O alegado assassino de Hilbert Ganga é um militar que faz parte, não das Forças Armadas Angolanas, enquanto órgão governamental, mas do exército privado de José Eduardo dos Santos, actual Presidente da República de Angola.
E ste soldado da UGP – Unidade da Guarda Presidencial, cuja cultura de protecção assenta no “mata primeiro e discute depois”, andou muito tempo escondido. Os seus superiores hierárquicos, que julgam estar sempre acima da lei, refutaram-se a denunciá-lo às autoridades judiciais.
“Não sabemos quem foi o soldado, que disparou”! “Se calhar é um infiltrado”!
Respostas atentatórias aos neurónios de qualquer cidadão normal. Diante desta aberração, o advogado decidiu formular a queixa contra o comandante da unidade; um general, garbosamente pago pelo Presidente da República e com mordomias, que muitas vezes, segundo uma fonte do F8, chegam aos 50 mil dólares semanais.
Aí chegados, o generalíssimo abandonou a clandestinidade, e para não ver a pele aquecer nos quadradinhos das fedorentas masmorras do regime, recuperou a memória e, no meio dos 19 mil homens que compõe o exército privado de Eduardo dos Santos, descobriu, qual agulha no palheiro, o alegado assassino de Hilbert Ganga, jovem engenheiro e militante da CASA-CE, barbaramente assassinado no 23 de Novembro de 2013, cujo crime foi a de colar cartazes a mais de 800 metros do Palácio Presidencial, exigindo justiça pelos assassinatos de Cassule e Kamulingue.
E, com base nisso, emergiu, Desidério Patrício de Barros, solteiro, maior, angolano, filho de Augusto Manuel e de Faustina Filipe de Oliveira Barros, que já está devidamente identificado nos autos, pois chegou a ser ouvido, na fase de instrução preparatória, mas continuam as posições dilatórias.
O processo foi remetido ao tribunal e distribuído para a 8.ª secção, com o n.º 884/14, estando na letra do juiz José Pereira Lourenço.
Antes da pronúncia foram emitidos dois “mandados de captura”, sendo o último, através do oficio 218/14 de 30 de Outubro e recebido na DPIC (Direcção Provincial de Investigação Criminal), no dia 04 de Novembro 2014, mas a verdade é que este órgão e o departamento de Buscas e Capturas, mesmo sabendo do domicílio do alegado assassino, não cumprem com a decisão judicial.
O próprio advogado da causa, Miguel Francisco, já se deslocou por várias vezes a DPIC, mas estes continuam a fazer ouvidos de mercador, por se tratar de alguém, protegido da Presidência da República.
“Eu não entendo qual é a dificuldade desta direcção de Buscas e Capturas para cumprir uma ordem judicial, principalmente, quando o infractor está localizado?”, interroga-se o advogado.
A dificuldade é uma. Fosse um outro infractor, ligado, por exemplo, à CASA-CE, UNITA ou PDP-ANA e há muito o homem estaria atrás das grades ou mesmo preso na barriga de um qualquer jacaré, domesticado nos rios da Segurança de Estado e DPIC.
É a consagração do princípio da desigualdade…
A Constituição de Angola, feita à medida do fato de Eduardo dos Santos, demonstrou mais uma vez ter sido confeccionada por gente no exterior e aprovada por gente que não a leu, ao ponto de, quando o cidadão pretende, recorrer aos seus articulados, como o art.º 47.º (Liberdade de reunião e de manifestação), o regime reage com violência, como foi no caso, de Hilbert Ganga.
Quanto a proximidade a lei diz, não poderem os manifestantes, chegar a 100 metros dos órgãos de soberania, ele estava a 800 metros.
Se ainda assim tivesse de haver violência ela, não poderia, violar o art.º 57.º da Constituição que diz no n.º 1: “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário, proporcional e razoável numa sociedade livre e democrática, para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.
Ora isso não diz nada aos brutamontes assassinos, tão pouco aos seus mentores e chefes, daí a morte ser a medida de razoabilidade.
“O processo está acusado e o digno agente do Ministério Público já exarou um Despacho de captura. Penso até que um dos indivíduos ligados ao sector de captura está aqui presente (na manifestação recordando um ano de passamento de Ganga), e já o abordei mesmo na entrada do cemitério”, desabafou Miguel Francisco.
O autor do homicídio, ainda beneficia da presunção de inocência, até condenação em julgado, mas deve aguardar, pela dimensão da imputação criminal: homicídio voluntário, julgamento em prisão preventiva.
“É tudo muito fácil, ele é da UGP, está identificado, nem é preciso lá ir, é só mandarem uma ordem e de lá o militar é encaminhado para a DPIC e consequente, esta coloca-o na prisão, para aguardar o julgamento. Mas, até lá, ele goza da presunção de inocência e caberá ao Tribunal julgá-lo, se for o culpado, e aí pagará pelo crime cometido”, concluiu.