Se é normal, embora hipócrita, que as democracias se entendam bem com as ditaduras que lhes interessam, mais normal é o entendimento entre ditaduras. Não admira, por isso, que Kim Jong-un, Teodoro Obiang ou Robert Mugabe sejam íntimos de José Eduardo dos Santos.
Por Orlando Castro
É bom que os angolanos (a comunidade internacional passou uma esponja no assunto) saibam que a ditadura de Pyongyang tem relações históricas com a sua congénere de Luanda.
Para além dos laços históricos, nascidos na década de 70 com o apoio militar norte-coreano às FAPLA, é certo que Angola só tem a ganhar com o reforço da cooperação com Pyongyang.
Então em matéria de democracia e direitos humanos, a Coreia do Norte parece continuar a ser (tal como a Guiné-Equatorial e o Zimbabué) uma lapidar referência para o regime de Eduardo dos Santos.
Aliás, não é difícil constatar que a noção de democracia de Eduardo dos Santos se assemelha muito mais à vigente na Coreia do Norte do que à de qualquer outro país. E é natural. É que para além de uma longa convivência “democrática” entre ditadores, Luanda ainda tem de pagar a dívida, e os juros, da ajuda que Pyonyang deu ao MPLA. Amigos, amigos, contas à parte.
No que tange a direitos humanos, os princípios são os mesmos embora – reconheça-se – Luanda tenha sido obrigada a alargar – só para o mundo ver – o corda que estrangula os angolanos.
De qualquer modo continuam os milhões que têm pouco, ou nada, a trabalhar para os poucos que têm milhões. É assim em todas as ditaduras.
É claro que o Governo do MPLA, no poder desde 1975, escuda-se nas relações Estado a Estado para estar de bem com Deus e com o Diabo. E faz bem. Segue, aliás, a regra praticada por Portugal em relação a Angola.
Lisboa nunca se importou com a ditadura, como nunca se importou com a sorte dos angolanos. Aliás, Eduardo dos Santos foi elogiado por Cavaco Silva, José Sócrates e Passos Coelho. Fica claro que a Portugal interessa tudo… menos os angolanos.
A regra é simples. Porque carga de chuva tenho de estar preocupado com os muitos angolanos que nem uma refeição têm por dia, se eu tenho pelo menos três? Não é sr. presidente Aníbal Cavaco Silva? Não é sr. primeiro-ministro Pedro Passos Coelho?
Eduardo dos Santos pensa o mesmo. Kim Jong-un, Teodoro Obianga e Robert Mugabe também. Mas não são só eles, acrescente-se. São também os dirigentes das democracias ocidentais, da ONU, da CPLP etc. Para eles pouco importa que em Darfur tenham morrido em dois anos mais de 300 mil pessoas, ou que em Angola a grande maioria da população (perto de 70%) seja tratada abaixo de cão.
Sendo que já poucos cães existem em Angola. Foram quase todos comidos… pelos esfomeados angolanos.
O ano passado Victoria Clark e Melissa Scott reuniram gostos, preferências e hábitos alimentares dos ditadores do século XX num livro intitulado “Dictators’ Dinners: A Bad Taste Guide to Entertaining Tyrants”, que traduzido à letra significa “Os jantares dos ditadores: Um guia de mau gosto para entreter tiranos”.
Sob o lema “somos o que comemos”, as autoras acrescentaram que “como comemos” e “com quem comemos” também definem uma pessoa. Por isso, as autoras decidiram colocar vários ditadores sobre escrutínio alimentar.
O Chefe de Governo português, António de Oliveira Salazar, adorava sardinhas. O prato tipicamente português relembrava-o da infância pobre e do facto de, em criança, ter de partilhar uma única sardinha com o irmão.
Kim Il-sung, líder da Coreia do Norte, seleccionava os seus grãos de arroz individualmente e criou um instituto cujo único propósito era investigar formas de prolongar a vida.
Nicolae Ceausescu, o líder comunista da Roménia, tinha o hábito de levar comida quando visitava os outros líderes, algo que os irritava. Em casa, Ceausescu adorava comer guisado feito com um frango inteiro, incluindo as patas e o bico.
Josip Broz Tito ficou chocado com a insistência de Nicolae em beber um batido de vegetais com uma palhinha. Mas também os gostos do chefe de Estado da Jugoslávia eram duvidáveis, uma vez que o seu prato preferido era gordura de porco quente.
Adolf Hitler sofria de flatulência crónica e, talvez por isso, tornou-se vegetariano. Além disso, o ditador alemão autorizou um médico a receitar-lhe 28 medicamentos diferentes, incluindo um feito com o extracto de fezes de componentes búlgaros.
Mao Tsé-Tung, o líder comunista chinês, era um carnívoro apaixonado, mas sofria muito dos intestinos. Uma vez confessou a outro líder, numa carta, que comia muito, mas que também passava muito tempo na casa de banho.
Josef Stalin gostava de comer especialidades da Geórgia e o seu prato preferido era Satsivi, feito com galinha e nozes, servido como entrada à temperatura ambiente. O líder da União Soviética aproveitava os jantares em sua casa, em Kuntsevo, para ridicularizar os outros líderes que, durando cinco ou seis horas, tornaram-se uma forma refinada de tortura, graças à participação obrigatória em jogos de beber, músicas e danças. Nikita Khrushchev, o secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética, e Tito da Jugoslávia foram dois dos seus “alvos”.
Jean Bedel Bokassa, Presidente da República da África Central, Idi Amin, ditador militar do Uganda, e Francisco Nguema, presidente da Guiné Equatorial, eram suspeitos de serem canibais. Bokassa chegou mesmo a ser julgado por canibalismo, entre outros.
Um dia se saberá os hábitos alimentares dos ditadores deste século, muitos deles com estágio no século anterior.