Mais de 4.800 pessoas trabalham actualmente em pequenas cooperativas de extracção artesanal e semi-industrial de diamantes em Angola, mas apenas 32 estão devidamente legalizadas pelas autoridades, segundo números da própria Endiama, a concessionária estatal do sector diamantífero.
De acordo com dados do presidente do conselho de administração da Endiama, José Ganga Júnior, no cargo desde Novembro último, até ao fim do ano de 2017 foram recebidas “750 solicitações” para legalização deste tipo de cooperativas.
“Ao que nos apercebemos, as solicitações foram exageradas e nem sequer houve condições para tratar de forma correcta os processos. Então, as autorizações de exploração foram rapidamente dadas verbalmente, sem documentação, sem nada disso”, situação que o administrador da Endiama explica com o período eleitoral que o país viveu em 2017.
Entretanto, a empresa estatal responsável pelo sector diamantífero, o segundo produto de exportação de Angola, com mais de mil milhões de euros de vendas anuais, refere que no levantamento em curso a este tipo de actividade já detectou mais de 400 processos de solicitação ou cooperativas já em funcionamento, que se sobrepõem a áreas concessionadas para exploração industrial ou de outras cooperativas.
Daí que, defende José Ganga Júnior, é necessário que esta actividade de garimpo artesanal seja “mais controlada”, com a Endiama a ultimar a entrega ao Ministério dos Recursos Minerais e Petróleos, para licenciamento final, de mais 230 cooperativas.
Desde 2016 que as empresas interessadas em negociar diamantes do mercado artesanal angolano, extraídos por pequenas cooperativas, estão obrigadas a comprar, mensalmente, o equivalente a quatro milhões de dólares (3,5 milhões de euros).
A informação consta do documento com a nova Política de Comercialização de Diamantes Brutos, aprovada por decreto presidencial no final de Agosto de 2016, e que mantém a comercialização (da produção industrial e artesanal) obrigatoriamente através da empresa pública Sodiam.
Na componente da extracção artesanal, que tem vindo a ser impulsionada pelo Governo angolano, por juntar os garimpeiros em cooperativas e assim aumentar a produção ao mesmo tempo que travam o garimpo ilegal, o documento define que a Sodiam – que pertence à concessionária estatal diamantífera Endiama – deve subcontratar empresas especializadas para essas compras.
Contudo, como requisitos, essas empresas assumem a obrigatoriedade de comprar mensalmente o equivalente a quatro milhões de dólares de diamantes “no mínimo” e de patrocinarem as cooperativas artesanais e semi-industriais, bem como dos artesãos individuais.
Recorde-se que o Presidente da República e Titular do Poder Executivo angolano ordenou a criação de uma comissão de apoio ao Conselho de Segurança Nacional, integrando governantes, polícias, militares e serviços secretos, para (entre outras valências) combater o tráfico de diamantes a partir de Angola.
João Lourenço, ao contrário de um conhecido provérbio, parece acreditar (ao arrepio do que pensou durante 38 anos José Eduardo dos Santos) que “Roma e Pavia se fizeram num dia”. Mas, passada a euforia inicial, tudo vai melhor… na mesma.
A medida consta de um despacho de 27 de Novembro, assinado pelo chefe de Estado, criando esta comissão, liderada pelo general Pedro Sebastião, ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República.
O documento aponta a “necessidade de se reforçar as medidas de combate à criminalidade organizada, controlar os fluxos migratórios, de reforço da segurança fronteiriça, bem como assegurar a convivência pacífica e ordenada entre os cidadãos angolanos e estrangeiros em todo o território nacional”.
Louvável iniciativa. Mais vale tarde do que nunca, é certo. Pena é que um problema que tem dezenas de anos não tenha sido resolvido por anteriores governos, todos do MPLA, nos quais João Lourenço teve voz activa, fosse como dirigente do partido ou como ministro da Defesa.
Esta comissão de apoio passa a reunir-se semanalmente e deve apontar medidas para “reforçar os mecanismos de combate à imigração ilegal e ao tráfico ilícito de diamantes”.
O garimpo ilegal de diamantes, normalmente realizada por imigrantes ilegais, provenientes sobretudo da vizinha República Democrática do Congo, nas províncias diamantíferas do leste, tem sido apontado como problemático, pelas autoridades angolanas.
Recorde-se que, no final de Novembro passado, as autoridades angolanas expulsaram nos últimos dias 4.766 imigrantes ilegais do município de Cambulo, província da Lunda Norte, no âmbito da operação “Luembe”, contra o garimpo de diamantes, que já levou à saída voluntária de mais de 20.000 ilegais.
A comissão (uma de muitas) criada pelo Presidente João Lourenço ficou encarregue de “tratar do planeamento estratégico das questões atinentes à imigração ilegal e ao tráfico ilícito de diamantes”, bem como da “análise e formação de medidas a serem executadas” com vista ao “controlo da imigração, do registo e acompanhamento dos residentes estrangeiros no país e do combate à exploração, posse e comercialização ilícita de diamantes”.
Integram esta comissão, ainda, o ministro de Estado e chefe da Casa Civil, Frederico Manuel Cardoso, como coordenador adjunto, bem como os ministros da Defesa Nacional, Interior e da Justiça e dos Direitos Humanos, além do Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas Angolanas, do comandante-geral da Polícia Nacional, dos chefes dos serviços secretos e do Serviço de Investigação Criminal e do próprio presidente da concessionária estatal para o sector diamantífero angolano, a Endiama.
Está ainda definido que os governadores das províncias de Cabinda, Lunda Norte, Lunda Sul, Zaire, Malanje, Uíge, Moxico, Cuando Cubango, Cunene, Namibe e Luanda participam nesta comissão como convidados, juntamente com um representante da Procuradoria-Geral da República angolana.
Recorde-se que o Presidente João Lourenço exortou a nova administração da Empresa Nacional de Diamantes de Angola (Endiama), a segunda maior empresa nacional, a definir “boas políticas” para o sector, de forma a captar “grandes investidores estrangeiros”.
“Precisamos de boas políticas neste sector dos diamantes. Políticas que atraíam os grandes investidores, as multinacionais do diamante, de forma a que elas se sintam motivadas a investir no nosso país, a exemplo do que fazem em outras partes do mundo”, disse João Lourenço, na intervenção que fez após dar posse à nova Administração da Endiama.
“Acreditamos que se encorajarmos uma política de comercialização que seja justa e transparente, vamos com isso atingir dois grandes objectivos. Atrair os investidores, por um lado, e de alguma forma desencorajar, afastar, o garimpo [ilegal, de diamantes] do nosso país”, apontou ainda, na mesma intervenção, João Lourenço.
Folha 8 com Lusa