O trilho da dignidade, da persistência, do comprometimento com a academia em detrimento de cegas ideologias partidocratas é capaz de vencer, mesmo em campos adversos.
Por William Tonet
P ortugal, país secular, com marcas de colonização em África (séculos XIX e XX-Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde) mas com inúmeros fantasmas preconceituosos, quanto à ascensão de pretos na sua estrutura política, acaba de derrubar mais uma barreira, na luta contra a discriminação racial.
O primeiro-ministro, António Costa, derrubou tabus e fronteiras, inaugurando um novo ciclo, para os até então discriminados e marginalizados, pela cor da pele, na sociedade portuguesa, ao nomear, no dia 26 de Novembro de 2015, a jurista Francisca Van-Dúnem, natural de Angola, mas assumidamente portuguesa, como primeira preta, ministra da Justiça de Portugal.
A indicação não se enquadra em políticas de quotas ou de favores, mas nos marcos da competência académica, enquanto profissional de Direito, que com discrição vinha palmilhando os carreiros da magistratura do Ministério Público português, onde exercia as funções de vice-procuradora adjunta da República, para a área metropolitana da Grande Lisboa, até saltar para as luzes da ribalta, como ministra da Justiça.
O mérito é pessoal e deve orgulhar antes de mais, todos quanto acreditando na formação académica, lutam contra todas as formas de discriminação e perseguição em muitas latitudes geográficas, não claudicando a tentação de subverter a ciência a bajulação ideológica.
Chica é uma vencedora e deve, partilhar esta alegria, com familiares, verdadeiros amigos e compatriotas portugueses, em primeiro lugar, que através do “jus solis” lhe concederam âncoras de assumida cidadania.
Por isso, nesta hora, tão sublime, ela é orgulho de Portugal e não de Angola, que nada fez, para a cadenciada ascensão, pelo contrário, se estivesse, em terras angolanas, pela força das ideias e convicções técnico-profissionais, seria, seguramente, perseguida, presa, torturada e quiçá assassinada, como o foram e são tantos outros quadros, por ousarem ser, exclusivamente, pese o “jus sanguis”, escravos da academia.
Eu, particularmente, senti um grande alívio, gritei, pulei, chorei, por ver o romper das grilhetas, que amarram brilhantes e ofuscados quadros africanos e angolanos, por políticas e políticos ditadores nos respectivos países, que se comportam, piores que os antigos colonizadores.
A nomeação de Chica Van-Dúnem, como primeira preta, ao posto de ministra da Justiça de Portugal é um hino à persistência, à crença na “cidadania do conhecimento científico”, passaporte para a afirmação em qualquer fronteira global.
Chorei, porque lá onde está, o meu camarada José Van-Dúnem (conhecemo-nos, primeiro, na cadeia de São Nicolau) como irmão mais velho, orgulhoso de ver a irmã Chica, chegar, aos 60 anos, a mais alta magistratura da Justiça portuguesa, não por bajular um partido ou um medíocre líder político, mas pelo rigor, disciplina, seriedade e competência profissional.
Recorde-se ter sido este ícone da juventude de Angola (Zé Van-Dúnem) a par de Nito Alves, barbaramente assassinado, com a mulher, Sitta Valles, por António Agostinho Neto e o MPLA, em 1977 (o actual Presidente da República, José Eduardo dos Santos foi coordenador da Comissão de Inquérito e nada fez para ouvir os acusados, sendo por esta e outras razões, amiúde, considerado cúmplice de tão hediondo massacre, que vitimou, cerca de 80.000 angolanos, caricatamente, a maioria do próprio MPLA).
“Foi um golpe terrível. Não se trata só de perder o meu irmão e a minha cunhada, trata-se de perder uma parte significativa das pessoas com quem eu passei a minha juventude. A lógica deles era matar todos os universitários e estudantes. Os intelectuais. Mas pronto, não se vai ressuscitar ninguém”, disse numa entrevista ao Semanário Expresso de Portugal. Na sequência da morte do irmão e cunhada, Francisca acolheu o sobrinho e educou-o como um filho.
