Corruptos unidos jamais (dizem eles) serão vencidos

O diário espanhol El Mundo faz – como já aqui foi noticiado – hoje manchete com o caso de um fugitivo português, Guilherme Taveira Pinto, à justiça espanhola, procurado pela Interpol, acusado de um desfalque de dezenas de milhões de euros, e que o jornal descobriu em Luanda, protegido pelas autoridades angolanas.

Guilherme Taveira Pinto terá intermediado a venda de armas de Espanha a Angola, num valor de 153 milhões de euros. Mas 100 milhões desapareceram e ao destino só chegou metade da mercadoria.

Recorde-se que a Polícia espanhola revelou no final do ano passado que – sobre o mesmo assunto – o comandante da Polícia angolana, Ambrósio de Lemos, teve visita paga a Madrid e poderá ter recebido três milhões de dólares de “luvas”. Armando da Cruz Neto também estaria envolvido.

Em 2008, duas empresas espanholas, a Defex e a Comercial Cueto 92, formaram o que na legislação comercial espanhola é conhecido como uma “Union Temporal de Empresas” (UTE), que nesse mesmo ano firmou um contrato com Angola para o fornecimento de equipamento policial no valor inflacionado de cerca de 153 milhões de euros.

Pouco mais de 41 milhões foram transferidos para um banco do Luxemburgo sem razão comercial ou actividade comercial justificativa e foi isso que despoletou a investigação que levou à prisão várias personalidades espanholas.

Os acusados pela justiça espanhola terão falsificado facturas e outros documentos para tentar “lavar” os fundos.

As autoridades espanholas disseram inicialmente que como beneficiários desses fundos figuram os acusados espanhóis e o que chamaram de “familiares de funcionários públicos da República de Angola”.

Em tribunal, foi dito que uma das pessoas que terá alegadamente recebido fundos desse negócio é o general Armando da Cruz Neto, que foi Embaixador de Angola em Espanha, entre 2003 e 2008, e mais tarde governador de Benguela.

Depois, a Unidade Central Operacional da Guarda Civil espanhola diz que aquelas duas empresas cobriram as despesas médicas e de alojamento em Madrid de Ambrósio de Lemos, comissário da Polícia Nacional angolana, da sua esposa Ana Freire e de um parente não identificado.

Citada pela imprensa espanhola, a guarda civil afirmou que esses gastos foram pagos com fundos que haviam sido desviados, pois embora o contrato de venda fosse de cerca de 153 milhões de euros, o material valia apenas 50 milhões.

Segundo a imprensa espanhola, as autoridades policiais do país dizem que Ambrósio de Lemos embolsou três milhões de euros por esse contrato e a sua esposa recebeu 15 mil euros.

As autoridades do Luxemburgo, que detectaram as transferências de milhões de euros despoletando o escândalo, disseram que houve uma transferência de três milhões de euros para uma companhia denominada Abangol.

Mas o caso complica-se porque anteriormente notícias na imprensa espanhola indicavam que a Abangol era provavelmente um empresa fictícia e que estava ligada ao general Armando da Cruz Neto.

Por outro lado, a polícia espanhola diz que como parte da operação de aliciamento de entidades angolanas, as companhias envolvidas gastaram um milhão e meio de Euros em cabazes de natal para diversas entidades angolanas.

As companhias alegaram que se tratava apenas de mera atenção protocolar.

O então ministro do Interior espanhol, Jorge Fernandez Diaz, recusou-se a responder a perguntas de deputados da Esquerda Unida sobre o caso, porque os dados tributários da companhia (Defex) estão protegidos pela lei e que as investigações à alegada corrupção estão sob sigilo da justiça.

Sabe-se, no entanto, que as autoridades judiciais decidiram alargar as investigações que resultaram na prisão de várias personalidades ligadas à companhia e ainda de uma advogada, Beatriz Garcia, que a partir do Luxemburgo criou alegadamente companhias e abriu contas em diversas partes do mundo para receber os fundos desviados.

A acusação afirma que os detidos “se concertaram com funcionários angolanos para através do contrato de entrega de material à polícia levar a cabo uma apropriação patrimonial ocultada desviada para o estrangeiro mediante um complexo esquema de sociedades em paraísos fiscais”.

O que o F8 escreveu em Julho de 2014

A Polícia diz que ainda não foi informada sobre as prisões efectuadas em Espanha de várias pessoas que estão envolvidas numa fraude de dezenas de milhões de dólares na venda de equipamento à Policia angolana e que envolve altos funcionários do nosso país. Em causa está uma fraude relacionada com um contrato de mais de 200 milhões de dólares e que tem no cerne do negócio a advogada Beatriz García Paes, com escritório no Luxemburgo, e que terá assessorado a rede de empresas envolvidas na fraude, entre as quais a semi-pública espanhola Defex.

