REFLEXÃO DE LUTO EM MEMÓRIA DE NZITA TIAGO

A notícia da morte de Nzita Henrique Tiago, no dia 3 de Junho de 2016, surpreendeu mais do que uma pessoa na comunidade nacional e não só, deixando-nos a todos num estado de choque emocional numa altura em que ninguém esperava tal fim, e tal é a escolha do destino, mas hoje, que lição aprendemos com a sua morte e com toda a sua obra na luta pela luta de libertação do povo Cabinda, como sempre o proclamava?

Por Osvaldo Franque Buela (*)

Nzita Tiago tinha uma obsessão pela palavra «liberdade» e pela «luta de libertação» do povo Cabinda, e para ele estas palavras assumiram um carácter sagrado e conduziram esta luta de resistência contra a ocupação angolana com rigor intransigente, era algo não-negociável na sua visão política, baseada no direito internacional de que cada povo tinha o direito de dispor e escolher seu próprio destino.

Foi assim que, no contexto da Guerra Fria da época, depois das injustiças da descolonização cometidas por Portugal, Nzita Tiago pegou em armas como haviam optado todos os movimentos de luta de libertação da época, para libertar Cabinda do jugo da escravatura e colonialismo Luso-angolano.

Ainda me lembro com tristeza quando ele disse: “Quem não conhece o seu valor, muitas vezes vende a sua dignidade, mas a dignidade não pode ser negociada e a honra de um homem não pode ser comprada porque o seu preço é inestimável, mas como podem vocês, jovens de hoje, não perceber o que você é e o que você vale?”

Nzita TiagoI repetia muitas vezes «Buela, um homem de honra vive e morre com a cabeça erguida, e não tenho certeza se hoje você entende essas palavras, mas tenho certeza que quando eu não estiver mais aqui, e nas condições em que eu partirei, você perceberia melhor o sentido dessas palavras e a responsabilidade que tem de libertar este povo do qual você faz parte.»

De facto, depois de passar os últimos 14 anos da sua vida ao seu lado, partilhando e confeccionando as suas refeições, ajudando-o nas diversas tarefas diárias quase 3 dias por semana, com muita perspectiva e ao longo do tempo, compreendi perfeitamente não só o profundo significado das suas palavras, mas esta pesada responsabilidade que temos de defender a causa de Cabinda e do seu povo do qual fazemos parte, mesmo longe no exílio.

Acima de tudo, compreendi que ele não se dirigia especificamente a mim, seria uma pretensão da minha parte, mas era a toda a juventude cabindense que se dirigia, sobretudo depois da assinatura dos Acordos do Namibe por Bento Bembe e o seu grupo, após a sua incrível fuga da Holanda, orquestrada pelos serviços de inteligência angolanos.

Quando ele falava de honra e dignidade para um homem, entendi e vi que ele mesmo aplicava um código de honra tanto na sua vida privada como na sua luta política, aplicava-se a respeitar os princípios da honra e da dignidade primeiro a si mesmo, antes de ensiná-los aos outros, porque Nzita nunca impôs aos outros o que não impôs a si mesmo, e morreu de cabeça erguida e com toda a dignidade. Que grande HOMEM ele foi…

Ainda hoje, quando olho para o que Bento Bembe se apressou em fazer sem código de honra, vendendo a sua honra e a de um povo para acomodação da sua própria família e dos seus amiguinhos que o seguiram no Namibe, percebo, e aliás como todos os Cabindas que Nzita Tiago tinha razão, e até hoje a história continua a provar que ele estava certo.

Os resultados da nossa luta são amargos, o fracasso cruel está aí e devemos admiti-lo, estamos num impasse e não avançamos nem diplomaticamente nem militarmente para aqueles que persistem na luta armada, porque continuamos a fazer coisas sem um código de honra, sem solidariedade, sem esse lado responsável que deveria caracterizar a essência da nossa luta, cada um faz por si e todo mundo quer ser líder, no final damos um passo para frente, dois para trás, e pelo contrário temos esta infeliz tendência de aplaudir e ajoelhar-nos perante aqueles que nos colonizam.

Não tiramos nenhuma lição, sim, Nzita Tiago não fez tudo como pensamos e muitas vezes criticamos, mas em relação ao contexto, ele treinou, traçou o caminho e deu a direcção a seguir, mas hoje sim, com todos meios tecnológicos e outros canais de informação que temos, ainda não conseguimos fazer metade do que ele conseguiu num ambiente hostil e da Guerra Fria, e pior ainda, a comunidade internacional continua a brilhar com dois pesos e duas medidas.

Sim meus irmãos, cada povo tem os seus heróis e os seus modelos, querendo ou não, vamos homenagear esse herói, vamos dar a Nzita Tiago o lugar que ele merece em nossos corações, e fazer da data de sua morte, um dia de reflexão, fazendo o esforço e sacrifício de estarmos juntos, e finalmente… «PENSAR CABINDA».

Não terminarei este artigo de opinião sem prestar também uma vibrante homenagem a todos aqueles que deram a própria vida por esta nobre causa de Cabinda, porque se “os heróis do povo são imortais”, então pela sua memória, façamos o trabalho e terminemos com sucesso o que começaram, pois diversas opções são-nos favoráveis para conquistarmos essa liberdade e dignidade perdidas…

Que Deus abençoe Cabinda

(*) Refugiado político, França

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