. Médicos e enfermeiros que estão aqui há menos de um mês já têm número da ordem. É possível isso? Desafiamos a Inspecção do trabalho e o Serviço de Migração e Estrangeiro (SME) a virem fazer uma vistoria.

Será que quando uma empresa está para expatriar alguém não fazem nenhuma investigação sobre o percurso profissional dos funcionários a serem contratados? Porque vejamos, o actual director de enfermagem, João Manuel Sousa, conhecido por ser amante e consumidor excessivo de bebidas alcoólicas, já possui os hábitos etílicos desde a sua terra natal (Portugal), onde está agora expressamente proibido de exercer as suas funções por ter sido apanhado durante o horário de trabalho a conduzir o carro do ENEM completamente embriagado, onde nem se quer conseguia dizer o seu nome.

O antigo director do Bloco Operatório, também de nacionalidade portuguesa, após ter sido responsável pela morte de um paciente, enquanto chefiava o bloco operatório (ainda em Portugal) e cirurgião principal durante o procedimento, ficou afastado das suas funções por estar a responder criminalmente pela morte do paciente. Após o afastamento, o mesmo colocou o documento da aposentadoria e rumou para o LMC, onde exerce o cargo de direcção e a ganhar milhões.

A própria Inspecção Geral do Trabalho dificulta o trabalho e o desenvolvimento do país, quando ligam a avisar que vão passar (quando não deveriam) e na verdade nem se quer se fazem presentes e ainda assim surgem documentos assinados por eles, quando não se fizeram presentes.

Nenhum funcionário de nacionalidade angolana está assegurado. Fazem falsas promessas de que se precisarmos de cuidados, o Luanda Medical Center se responsabilizará, mas isso não condiz com a verdade, uma vez que vários funcionários já precisaram desses cuidados, alguns perderam a vida e outros foram abandonados.

Onde já se viu um director clínico, Ziv Maianski, de nacionalidade israelita, que é um indivíduo extremamente racista e não apresenta interesse nenhum em aprender a língua oficial do país onde trabalha, dando as consultas em inglês, obrigando assim os seus pacientes a perceberem o que ele diz, mesmo sem os mesmos terem noções básicas de inglês?

A Lei Geral de Trabalho de Angola diz que é obrigação do empregador fazer um seguro individual ou de grupo a todos os trabalhadores, aprendizes e estagiários, contra risco de acidentes de trabalho e doenças profissionais, salvaguardando as pequenas e micro empresas, mas o que tudo indica é que essa Lei foi feita apenas para os expatriados.

Expatriam funcionários, alegando que será para nos transmitir conhecimentos, mas a realidade é outra, não sabem patavina nenhuma, e ainda querem nos obrigar a fazer integração nas pessoas que futuramente serão nossos chefes. NUNCA! JAMAIS!

Rescisão de contratos sem aviso prévio

Na classe dos recepcionistas, os funcionários são rescindidos os contratos sem aviso prévio.

Houve uma retaliação de recepcionistas, onde a Direcção do LMC rescindiu os contratos por estarem grávidas. Uma única recepcionista voltou, mas com um novo contrato, primeiro por peso de consciência da Rita Matias, directora de Marketing e superior hierárquica dos recepcionistas, porque a mesma teve um parto prematuro, e segundo para não pagarem a licença de maternidade, o que é contra a Lei, independentemente de qualquer tipo de contrato.

Tem havido vários casos em que funcionários vão ao trabalho num dia normal e são surpreendidos com dizeres que já não fazem parte da família LMC, sendo consequentemente coagidos a assinar a rescisão. A pergunta é: Somos mesmo uma família?

Foram tantas promessas não cumpridas desde 2015, após alguns encontros para expormos as nossas insatisfações que pensamos que talvez a solução estaria em uma atitude radical.

Michael Averbuck, Renato Filipe, Rita Matias e João Sousa, é para lembrar que toda acção tem uma reacção.

Vale lembrar que nenhum estrangeiro está cá para defender os nossos interesses. É hora de nos unirmos para o bem comum de todos os angolanos.»

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