Enquanto isso, em Espanha, um tribunal negou fiança à advogada que alegadamente estabeleceu a rede de lavagem dos fundos desviados de entre outros a favor de familiares de personalidades ligadas ao regime angolano.

O comandante da Polícia Nacional, Ambrósio de Lemos, confirmou que a Polícia angolana tinha comprado material a companhias espanholas, mas acrescentou que até este momento a Espanha não deu qualquer informação a Angola sobre as investigações.

“Temos que aguardar que nos venham dizer alguma coisa”, disse Ambrósio de Lemos em declarações transmitidas pela Radio Nacional de Angola.

Em Espanha, um juiz negou entretanto fiança à advogada Beatriz García Paes que, segundo as alegações da Polícia, foi quem no Luxemburgo estabeleceu a rede de lavagem dos fundos desviados ao erário angolano.

Novos dados divulgados em tribunal durante a comparência de Beatriz Garcia revelam que a advogada estabeleceu empresas radicadas no Luxemburgo e Ilhas Virgens britânicos, de onde se efectuavam as transferências para contas bancárias em nomes de familiares de funcionários públicos angolanos.

Segundo os dados divulgados em tribunal, o acordo com Angola foi assinado em 2008 e previa a entrega ao país de veículos, uniformes, equipamento de comunicações e outro material não especificado à Polícia angolana.

As empresas espanholas teriam lucros à partida de entre 200 e 300 por cento, algo que o juiz descreveu de “condições absolutamente desfavoráveis” para Angola.

Na audiência, o juiz fez notar que o Governo angolano pagou 206 milhões de dólares e, nas suas palavras, “não se pode afirmar que o contrato tenha sido cumprido”. Também em tribunal foi dito que parte do material nunca foi entregue.

Para além disso, dos 206 milhões de dólares apenas 47 milhões foram entregues às empresas, já que os restantes 159 teriam sido desviados a favor dos acusados e dos familiares de funcionários angolanos do mais alto escalão, cujas identidades ainda não foram reveladas. Um total de 10 pessoas foram presas após buscas policiais em Espanha, Luxemburgo e Portugal. Tendo sido recusada fiança a cinco, entre os quais figura o ex-presidente da Defex, José Ignacio Encinas Charro, empresa envolvida no negócio. A Defex é uma empresa semi-privada, participada em 51 por cento pela Sociedad Estatal de Participaciones Industriales (SEPI).

A SEPI esclareceu, entretanto, que deu toda a colaboração às autoridades que investigam a “Operação Angola”, dizendo acreditar que a Defex teve uma actuação ajustada e no estrito respeito pela legalidade.

A Defex é uma empresa criada nos anos 80 pelo Ministério da Defesa de Espanha para vender armamento a outros países, tendo apenas cerca de 20 funcionários. Agora sofreu um rude golpe com a detenção do seu ex-presidente, José Ignacio Encinas Charro; do director comercial Manuel Iglesias-Sarria e do ex-director Angel María Larumbe. Os três são acusados de desviar em proveito próprio cerca de 41 milhões de euros do referido contrato de 152 milhões com Angola.

De acordo com a matéria de facto apresentada pela investigação, na trama da corrupção participou a sobrinha de Francisco Paesa, que foi um famoso espião ao serviço do Ministério espanhol do Interior que ajudou a fugir e de seguida avisou as autoridades o ex-director geral da Guardia Civil, Luis Roldán.

A referida sobrinha, Beatriz García Paesa, facilitou – diz a acusação – a partir do Luxemburgo o branqueamento do dinheiro a favor dos directores da Defex e dos altos quadros angolanos.

Os depósitos teriam sido feitos em contas bancárias em Hong Kong, Suíça, Singapura, Ilhas Caimão, Nova Zelândia, Gibraltar, Madeira e Luxemburgo.

A chamada “Operação Angora” foi desencadeada depois das autoridades luxemburguesa terem suspeitado do depósito de 56 milhões de dólares numa conta no Luxemburgo.

Recorde-se, entretanto, que em Junho de 2011, um grupo de empresários portugueses foi investigado por ter feito vendas fictícias para o nosso país, entre as quais figuravam até… limpa-neves. Foi uma alegada burla gigantesca ao Estado angolano, supostamente cometida por empresários portugueses com ligações a elementos do Banco Nacional de Angola.

Segundo se noticiou na altura, em causa estavam mais de 300 milhões de euros em pagamentos do BNA para produtos que nunca chegaram ao nosso país.

A maioria dos pagamentos saiu de uma conta do Estado angolano no Banco Espírito Santo de Londres. O alarme soou quando o banco comunicou que a conta estava quase a zero.

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