Num debate recente na TV Zimbo, o reverendo Antunes Huambo propôs a candidatura de José Eduardo dos Santos ao Prémio Nobel da Paz. Dias depois, o governador de Luanda, general Higino Carneiro, nomeou-o para o cargo de administrador do Distrito Urbano da Cidade Universitária.
Por Moiani Matondo (*)
Em Dezembro passado, da boca desta figura saiu a declaração pública segundo a qual o vermelho da bandeira do MPLA simboliza “o sangue de Jesus Cristo” e “o MPLA é o partido abençoado por Deus para governar Angola”.
Antunes Huambo é cristão evangélico, intitula-se reverendo de uma Igreja denominada ICCA-Igreja de Coligação Cristã de Angola. Numa entrevista dada à Rádio Despertar que o Maka Angola conserva nos seus arquivos, esse dirigente do MPLA afirmou que era um antigo membro da Igreja da Assembleia de Deus Pentecostal.
Nessa mesma entrevista, explicou que foi escolhido para controlar mais de 900 igrejas ilegais em Angola e que a sua missão só terminará quando congregar mais de mil denominações religiosas ilícitas no seio do ICCA, para melhor servir o MPLA. E revelou também que a sua acção se inscreve no despacho do presidente da república, “exarado no dia 9 de Setembro de 2009 e que cria uma comissão interministerial para o estudo e tratamento do fenómeno religioso”.
Nessa altura, Antunes Huambo era responsável pela mobilização dos líderes religiosos e respectivos crentes, na sua qualidade de membro fundador do Gabinete de Cidadania e Sociedade Civil do Comité Central do MPLA. Na sua ânsia de controlar a mentalidade do povo, quando já não tem promessas para fazer muito menos para cumprir, o MPLA abdica agora do seu estatuto de ex-comunista, marxista-leninista e predador dos recursos e cofres do Estado, para assumir o estatuto “divino”. Segundo esta visão, o sofrimento do povo angolano na terra será recompensado pelo MPLA no seu “paraíso” criado pela imaginação propagandística de Antunes Huambo: o sacerdote do MPLA.
Na entrevista, Antunes Huambo diz-se proveniente do Kuando-Kubango e pertencente a uma linhagem real que ficou famosa por cortar a cabeça aos portugueses. Um aristocrata do sudeste do país. Temos, então, um rei-sacerdote que nos vai iluminar o caminho para a verdade e, quem sabe, cortar a cabeça a quem discorde dele…
Mas qual é a verdade de Antunes?
A pregação de Antunes consiste em dizer que Deus é o MPLA, o MPLA é Deus, e por isso todos lhe devem obediência. Donde, há que votar no MPLA em todas as eleições. O pregador afirma-se simultaneamente filho de Deus e militante de “fibra grossa” do partido-líder MPLA.
A sua teologia também é simples: Deus gosta dos fortes. Ser forte garante-nos a protecção divina; portanto, o povo tem de estar com os fortes e votar neles. Em Angola, o forte é o MPLA; portanto, o povo tem de votar no MPLA, e não perder tempo com os fracos, como a UNITA ou a CASA-CE.
Depois, de burocrata partidário, Antunes converte-se em líder religioso, mas sempre com a mesma mensagem: Deus e o MPLA estão juntos. E partilha o seu ensinamento teológico de forma incisiva: “Não nos juntamos ao MPLA por acaso. Temos orientação bíblica, sustentabilidade bíblico-teológica. Qual é? O homem na terra, nenhum poder pode ter se do alto não lhe for concedido. Quem quer combater aquilo que Deus abençoou está a perder tempo. Sabe qual é o exemplo? São os votos. Alguns angolanos, na hora do voto estão a votar noutros partidos. Partidos que nem conseguiram um deputado no parlamento. Aquilo é como cometer um pecado sem lucro. Estou a brincar, todos os pecados não têm lucro.”
Daí que a sua mensagem evangélica seja simples: “Primeiro, o princípio bíblico teológico de Salmos 133. ‘Quão bom, quão suave que os irmãos vivem em união’, e o segundo é um gesto de obediência ao despacho presidencial de Sua Excelência, O Presidente da República, que foi exarado no dia 9 de Setembro de 2009.”
Resumindo, pretende-se garantir a união e obediência ao MPLA das várias igrejas e seitas evangélicas que proliferam anarquicamente por Angola. E Antunes é o comissário político do MPLA para as seitas evangélicas.
Este sobrinho-neto do rei do Menongue é hoje o responsável por garantir que as igrejas evangélicas — que nascem como cogumelos e já mereceram a atenção e reparo públicos do ministro do Interior, Ângelo Tavares — sejam controladas e manipuladas a favor do MPLA.
Quando afirma “os teimosos [têm de aceitar] a ideia de se constituir o princípio da unidade na diversidade”, o que o sacerdote do MPLA pretende é dizer, adorem Deus e os Santos como quiserem, desde que tenham um só partido, o MPLA.
Sem medo das palavras, explica o reverendo Antunes: “Na ICCA não há nenhum pastor ou reverendo que é da UNITA, da FNLA ou da CASA-CE. Não tem. Todos têm cartão de militante do MPLA porque o MPLA enquanto for o partido que orienta o governo, nós seremos agentes de mobilização de todos os líderes religiosos para colaborarmos com este partido que orienta o governo. Para quê, para que possamos aconselhá-lo nas melhores formas de dirigir as políticas públicas do nosso povo.”
Sempre que lhe pedem provas das acusações que profere contra os “inimigos do povo e da igreja”, responde “Tenho e não tenho…”
É este o homem que Higino Carneiro nomeou no município de Talatona para o cargo de administrador do Distrito Urbano da Cidade Universitária.
Sem comentários.
(*) Maka Angola
Título e imagem: Folha 8