Milhares de pessoas são esperadas hoje em Lisboa numa manifestação contra o racismo e xenofobia, denominada “Não nos encostem à parede”, em protesto contra a actuação da polícia na zona do Martim Moniz que, supostamente e segundos os “irmãos” do Chega na extrema-esquerda, visou imigrantes.
Por Orlando Castro (*)
Na sequência da intervenção da PSP no dia 19 de Dezembro na rua do Benformoso, perto do Martim Moniz, em Lisboa, e das imagens de dezenas de cidadãos que – ao que parece – traziam letreiros a dizer “somos imigrantes” encostados às paredes dos prédios, para serem revistados, vários activistas de esquerda e da extrema-esquerda e uma centena de organizações subscreveram um apelo contra a actuação das forças policiais junto das periferias e dos imigrantes.
O anúncio de uma manifestação, que tem início pelas 15:00 junto à Alameda e termina no Martim Moniz, motivou a resposta de grupos da extrema-direita e o partido Chega (“irmão” do Bloco de Esquerda, embora no outro extremo político) organizou uma vigília de apoio à PSP na Praça da Figueira para a mesma tarde, denominada “Pela autoridade e contra a impunidade”.
A acção da polícia no dia 19 de Dezembro foi criticada pelo presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho, que já disse que não vai participar na manifestação organizada para contestar a acção da política.
A manifestação “pode até ter como promotores pessoas que estimo e convictas da sua importância, porém está também apadrinhada por muitos radicais populistas, ‘wokistas de esquerda, que instrumentalizando a comunidade dos imigrantes visados na operação policial – para quem até aqui pouco têm manifestado preocupação ou solidariedade social – procurarão transformar a manifestação num ataque à polícia”, escreveu o autarca, na sua página na rede social Facebook.
Miguel Coelho que reafirmou a sua oposição à actuação da PSP, considerando-a “inaceitável” pela “postura, pelo grupo social e étnico das pessoas visadas e pela duração da mesma”, mas salientou que o protesto de hoje é “perigoso”, porque “só favorecerá a extrema-direita”.
O autarca recordou que há locais da Mouraria, perto do Marim Moniz, que são “zonas de insegurança, quase sempre relacionadas com a venda/consumo de droga e de álcool na rua, sobretudo durante a noite”, mas que não têm relacionamento com a presença de imigrantes.
Durante o dia de sexta-feira, o partido ADN, de extrema-direita, colocou cartazes na zona do Martim Moniz contra o que considera ser imigração ilegal, mas foram retirados por não estarem autorizados.
Para a manifestação de hoje, que parte da Alameda, são esperados vários dirigentes partidários e dirigentes de organizações anti-racistas, de apoio a imigrantes e de bairros periféricos, como a Solidariedade Imigrante, o SOS Racismo, a Vida Justa, Casa do Brasil de Lisboa ou o Moinho da Juventude.
Organizações locais, como o Bangladesh Colectivo, Beahmanbaria Community of Portugal, Cozinha Comunitária dos Anjos, Renovar a Mouraria ou Sirigaita também se associaram ao evento.
De acordo com os promotores, os participantes defendem que “todas as pessoas que vivem e trabalham em Portugal têm que ser tratadas com dignidade e que esta acção policial não foi um caso isolado, acontecendo regularmente noutras periferias de Lisboa e do país”.
“A segurança não pode ser confundida com a instrumentalização da polícia” e os “signatários apelam a uma manifestação que exige dignidade, direitos sociais e liberdade para quem vive e trabalha em Portugal”, pode ainda ler-se no comunicado dos promotores.
Numa resposta enviada à Lusa, a Direcção nacional da Polícia de Segurança Pública refere que analisou e fez a avaliação do risco da manifestação “Não nos encostem à parede”, que se realiza entre a Alameda e o Martim Moniz, em Lisboa, e da vigília “Pela autoridade e contra a impunidade” promovido pelo Chega, indicando que se reuniu com os promotores das duas iniciativas para os sensibilizar sobre as “questões de protecção e segurança de quem” participar nas manifestações.
Aquela força de segurança salienta que produziu “uma análise e avaliação do risco que permita um planeamento operacional o mais detalhado e concreto possível de forma a impedir acções hostis e de violência”, uma vez que as duas manifestações defendem interesses e posicionamentos ideológicos antagónicos.
“A PSP já efectuou a sua avaliação e análise do risco, tendo já articulado no sentido de alertar as organizações das referidas manifestações sobre os limites que a lei impõe, tendo também já o seu planeamento pronto no sentido de garantir que não haja qualquer constrangimento à realização das manifestações e ao livre exercício do direito de reunião e manifestação”, precisa a polícia.
Nesse sentido, vão ser mobilizadas para a segurança das manifestações diversas valências do Comando Metropolitano de Lisboa (Cometlis), que terão “o apoio permanente de meios da UEP da PSP”, refere aquela força de segurança, que não menciona os meios envolvidos.
Por uma questão de memória, recorde-se que enquanto dirigente da SOS Racismo e, na altura, assessor do Bloco de Esquerda, Mamadou Ba publicou um texto na rede social Facebook em que falou da “violência policial” no bairro da Jamaica, no Seixal, e dos confrontos, referindo-se à polícia portuguesa como “a bosta da bófia”.
Em tempos, almocei num restaurante do Porto com mais três amigos. A simpatia do empregado levou-o a quebrar o gelo com uma frase emblemática:
“É um prazer receber três africanos e um europeu”.
Conclusão supostamente fácil já que três eram negros e um branco.
No fim do almoço, depois da conta paga, um dos meus amigos chamou o empregado e disse-lhe:
– Errou nas nossas nacionalidades. É que três são portugueses, portanto europeus, e só um é africano.
Perante a incredulidade do empregado, esclareceu: Os três negros são todos portugueses e o branco é o único africano.
Recordo, entretanto, que numa emblemática sala de espectáculos do Porto (Portugal), uma senhora barafustava com o assistente de sala por não a deixar entrar por uma determinada porta.
Ele explicou: “O seu bilhete indica que a porta de entrada é outra”.
Irritada e aos berros a senhora dizia: “Está a fazer isso porque eu sou negra”…
A foto que ilustra este texto refere-se a uma operação policial que aconteceu em 2008, no Porto, durante o Governo de José Sócrates. Não vale a pena perguntar onde andavam Pedro Nuno Santos, Mariana Mortágua, Rui Tavares e outros similares. A diferença é que os que estão encostados à parede são portugueses… brancos (um dos quais eu).