No dia 3 de Setembro de 2019, o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas Angolanas (FAA), Egídio de Sousa Santos “Disciplina”, foi condecorado em Lisboa, Portugal, pelo Presidente daquele país, Marcelo Rebelo de Sousa, com a medalha da Grande Cruz de Mérito Militar.
Entregue numa cerimónia em que também foram distinguidos oficiais portugueses, a medalha da Grande Cruz de Mérito Militar entregue ao general “Disciplina” é a mais importante condecoração militar atribuída pelo Estado português.
A condecoração do oficial superior angolano simbolizou, segundo a organização do evento, o empenho de Angola no reforço da cooperação militar entre os dois países. Quem diria? Só mesmo Marcelo.
O acto, que decorreu na zona do Restelo, esteve inserido nas comemorações do Dia do Estado Maior General das Forças Armadas Portuguesas. O Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas Angolanas esteve acompanhado pelo embaixador de Angola em Portugal, Carlos Alberto Fonseca, e por funcionários da chancelaria militar, bem como diplomatas angolanos acreditados naquele país.
Em 2017, o ex-Adido de Defesa Adjunto da Embaixada de Angola em Portugal, Francisco Ramos da Cruz, foi condecorado com a medalha Cruz Naval de Segunda Classe, pelo Estado-Maior da Armada e Autoridade Marítima Nacional daquele país.
Como se sabe e como, aliás, já aqui foi escrito, Marcelo Rebelo de Sousa é o político português mais habilitado (a par do primeiro-ministro António Costa) para não só cimentar como também alargar as relações de bajulação e servilismo com o regime do MPLA. Marcelo sabe que – do ponto de vista oficial – Angola será sempre do MPLA, e que o MPLA será sempre Angola. Portanto… Siga a fanfarra, tantas vezes mais parecendo uma orgia.
Razão tinha Jonas Savimbi quando dizia que só há uma forma de tirar o MPLA do poder – a guerra. E, apesar de tudo, o MPLA tudo faz para dar razão a Savimbi.
Angola é um dos países lusófonos com uma das maiores taxas de mortalidade infantil e materna e de gravidez na adolescência, segundo as Nações Unidas. Mas o que é que isso importa? O importante é o MPLA ganhar sempre. Pensar que as eleições podem alterar a situação é uma miragem. Desde logo porque mesmo antes da votação o MPLA já sabia a percentagem da sua vitória.
Aliás, muitos dos angolanos (70% da população vive na miséria) que raramente sabem o que é uma refeição, poderão certamente continuar a alimentar-se com o facto de julgarem que o seu voto conta para alguma coisa.
Os pobres em Angola estão todos os dias a aumentar e a diminuir. Aumentam porque o desemprego aumenta, diminuem porque vão morrendo. Mas a verdade é que esses angolanos não contam para o MPLA. Para fingir que contam, o MPLA até autorizou mais de 2 milhões de mortos a votar.
A comunidade internacional, nomeadamente Portugal (o descolonizador), sabe que o anterior presidente angolano esteve no poder durante 38 anos sem ter sido nominalmente eleito, tal como sabe que o actual lá quer ficar também muitos e muitos anos, continuando sem ser nominalmente eleito. Mas isso pouco ou nada importa…
Portugal continua, aliás, de cócoras perante o regime esclavagista do MPLA, tal como esteva em relação a Muammar Kadhafi que, citando José Sócrates, era “um líder carismático”. Talvez um dia Portugal chegue à conclusão que, afinal, Eduardo dos Santos também foi um ditador e que João Lourenço foi por ele escolhido.
Será que alguém vai perguntar a Marcelo Rebelo de Sousa o que pensa dessa farsa a que se chama democracia e Estado de Direito em Angola? Não. Basta ver que, mesmo antes de ser declarado vencedor das “eleições” do dia 23 de Agosto de 2017, já João Lourenço era felicitado pelo Presidente da República de Portugal. Em 2022, embora há muito o texto das felicitações pela vitória do MPLA esteja escrito, haverá mais cuidado temporal na sua divulgação.
Certo será que, nesta matéria, Marcelo Rebelo de Sousa continua a pensar da mesma forma que Cavaco Silva, José Sócrates, Passos Coelho ou António Costa, para quem Angola nunca esteve tão bem, mesmo tendo 70% dos angolanos na miséria, mesmo que as eleições sejam uma fraude.
De facto, os portugueses só estão mal informados porque querem, ou porque têm interesses eventualmente legítimos mas pouco ortodoxos e muito menos humanitários. Marcelo Rebelo de Sousa não escapa à regra.
Custa a crer, mas é verdade que os políticos portugueses (agora nem com a excepção dos do Bloco de Esquerda) fazem um esforço tremendo (se calhar bem remunerado) para procurar legitimar o que se passa de mais errado com as autoridades angolanas, as tais que estão no poder desde 1975.
Bem dizia Eça de Queiroz, provavelmente antecipando a pequenez intelectual dos dirigentes portugueses, que “os políticos e as fraldas devem ser mudados frequentemente e pela mesma razão”.
Vejamos, por exemplo, o que disse Guerra Junqueiro, num retrato preciso e assertivo desses dirigentes e de grande parte dos seus cidadãos: “Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não discriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar”.
Continuemos, para memória passada, presente e futura, com o brilhantismo bacoco de Marcelo Rebelo de Sousa. Diz ele que, da parte de Portugal, Angola (ou seja, o MPLA) conta com “o empenho de centenas de milhares que querem contribuir para a riqueza e a justiça social” com o seu trabalho, bem como “das empresas, a começar nas mais modestas, no investimento e no reforço do tecido socioeconómico angolano” e também com “o empenho das instituições públicas portuguesas, do Estado às autarquias locais”.
“Podem contar connosco na vossa missão renovadora e recriadora. Portugal estará sempre e cada vez mais ao lado de Angola (ou seja, o MPLA)”, acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa, fazendo aqui e mais uma vez o exercício de passar aos angolanos um atestado de menoridade e matumbez.
Portugal, por sua vez, conta com a “incansável solidariedade” de Angola (ou seja, o MPLA). “Contamos com os vossos trabalhadores, as vossas empresas, as vossas instituições públicas, a vossa convergência nos domínios bilateral e multilateral. Temos a certeza de que Angola (ou seja, o MPLA) estará sempre e cada vez mais ao lado de Portugal”, prosseguiu Marcelo no seu laudatório e hipócrita exercício de servilismo.
De acordo com o Presidente português, este “novo momento na vida de Angola (ou seja, o MPLA)” coincide com “um novo ciclo” nas relações bilaterais. “E nada nem ninguém nos separará, porque os nossos povos já estabeleceram o seu e o nosso caminho”, considerou Marcelo, sentindo o umbigo aos saltos, alimentado pela esperança de que os portugueses não acordem e os angolanos nunca lhe cobrem a cobardia.
“Porque estamos mesmo juntos, na parceria estratégica, na cooperação económica, financeira, educativa, científica, cultural, social e política. Porque no essencial vemos o mundo e a nossa pertença global e regional do mesmo modo, a pensar na paz, nos direitos humanos, na democracia, no direito internacional, no desenvolvimento sustentável, na correcção das desigualdades”, argumentou aquele que, em matéria de bajulação, bateu todos os recordes anteriores, desde Álvaro Cunhal a Rosa Coutinho, passando por Vasco Gonçalves, José Sócrates, António Costa, Cavaco Silva, Passos Coelho e tantos outros.