O Presidente da República portuguesa (nominalmente eleito), ao contrário do primeiro-ministro António Costa, vai estar cá na próxima semana para assistir à tomada de posse do novo Presidente da República de Angola, João Lourenço, marcada para terça-feira, dia 26. Recorde-se que, mesmo antes de haver resultados definitivos, já Marcelo Rebelo de Sousa se apressava a felicitar o MPLA. Os amigos são mesmo para isso.
E que Marcelo Rebelo de Sousa é mais amigo do MPLA do que dos angolanos, que é mais amigo dos que estão no poder, mesmo sendo ditadores, que é mais amigo de quem dirige um país que é dos mais corruptos do mundo, que tem 20 milhões de pobres, que é líder mundial da mortalidade infantil, disso ninguém de bom senso tem dúvidas.
A Direcção da UNITA afirmou na altura que recebeu, “escandalizada”, com “estupefacção” e “desilusão”, a declaração do chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, felicitando o candidato do MPLA pela vitória nas eleições gerais mesmo antes da revelação dos resultados finais. O activista Nuno Dala arrasou a hipocrisia servil e bajuladora do presidente português e João Paulo Batalha sentiu-se envergonhado.
Na altura em que Marcelo Rebelo de Sousa se ajoelhou, a UNITA reafirmava que o presidente português felicitou um candidato não eleito.
De facto, no dia 26 de Agosto o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, felicitou João Lourenço (MPLA), numa mensagem publicada na página da Presidência na Internet. Nas felicitações (provavelmente escritas mesmo antes das eleições e que apenas aguardavam um clique para estarem on-line) ao “Presidente eleito da República de Angola”, o chefe de Estado português sublinhou os laços fraternais que unem os dois países e os dois povos.
Nesse mesmo dia o líder e cabeça-de-lista da UNITA às eleições gerais, Isaías Samakuva, numa declaração ao país feita em Luanda, foi peremptório: “O país ainda não tem resultados eleitorais válidos. O país ainda não tem um Presidente eleito nos termos da lei”.
A UNITA disse que, conhecendo a “sensibilidade acrescida aos fenómenos sociais e aos valores da democracia” com que o Presidente da Republica Portuguesa “tem vindo a interpretar o seu mandato”, “mais escandalizados ficamos com o seu posicionamento de reconhecimento de um Presidente, numa altura em que ainda se está a proceder ao escrutínio dos votos”.
Acrescentou a UNITA que Marcelo Rebelo de Sousa “tem ao seu dispor todos os mecanismos que lhe permitem saber de toda a realidade que envolve o processo eleitoral angolano”, pelo que não entendeu a “forma precipitada e desavisada como o Presidente da República Portuguesa felicita um suposto Presidente Eleito de Angola”.
Entretanto, numa carta aberta dirigida a Marcelo Rebelo de Sousa, Nuno Álvaro Dala arrasava o comportamento do Presidente português, justificando a sua reacção com a “incompreensível mensagem congratulatória dirigida ao senhor João Manuel Gonçalves Lourenço, na qual lhe concede os parabéns por ter sido eleito Presidente da República de Angola.”
Nesse mesmo dia, Nuno Dala relembrava que a “Comissão Nacional Eleitoral da República de Angola (CNE) ainda não declarou vencedor a nenhum dos candidatos e os respectivos partidos pelos quais concorreram às eleições de 23 de Agosto do ano em curso”, explicando ainda a Marcelo Rebelo de Sousa que, “à cautela, o partido UNITA e a coligação CASA-CE montaram e puseram a funcionar seus próprios centros de escrutínio paralelos, sendo que a UNITA conseguiu provar – mediante apresentação de actas operacionais e actas-sínteses – que, na verdade, a maioria qualificada (primeiro anunciada como sendo de 64%, a 24 de Agosto, e agora de 61%, como anunciada a 25 de Agosto) às pressas pelo MPLA não passa de ficção mirabolante”.
“O facto de existirem centros de escrutínio paralelos é seguramente estranho a países como Portugal, que Sua Excelência Preside, pois são Estados Democráticos de Direito, onde os processos eleitorais são credíveis, porque as respectivas instituições de administração eleitoral são sérias e fortes. Se assim não fosse, as vitórias eleitorais de Sua Excelência, do Presidente dos Estados Unidos (Donald Trump) e do Presidente da França (Emmanuel Mácron), respectivamente, teriam sido conseguidas com recurso à fraude”, escreve Nuno Dala, acrescentando que, “em Angola, os processos eleitorais não são credíveis. Daí a criação e funcionamento de centros de escrutínio paralelos, graças aos quais os partidos na oposição têm conseguido refutar a falsa estatística apresentada pela CNE, uma instituição que não tem poder real, não passando de instrumento de implementação da engenharia da fraude”.
“Como poder ver, a Sua declaração de felicitações ao candidato do MPLA é um grave erro político, que põe seriamente em causa a Sua idoneidade tanto de académico e especialista em Direito (um dos mais reputados em Portugal) como de político arguto e expediente”, afirma Nuno Dala, relembrando a Marcelo Rebelo de Sousa que a “sua mensagem de felicitações ao candidato do MPLA, um partido perverso que transformou Angola numa altamente risível anedota civilizacional, configura um desastre de comunicação política”.
Depois de recordar o tempo e as razões fabricadas que levaram o regime a prendê-lo (Processo 15+2) e de agradecer “as incontáveis manifestações de solidariedade do Povo Português, que muito se bateu pela nossa libertação”, Nuno dala escreveu:
“Constituiu para mim uma aziaga surpresa o facto de Sua Excelência ter felicitado não apenas um falso vencedor como, também, de ter legitimado a fraude que o regime do MPLA está a forjar, o mesmo regime cujas figuras fizeram de Portugal uma gigantesca lavandaria de dinheiro. Sim, milhões e milhões de euros depredados do erário público de Angola, cujo Povo vive numa revoltante e inenarrável miséria.”
A terminar, Nuno Dala salientava que “a Sua mensagem de felicitações ao sucessor do ditador José Eduardo dos Santos envergonha todos os Angolanos e Portugueses que são pessoas de bem. A Sua mensagem de felicitações ao candidato do partido-gângster faz de Sua Excelência um cúmplice do regime perverso e nojento do MPLA, tal como o são os analistas amorais locais, que se apresentam como académicos, mas que não passam de mercenários, aos quais tem sido atribuído tempo e espaço nos órgãos de comunicação social públicos e seus apêndices para defenderem o regime de José Eduardo dos Santos, recorrendo a elucubrações baratas de advogados desalmados”.
Como escreveu aqui no Folha 8 João Paulo Batalha, “o corolário desta criadagem sabuja é a nota de duas linhas (envergonhada mas diligente) publicada pelo Presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, congratulando João Lourenço por uma vitória que, roubo à parte, nem sequer foi ainda formalmente anunciada. A minha vergonha como cidadão português não pode hoje comparar-se ao justificado orgulho cívico do povo angolano.”