Os advogado que defendem os 15 activistas angolanos em prisão preventiva desde Junho, acusados de – entre outros hipotéticos crimes – preparem uma rebelião e um golpe de Estado, interpuseram um recurso para o Tribunal Constitucional, contestando a recusa do Supremo ao pedido de ‘habeas corpus’ para a libertação.
O s advogados sabem à partida qual é o resultado do recurso. Pretendem apenas mostrar, mais uma vez, o grau de independência e de desrespeito pela lei que é praticado pelas instâncias judiciais do país.
A informação foi avançada hoje à Lusa pelo advogado Luís Nascimento, apontando “atitude negligente” do Tribunal Supremo na apreciação deste tipo de recurso. Os juízes daquele tribunal, segundo acórdão conhecido no sábado, concluíram que os prazos de detenção dos arguidos, contrariamente ao que apontava a defesa, não foram excedidos em Setembro, pelo que vão continuar em prisão.
“O que aconteceu não foi bem isso. Eles próprios [tribunal] dizem que o Ministério Público promoveu a acusação dentro do prazo, ao 88º dia [o primeiro limite é de 90 dias de prisão preventiva, podendo ser prorrogado por mais 35 dias]. Então não precisavam mais de prorrogar prazos porque já não havia nenhuma diligência a fazer”, observou Luís Nascimento.
Em causa está um processo em que 17 jovens angolanos são acusados, em co-autoria, de actos preparatórios para uma rebelião e um atentado contra o Presidente da República angolano, tipificados na lei dos crimes contra a segurança do Estado com uma pena até três anos de cadeia.
Também admite a possibilidade de, à semelhança do que acontece com outras duas jovens arguidas no processo, os suspeitos aguardarem em liberdade a decisão de julgamento – que entretanto arrancou a 16 de Novembro em Luanda -, pretensão invocada pelos advogados de defesa no pedido de ‘habeas corpus’ que deu entrada no Tribunal de Supremo a 30 de Setembro alegando excesso de prisão preventiva (além de 90 dias previstos).
O recurso da decisão negando a pretensão deste ‘habeas corpus’ deu entrada terça-feira no Supremo, que agora tem cinco dias para decidir o envio para o Tribunal Constitucional.
No acórdão divulgado no sábado, com data de 5 de Novembro e notificado à defesa pelo tribunal ao fim de 15 dias, os três juízes da Câmara Criminal (Supremo) acordam em negar provimento ao pedido de libertação “na actual fase do processo”, por “se afigurar legal a detenção dos requerentes”.
Recordam, sobre a mesma lei, que prevê (artigo 10.º) que “será inconveniente a liberdade provisória” quando “em razão da natureza e circunstâncias do crime ou da personalidade do delinquente haja receio fundado de perturbação da ordem pública ou da continuação de actividades criminosas”.
Os juízes sublinham ainda que aquela lei prevê um período inicial de 90 dias para prisão preventiva na fase de instrução preparatória (antes do julgamento), mas “prorrogáveis por mais 35 dias”.
“Estando eles [arguidos] privados de liberdade por um período de 101 dias [à data], isto é, não atingindo o máximo de 125 dias”, lê-se no acórdão.
“Decorre daí não se ter registado o excesso de prisão preventiva em instrução preparatória e a consequente prisão ilegal alegada pelos requerentes”, acrescentam.
Referem que na fase de julgamento – que está a decorrer – a prisão preventiva está condicionada a um ano, “não sendo aqui o caso”.
Este é já o segundo pedido de ‘habeas corpus’ apresentado pela defesa dos 15 jovens em prisão preventiva, o primeiro dos quais também foi negado pelo Tribunal Supremo e que aguarda decisão do recurso interposto para o Tribunal Constitucional.
É evidente, como todos sabemos, que se os jovens detidos estivessem em liberdade iriam continuar a sua actividade criminosa. Por alguma razão o despacho da ala radical do MPLA, eufemisticamente apelidada de Ministério Público, afirma que os activistas foram detidos – nem mais, nem menos – “em flagrante delito” quando se preparavam para uma actividade criminosa, cuja etílica matéria de facto recolhida pelos peritos revela “actos preparatórios para a prática de rebelião e atentado contra o Presidente da República”.
Abona a favor da decisão o facto de, nesse flagrante delito, ter sido descoberto em poder dos jovens diverso material bélico, altamente letal, a saber: 12 esferográficas BIC (azuis), um lápis de carvão (vermelho), três blocos de papel (brancos) e um livro sobre como derrubar as ditaduras.
Sabe-se, igualmente, que a Polícia Nacional do regime descobriu que os jovens activistas tinham mísseis escondidos nas lapiseiras, Kalashnikovs camufladas nos telemóveis e outro armamento pesado e letal disfarçado nos blocos de apontamentos. São, reconheça-se, provas mais do que suficientes para provar que estavam a preparar um golpe de Estado.
Os jovens estavam no seu quartel-general numa reunião dos seus estrategas militares que planeavam o golpe a partir da leitura do livro “Da ditadura à democracia — Uma estrutura conceptual para a libertação”, do norte-americano Gene Sharp.
No quintal, debaixo de uma mangueira, o exército mobilizado por esses jovens (talvez uns milhões de guerrilheiros – o Ministério Público é omisso nesta contagem) afinava os códigos para lançamento dos mísseis e, talvez, até de ogivas nucleares contra a residência de Eduardo dos Santos…
Perante este manancial de provas, o Ministério Público do regime provou que os jovens activistas estavam envolvidos numa conspiração para a “destituição do Presidente da República e de outros órgãos de soberania”, plano que estava a ser congeminado há muito, muito tempo. Cerca de três meses.
Recorde-se que os procuradores do regime entendem, baseados nos dados recolhidos, que as sessões de formação realizadas na livraria Kiazele, na Vila Alice, em Luanda, visavam “mobilizar as massas populares ideais para desacreditar a governação do executivo angolano”. Coisa inexequível dada a credibilidade de que goza, há 40 anos, o regime, e há 36 anos o Presidente Eduardo dos Santos.