“SEM GOVERNO” E COM OPOSIÇÃO DE FAZ DE CONTA

Liberty Chiaka, líder do grupo parlamentar da UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA ainda permite em Angola, considerou hoje que “o país está sem Governo”, dando como exemplo a colocação de seguranças e auxiliares de limpeza de escolas para vigiarem provas.

O “país está sem Governo, como é possível mandar seguranças de uma escola, empregados de limpeza, pessoal administrativo, acompanhar provas?”, questionou Liberty Chiaka, que falava em conferência de imprensa para o balanço do que, pomposamente, chama de visitas de constatação de deputados da UNITA às 18 províncias do reino.

O deputado questionou ainda nessa situação “quem elaborou as provas, quem vai corrigir as provas, quem vai fazer o lançamento das notas, quem vai fazer as pautas e quem estará no conselho de notas?”

“É assim que vamos dizer que temos Governo? Não! Angola não tem Governo”, salientou.

Os professores angolanos cumprem a segunda fase de greve, que se iniciou no dia 6 deste mês e termina na sexta-feira, para a reivindicação de melhorias salariais e de trabalho.

De acordo com o Sindicato Nacional de Professores (Sinprof) angolano, desde a paralisação dos trabalhos não se realizou nenhum encontro com o Ministério da Educação, estando já a ser preparada a realização da terceira fase da greve, que decorrerá entre 3 e 31 de Janeiro de 2023.

A segunda fase da greve coincidiu com as provas do primeiro trimestre, tendo o sindicato denunciado que o Ministério da Educação terá alegadamente orientado as escolas a realizarem as provas e que para a sua concretização está a recorrer a seguranças, auxiliares de limpeza, pessoal administrativo e seus familiares.

 BRINCAR AOS MUNICÍPIOS

O líder do grupo parlamentar  disse também hoje que a UNITA não aceitará o adiamento das eleições autárquicas, por conta da nova divisão política administrativa. 

Liberty Chiaka, que fazia o balanço das visitas de constatação que deputados da UNITA às 18 províncias do país, lamentou que a maioria dos governadores provinciais se recusaram a receber as delegações para os cumprimentos de cortesia, com excepção do Cunene, Huambo, Cuanza Sul e Namibe.

Assim como a maior parte dos governadores provinciais, acrescentou o deputado, comandantes policiais, administradores municipais, directores de hospitais, de escolas, não receberam os deputados da UNITA.

Segundo Liberty Chiaka, as visitas serviram também para auscultar os cidadãos relativamente à proposta da nova divisão político administrativa. 

O deputado realçou que, passando de 164 para 581 municípios, Angola seria o primeiro e único país do mundo sem entidades inferiores aos municípios, questionando qual o critério base que foi usado.

“Sejam 164 municípios, 581 municípios, mesmo se forem 1.800 municípios ou 18.000 municípios, tem de ser 581 autarquias ou 18.000 autarquias, esta é a nossa decisão. Atenção, não venha o argumento, de como tivemos de fazer a divisão, aumentar os municípios, as autarquias ficam para o ano 2075, quando Angola completar 100 anos de independência, não, negativo”, expressou.

Liberty Chiaka sublinhou que a Constituição determina que as autarquias se organizam nos municípios, podendo ser do nível supramunicipal e também inframunicipal.

“Comecemos com os 164 municípios que já existem, se depois tivermos necessidade de criar outros municípios, que a base seja aqueles que já existem”, frisou.

O líder do grupo parlamentar do maior partido da oposição angolana reforçou que esta é a posição da UNITA, esperando que a proposta de nova divisão político-administrativa “não seja um expediente para continuar a adiar o processo das autarquias”.

De acordo com Liberty Chiaka, as constatações nas 18 províncias angolanas serão consolidadas num relatório, que será remetido às entidades competentes, com contribuições, para melhorar a condição social e económica dos cidadãos.

Angola tinha o ano 2020 como data indicativa para a realização das primeiras eleições autárquicas, mas devido à pandemia de Covid-19 e por não estar ainda concluído o pacote legislativo autárquico, com 11 leis, das quais 10 já aprovadas pela Assembleia Nacional, não se efectivaram.

Em Outubro deste ano, o chefe de Estado angolano referiu, em declarações à imprensa em Dakar, Senegal, que enquanto não estiveram criadas condições não vai “assanhadamente” convocar eleições autárquicas, frisando que o pacote legislativo autárquico não está concluído.

“Quando houver condições. Como sabe o pacote legislativo autárquico não está terminado. Enquanto isso não posso assanhadamente – se me permite a expressão – convocar eleições”, respondeu João Lourenço à Radio France Internationale.

O processo de implementação das autarquias divide o Governo e os partidos da oposição, bem como a sociedade civil, defendendo os primeiros a institucionalização gradual e a outra parte que ocorra em simultâneo em todos os municípios.

O parlamento angolano tem ainda para discutir e aprovar a proposta de Lei de Institucionalização das Autarquias Locais, tido como o principal diploma do pacote legislativo.

