A ministra da Acção Social, Família e Promoção da Mulher de Angola, Vitória da Conceição, defendeu hoje a revisão da lei da violência doméstica, crime que começa a “constituir-se num problema de saúde pública”.
A governante, que falava hoje, em Luanda, na cerimónia de encerramento da 1ª fase da consulta pública para avaliar a implementação, nos últimos sete anos, da Lei Contra a Violência Doméstica, apontou a necessidade da sua revisão em face das actuais mudanças.
Segundo Vitória da Conceição, “após sete anos de execução e considerando as mudanças” na sociedade angolana, é preciso uma revisão deste diploma, reflectindo, conjuntamente, para se “atestar a sua eficácia diante dos novos desafios”.
De acordo com a ministra, lutar contra este crime “é responsabilidade de todos, e é um imperativo para o desenvolvimento harmonioso da sociedade”.
Nos últimos meses, a sociedade civil angolana tem-se manifestado indignada com a crescente onda de crimes passionais e de violência doméstica, em que mulheres e crianças têm sido as principais vítimas.
“Este grande mal (violência doméstica) começa a constituir-se como um problema de saúde pública e deve ser combatido por todos os membros da sociedade, devemos engajar-nos todos nessa luta. Não cessemos”, exortou.
Concluída a primeira fase de consulta pública sobre a implementação da lei contra a violência doméstica, sete anos após a sua aprovação, a ministra da Acção Social, Família e Promoção da Mulher assegurou que, em 2019, o processo será alargado ao resto do país.
Violência doméstica na sociedade angolana
Lucas Fumba publicou em 29 de Outubro de 2015, no eradoconhecimentoblog, um interessante artigo sobre esta matéria que, com a devida vénia, reproduzimos:
«A violência doméstica é uma relação abusiva, de poder desigual, logo opressora, abrangendo não só as mulheres, mas também os homens, os idosos, as crianças. Não existem vítimas típicas. A violência doméstica é uma forma de abuso que toca pessoas de várias idades, etnias, culturas, e de vários estratos sociais. É de um grande sofrimento para todos as que a vivenciam, directa ou indirectamente. Não se deixe vitimizar, quebre o silêncio e faça valer o seu direito a uma vida condigna, onde é respeitada(o).
Pode ser dividida em violência física — quando envolve agressão directa, contra pessoas queridas do agredido ou destruição de objectos e pertences do mesmo (patrimonial); violência psicológica — quando envolve agressão verbal, ameaça, gestos e posturas agressivas, juridicamente produzindo danos morais; e violência socioeconómica, quando envolve o controlo da vida social da vítima ou dos seus recursos económicos. Também alguns consideram violência doméstica o abandono e a negligência quanto a crianças, parceiros ou idosos. Enquadradas na tipologia proposta por Dahlberg Krug, na categoria interpessoais.
Subdividindo-se quanto à natureza Física, Sexual, Psicológica ou de Privação e Abandono. Afectando ainda a vida doméstica pode-se incluir na categoria autodirigida o comportamento suicida especialmente o suicídio ampliado (associado ao homicídio de familiares) e de comportamentos de auto-abuso especialmente se consideramos o contexto de causalidade. É mais frequente o uso do termo “violência doméstica” para indicar a violência contra parceiros, contra a esposa, contra o marido e filhos. A expressão substitui outras como “violência contra a mulher”. Também existem as expressões “violência no relacionamento”, “violência conjugal” e “violência intrafamiliar”.
Note que o poder num relacionamento envolve geralmente a percepção mútua e expectativas de reacção de ambas as partes calcada nos preconceitos e/ou experiências vividas. Uma pessoa pode-se considerar como subjugada no relacionamento, enquanto um observador menos envolvido pode discordar disso.
Muitos casos de violência doméstica encontram-se associados ao consumo de álcool e drogas, pois o seu consumo pode tornar a pessoa mais irritável e agressiva especialmente nas crises de abstinência. Nesses casos o agressor pode apresentar inclusive um comportamento absolutamente normal e até mesmo “amável” enquanto sóbrio, o que pode dificultar a decisão da parceira em denunciá-lo.
Violência e as doenças transmissíveis são as principais causas de morte prematura na humanidade desde tempos imemoriais, com os avanços da medicina, disponibilidade de água potável e melhorias da urbanização a redução das doenças infecciosas e parasitárias, tem voltado o foco da saúde pública para a ocorrência da violência. Contudo este é um fenómeno que requer a colaboração interdisciplinar e acção multiprofissional, sem invalidar o papel da epidemiologia para o dimensionamento e compreensão do problema alerta para os riscos de reducionismo e necessidade de uma acção pública.
Há quem afirme que em geral os homens que batem nas mulheres o fazem entre quatro paredes, para que não sejam vistos por parentes, amigos, familiares e colegas do trabalho. A cultura popular tanto propõe a protecção das mulheres (em mulher não se bate nem com uma flor) como estimula a agressão contra as mulheres (mulher gosta de apanhar) chegando a aceitar o homicídio destas em casos de adultério, em defesa da honra. Outra suposição é que a maioria dos casos de violência doméstica são classes financeiras mais baixas, a classe média e a alta também tem casos, mas as mulheres denunciam menos por vergonha e medo de se exporem e à sua família. O fenómeno ocorre em todas as classes porém mais visíveis entre os indivíduos com fracos recursos económicos.
