O MPLA, no poder em Angola desde 1975 e apostado em lá ficar por mais umas dezenas de anos, informou hoje que a campanha eleitoral do partido para as próximas eleições será inteiramente conduzida pelo vice-presidente e candidato a Presidente da República, bem como ministro da Defesa, João Lourenço.
Por Orlando Castro
A informação consta de um comunicado do Comité Central do MPLA, indicando que “a condução da acção externa da campanha eleitoral do MPLA vai ser feita sob o comando do vice-presidente do partido”, o também ministro da Defesa que, obviamente, conduzirá com toda a imparcialidade os cargos oficiais que ocupa.
Será difícil saber-se onde, em campanha, termina o ministro da Defesa e começa o dirigente partidário, e vice-versa. Mas, em Angola, isso é completamente irrelevante. Ou não fosse o actual presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Presidente da República (nunca nominalmente eleito) o mesmo cidadão, José Eduardo dos Santos, há 38 anos.
João Lourenço foi aprovado a 2 de Dezembro como cabeça-de-lista do partido às próximas eleições gerais em Angola previstas para Agosto, mas o anúncio oficial só teve lugar a 3 de Fevereiro, pela voz do presidente do MPLA e chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, que por sua vez não integra (calcula-se) qualquer lista candidata.
“O MPLA tem as condições criadas para continuar a mobilizar o povo angolano, de Cabinda ao Cunene, e para participar e assegurar a sua vitória convincente nesse pleito eleitoral e continuará a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para prosseguir com os esforços para a melhoria da situação económica e social do país”, afirma o partido, no mesmo comunicado.
Como é óbvio. É, aliás, previsível que o MPLA venha daqui a uns anos a ser o único partido no mundo que esteve 100 anos no poder. Já leva 41 e pela andar da carruagem não será problemático por lá ficar mais 59 anos.
O general João Lourenço afirmou a 3 de Fevereiro que a única prioridade que tem neste momento, enquanto candidato ao cargo de Presidente da República, é mesmo “vencer as eleições” deste ano. Quem diria, senhor general? É coisa inédita.
“Estou preparado para aceitar este desafio (…). Tudo farei para honrar a confiança que em mim foi depositada”, disse João Lourenço, também vice-presidente do MPLA, após a reunião do Comité Central, em Luanda, em que José Eduardo dos Santos, líder do partido, Titular do Poder Executivo e chefe de Estado desde 1979, oficializou a candidatura do seu ministro da Defesa como cabeça-de-lista às eleições gerais.
“A minha única prioridade neste momento é trabalhar para vencer as eleições e depois veremos”, disse, questionado pelos jornalistas. Veremos o quê, senhor general? Ah. Veremos que Angola é o MPLA e que o MPLA é Angola. Veremos que, afinal, o regime será o mesmo.
Na lista do MPLA candidata às eleições gerais previstas para Agosto (círculo nacional), submetida à aprovação do Comité Central, João Lourenço é cabeça-de-lista e candidato a Presidente da República e Bornito de Sousa, também general na reserva e ministro da Administração do Território (com total domínio da máquina eleitoral), é o número dois e candidato a vice-Presidente.
José Eduardo dos Santos, reeleito presidente do partido em 2016, completa em Agosto próximo 75 anos, tendo anunciado em Março do ano passado que pretendia abandonar a vida política em 2018. Embora abandonar a vida política não seja sinónimo de abandonar o poder (não é assim engenheira Isabel dos Santos?), todos fingem acreditar que significa a mesma coisa.
“Eu venho sendo preparado e venho-me preparando para esta função, de há algum tempo para cá, na medida em que o que aconteceu hoje foi apenas a confirmação de algo que internamente, a nível do partido, pelo menos a nível da direcção do partido, já era praticamente um dado adquirido”, disse João Lourenço aos jornalistas no dia 3, na sua primeira declaração como candidato e após vários meses de especulações.
De facto, João Lourenço “doutorou-se” nesta matéria num curso intensivo e de elite de “educação patriótica”, ministro em aulas individuais pelo mestre dos mestres, José Eduardo dos Santos.
Sobre a campanha eleitoral, João Lourenço afirmou que vai “jogar com as mesmas armas que os outros [candidatos] jogarem”, ao falar sobre a possibilidade de debates. Ora! Ora! Debates? E então a cobertura das acções de campanha por parte dos órgãos públicos? Bom. Isso ver-se-á depois das eleições… à boa maneira do regime.
“É um desafio grande, mas eu acredito que, embora difícil, não é impossível. Temos optimismo suficiente para pensar que vamos conseguir e quem vai conseguir não é o cidadão João Lourenço, o militante João Lourenço. Quem vai conseguir é o próprio MPLA, que é uma verdadeira máquina e eu sinto-me suficientemente respaldado para poder fazer frente a este desafio”, rematou.
Quem diria senhor candidato João Lourenço. Quem diria! O respaldo de que fala é de facto, todos o reconhecemos, uma máquina não do MPLA (ao menos não faça de nós matumbos) mas do Estado. E como o Estado tem tudo na mão (inclusive a máquina eleitoral), não é preciso grande esforço para vencer algo que já está vencido à partida.
José Eduardo dos Santos é Presidente de Angola desde Setembro de 1979, cargo que assumiu após a morte de Agostinho Neto, o primeiro Presidente angolano.
A Constituição angolana aprovada em 2010 prevê a realização de eleições gerais a cada cinco anos, elegendo 130 deputados pelo círculo nacional e mais cinco deputados pelos círculos eleitorais de cada uma das 18 províncias do país (total de 90).
O cabeça-de-lista pelo círculo nacional do partido ou coligação de partidos mais votado é automaticamente eleito Presidente da República e chefe do Executivo, conforme define a Constituição, moldes em que já decorreram as eleições de 2012.