PREGAR AOS PEIXES NO… DESERTO

Em Setembro, Adalberto da Costa Júnior disse que iria usar o seu poder (que é nulo) como conselheiro de João Lourenço para o “aconselhar mesmo” e prometeu trabalhar lado a lado com o Presidente angolano “por Angola e pelos angolanos”. Se, por um lado, o líder da UNITA diz que o MPLA o roubou, por outro promete conviver com o ladrão e aconselhá-lo a deixar de roubar.

O presidente da UNITA prometeu igualmente “lutar dentro das instituições do Estado” para a democratização do país e realizar várias manifestações de rua.

Em resposta ao discurso do líder da UNITA, o MPLA afirma que “jamais alinhará com forças políticas que não respeitam a Constituição e a lei, promovem subversão, incitam actos de violência e vandalismo, recusam-se a respeitar a vontade popular, chegando ao ponto de não felicitar o vencedor, a quem agora se arrogam ao direito de convidar para caminhar lado a lado”.

Em 27 de Março de 2019, a UNITA pediu o fim do sigilo nas negociações entre o Governo o Fundo Monetário Internacional. Tal como hoje, com excepção do seu fundador (Jonas Savimbi), os sucessivos líderes da UNITA são exímios especialistas em falar quando devem estar calados e em estar calados quando devem falar. Não foi, com certeza, com Savimbi que aprenderam esta estratégia. E, pelos vistos, assim vai continuar “ad aeternum”.

Provavelmente por ainda acreditar no Pai Natal, o líder da UNITA, manifestou no dia 22 de Dezembro de 2017 disponibilidade do seu partido para uma concertação directa com o MPLA, força política no poder em Angola desde 1975, e o Estado, para a concretização da reconciliação nacional.

Isaías Samakuva, que discursava na cerimónia de cumprimentos de fim de ano, considerou o actual (2017) momento político de Angola uma “oportunidade para os angolanos encontrarem novos caminhos e abordagens para a concretização da reconciliação nacional”.

Para o então presidente da UNITA, os princípios orientadores do diálogo poderiam incluir o reconhecimento de que são todos culpados, responsáveis e vítimas do passado, que uma guerra civil não tem vencidos nem vencedores e que a história política de Angola deve ser escrita no espírito da reconciliação nacional e da construção da nação.

Na sua proposta, Isaías Samakuva apresentou como pontos a incluir na agenda deste “amplo e decisivo diálogo nacional”, a afirmação da vontade política do Estado para encerrar a era da partidarização do Estado, o fim do período da utilização dos cargos públicos para enriquecimento ilícito, a abordagem da “questão mal resolvida da desmobilização dos ex-militares, antigos combatentes e veteranos da pátria, entre outras questões”.

“Pela complexidade que a reconciliação nacional encerra em Angola, o modelo a seguir e os conteúdos devem revisitar as fórmulas ancestrais, as experiências contemporâneas de vários países que experimentaram o fratricídio e contextualizá-las de forma a criar-se espaço político, económico, social e cultural, onde seja possível viver a verdade, o perdão, a justiça, o reconhecimento e a aceitação recíproca”, referiu.

Isaías Samakuva considerou que o início de 2018 constituía uma oportunidade ímpar para os angolanos começarem “a partir os muros altos da partidarização do Estado” e darem início à construção dos fundamentos “para a construção de nação, inclusiva, solidária e verdadeiramente reconciliada”.

“Façamos de 2018, o ano da despartidarização do Estado e da reconciliação nacional”, exortou Isaías Samakuva.

Com Isaías Samakuva e Adalberto da Costa Júnior, sucedem-se os exemplos de que a UNITA vive num país que não existe e acredita, eventualmente, que o Pai Natal é angolano. Se é… é do MPLA. Ingenuamente, primeiro Samakuva e agora Adalberto, passam sempre a mensagem de que Angola é aquilo que não é: uma democracia e um Estado de Direito.

Num outro Natal (e o Natal é sempre que um homem quiser), Isaías Samakuva defendeu que era “tempo de os angolanos reflectirem sobre a sua história recente”, para dela tirar lições e fazer com que “a paz reine efectivamente em Angola, num ambiente de perfeita harmonia”.

“Os acordos de paz para Angola devem fazer-nos lembrar que pertencemos todos à mesma família e não devemos repetir os mesmos erros do passado”, destacou Samakuva num desses outros natais. Esqueceu-se, o que também é natural, que “pertencemos todos à mesma família”… embora uns pertençam mais do que outros.

Relembremos, por ser verdade e antes que o MPLA os reescreva, os Acordos de Paz de Bicesse, também conhecidos por Acordos de Paz para Angola, que resultaram do primeiro acordo de Paz em Angola, em 1991, entre a UNITA e o MPLA/Governo, no Alto Kauango, e em que os principais protagonistas foram Higino Carneiro, Ben Ben e William Tonet.

Hoje é tempo de os angolanos reflectirem sobre a sua História recente para que a partir dela consigam tirar lições que façam com que a paz reine efectivamente em Angola num ambiente de perfeita harmonia.

Tal como em 1975, o MPLA continua a acreditar na razão da força, e a UNITA agarra-se à força da razão. Até agora a vitória é sempre do MPLA. Como se já não bastasse à UNITA pregar aos peixes, agora está a fazê-lo no deserto mas depois de visitas de constatação dos seus deputados…

Folha 8 com Lusa

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