Daí que só por mero cinismo e ofensa à memória de Zé Van-Dúnem, o regime do Titular do Poder Executivo, José Eduardo dos Santos, ouse chamar à colação, a nomeação desta profissional, ao facto de ter nascido em Angola, que nunca antes a reconheceu competência e profissionalismo.
É mero oportunismo político, que Chica terá de estar habituada, mas não pode, a eles, subjugar-se, quando, sub-repticiamente, muitos, a querem bajular, agora, com a ladainha de “família”, prima, amiga e compatriota, tudo para que ela, nas funções de ministra da Justiça de Portugal, branqueie falcatruas financeiras de uma série de governantes angolanas, que desviando dinheiro do erário público, na banda, o coloquem em Portugal.
Francisca Van-Dúnem, manda a honestidade intelectual, não, não é jurista angolana, mas sim portuguesa! Nasceu em Angola, sim, mas foi Portugal que lhe blindou uma cidadania desde que, com 17 anos de idade desembarcou, para estudar Direito.
Carregou lágrimas e dor, no exílio partilhado com a maioria dos irmãos sobreviventes, a que esteve sujeita, face à perseguição impiedosa e ao luto, causado pelo partido no poder, em Angola, à sua família.
Recorde-se, também, outro irmão o jornalista João Van-Dúnem, que trabalhou em Portugal e na BBC, em Londres e falecido em Luanda, em 2013, quando exercia funções na Administração do Grupo Media Nova, ligado à Presidência da República e que integra a TVZimbo, Rádio Mais, entre outros meios.
Francisca Van Dunem nasceu em Luanda a 5 de Novembro de 1955, no seio de famílias consideradas tradicionais Kimbundu: Vieira Dias, pela parte materna e Van-Dúnem pela paterna. É casada com o professor catedrático açoriano, Eduardo Paz Ferreira, com quem tem um filho.
Nomeada directora do DIAP (Direcção de Investigação e Acção Penal) de Lisboa, cargo que ocupou entre 2001 e 2007, e eleita procuradora-geral distrital de Lisboa pelo Conselho Superior do Ministério Público em 2007, tendo renovado o mandato em Janeiro de 2014 para liderar o maior distrito judicial de Portugal.
Em 2012, foi igualmente falada como uma das possíveis candidatas à sucessão de Fernando Pinto Monteiro como procurador-geral da República, mas o passado ligado à esquerda e ao Partido Socialista português, afastou-a naturalmente do cargo.
No novo cargo terá vários desafios internos pela frente, sendo o novo mapa judiciário e a revisão dos estatutos das magistraturas (com destaque para a do Ministério Público) os mais prementes. Os holofotes, estarão a ela virados, nos polémicos processos relacionados com Angola, após terem existido muitas críticas do regime angolano à actuação da Justiça portuguesa nos últimos anos, nomeadamente em casos envolvendo, figuras de proa, como Manuel Vicente, vice-presidente da República, Manuel Helder Vieira Dias “Kopelipa”, chefe da Casa de Segurança da Presidência da República, João Maria Moreira de Sousa, ligados com a lavagem de dinheiro, corrupção, a Operação Marquês (são investigados negócios angolanos de Hélder Bataglia, Santos Silva e José Paulo Pinto de Sousa, primo de Sócrates), o Monte Branco (onde José Paulo é figura relevante, cruzando aliás com o caso Sócrates) ou o caso BES e a relação com o BES Angola.
Em todos estes casos, Francisca Van Dúnem deve continuar a agir com o mesmo protagonismo que a caracteriza, elevando o Direito e a Justiça, na apreciação de cada caso, sem qualquer tipo de complexo, assumindo-se na defesa dos mais altos interesses de Portugal, mesmo que tenha sempre, uma costela angolana a roçar-lhe a coluna vertebral.