A violência praticada contra o homem também existe, mas o homem tende a esconder mais por vergonha. Pode ter como agente tanto a própria mulher quanto parentes ou amigos, convencidos a espancar ou humilhar o companheiro. Também existem casos em que o homem é apanhado de surpresa, por exemplo, enquanto dorme.
É impossível discutir a violência doméstica sem discutir os papéis de género, e se eles têm ou não têm impacto nessa violência. Algumas vezes a discussão de género pode encobrir qualquer outro tópico, em razão do grau de emoção que lhe é inerente.
Quando as mulheres passaram a reclamar pelos seus direitos, maior atenção passou a ser dada em relação à violência doméstica, e hoje o movimento feminista tem como uma de suas principais metas a luta para eliminar esse tipo de violência. O primeiro abrigo para mulheres violentadas foi fundado por Erin Pizzey (1939), nas proximidades de Londres, Inglaterra. Isso aconteceu na década de 1960. Pizzey fez certas críticas a linhas do movimento feminista, afirmando que a violência doméstica nada tinha a ver com o patriarcado, sendo praticada contra vítimas vulneráveis independentemente do sexo.
Vale ressaltar que os homens vítimas de violência doméstica, em função de se encontrarem numa sociedade sexista, acabam por não denunciar a violência que sofrem no âmbito familiar, tanto por vergonha quanto pelo facto de que a sociedade e as autoridades dão pouca atenção e auxílio a homens que denunciam. A situação de violência doméstica contra homens pode então chegar aos extremos de graves mutilações ou homicídio onde a vítima nem ao menos é ouvida.
Agressão física, abuso sexual, violação e ameaças. Além disso pode incluir criticismo destrutivo, tácticas de pressão, falta de respeito, quebra de confiança, isolamento e perseguição. Alguns abusadores oferecem “recompensas” com certas condições para tentarem convencer o parceiro de que o abuso não voltará a acontecer. Por mais persuasivos que pareçam, a violência normalmente piora com o passar do tempo.
A violência doméstica raramente acontece uma só vez. Com o passar do tempo, o abuso físico e sexual tem tendência a aumentar em frequência e severidade. O comportamento abusivo e controlador tanto emocional como físico pode ser contínuo.
O que posso fazer?
Reconheça o que está acontecendo; Aceite que a culpa não é sua e Procure ajuda e apoio. Não é fácil aceitar que a pessoa amada possa comportar-se tão agressivamente. Porque as vítimas não podem compreender o comportamento agressivo do parceiro, elas assumem que são as culpadas. Mas não são. Ninguém merece ser agredido, abusado, ou humilhado, muito menos por um parceiro numa relação supostamente carinhosa. É o comportamento abusivo do parceiro que necessita ser mudado. Não há desculpa.
O mais importante a fazer é dizer a alguém e quebrar o silêncio. Para algumas vítimas a decisão de procurar ajuda é rápida e relativamente fácil de tomar. Para outras, o processo será longo e doloroso enquanto tentam que a relação resulte e a violência cesse.
A ideia de abandonar a relação agressiva pode ser tão assustadora quanto a ideia de ficar. Muitas pessoas procuram ajuda inúmeras vezes até encontrarem o apoio que necessitam e podem ainda estar em risco depois de deixarem a relação. Não receie pedir ajuda novamente.
Podemos assim concluir que violência doméstica é a violência, explícita ou velada, literalmente praticada dentro de casa ou no âmbito familiar, entre indivíduos unidos por parentesco civil (marido e mulher, sogra, padrasto) ou parentesco natural pai, mãe, filhos, irmãos etc.. Inclui diversas práticas, como a violência e o abuso sexual contra as crianças, maus-tratos contra idosos, e violência contra a mulher e contra o homem geralmente nos processos de separação litigiosa além da violência sexual contra o parceiro.
Toda violência doméstica é repudiável, mas os casos mais sensíveis são a violência doméstica infantil, porque as crianças são mais vulneráveis e não têm meios de defesa. Mesmo quando a violência doméstica não é dirigida directamente à criança, ela pode ficar com traumas psicológicos.
Muitos casos de violência doméstica ocorrem devido ao consumo de álcool e drogas, mas também podem ser motivados por ataques de ciúmes. A maioria dos casos verificados são de violência doméstica contra a mulher, mas também há casos de violência doméstica contra o homem.
Como em muitos problemas na nossa sociedade, a prevenção é muitas vezes a melhor solução. Muitos especialistas indicam que no caso da violência doméstica, o acompanhamento dos casais antes que o problema aconteça é crucial. Além disso, é importante que haja uma actuação imediata por parte de várias entidades quando aparecem os primeiros sinais de violência doméstica.»
Folha 8 com Lusa