Em Portugal a justiça vem conquistando chão de independência, não estando subjugada, como em Angola, ao poder partidocrata do MPLA e do Presidente da República, bastando verificar os inúmeros processos envolvendo ex-governantes, com real destaque o ex-primeiro ministro José Sócrates (que esteve detido) e banqueiros, como Ricardo Salgado, Armando Vara, entre outros.
Caro Orlando,
Grato pelo exclarecimento acima mencionado.
Devo dizer que no periodo colonial realmente os poemas ,canções e até mesmo a dança eram um meio de comunicação indirecto para passar as mensagens e despertar todas as mentes oprimidas.
Votos de perseverança , na luta pelas causas Nobres e liberdade dos Povos Africanos, em particular o nosso povo de Angola que muito se rebate e sofre na ânsea de dias melhores na nossa existência.
Dizia o lider americano Martin Luther King jr,
“when will be free?”
Abraço a todos.
Texto elaborado por Jornalistas, mais que no entanto tentam usar parábolas poéticas, baralhando e juntando um pouco do orgulho da nossa linda cultura angolana e africana para justificar um grave erro de ofender uma pessoa de raça negra associando a cor preta de modo insultuoso, ou seja ferindo a dignidade da pessoa humana.
Acredito que nem mesmo os homens que se identificam como de raça branca, tenham a pele de cor branca, muito menos a raça negra a cor preta, essas identificações as raças certamente surgiram para tentar descrever as diferenças entre as distintas tonalidades dos tons de pele, sendo elas muito escuras, escuras, claras e muito claras, ou excessivamente claras sendo esses associados a raça branca e vice versa.
A questão aqui é simples caros jornalistas ,denominar ou apelidar alguém de preto ou branco, sem que seja para designar a raça que os caracteriza:” negra e branca”certamente fere a dignidade da pessoa humana.
Neste caso se tratando de matéria de informação, deve a redacção do nosso portal do jornal F8 ser mais sensível e menos emotiva, salvaguardando seriamente o respeito e dignidade que a matéria retrata.
Com esta humilde e sincera contribuição, solicito a exma direcção do portal do jornal F8, que se digne em mandar rectificar ou corrigir o título desta matéria,que supostamente deveria exaltar a dignidade da raça negra e não fomentar a humilhação da nossa raça afrontando as outras, independentemente das origens e nacionalidades.
A dignidade humana está acima da luta apartidária, por isso devemos respeitar o próximo como a nós mesmos, para que efectivamente sejamos diferentes de todos aqueles a quem criticamos.
Abraço a todos.
Obrigado pela sua opinião. Deixe-nos, contudo, dizer-lhe o seguinte: Nos EUA – por exemplo – a palavra “negro” passou a ser “black” e ultimamente “afro-americano”. Em Angola, 40 anos depois da independência, vive-se uma outra espécie de colonialismo em que o regime divide os angolanos em dois grupos. Os negros, que são a elite do poder, e os pretos, que são os restantes. Para estes a independência ainda não chegou. O título desta matéria evidencia e reflecte exactamente essa situação. Não está em causa a dignidade humana. Poder-se-ia dizer que somos todos humanos embora, por força de alguns,uns sejam mais humanos do que outros.
Abraço e, mais uma vez, obrigado pela sua opinião.
Orlando Castro
Preta?
Isso nem é um termo correto para ser utilizado, só pessoas baixas para dizer isso. Somos todos iguais aos olhos de Deus independentemente da raça, Não há diferenças entre nos mentaliza isso.
Sugerimos que leia (e entenda) as explicações dadas a comentários anteriores.
Preta? Racista e xenófobo é você. Porque não se refere à senhora como Angolana ou africana natural de……. Preta? Venha a Portugal e chame preto a uma pessoa de raiz africana e vai ver o que lhe acontece.
E diz que em Portugal existe xenofobia lol. Boa meu, vai mas é tirar o curso de jornalismo de novo.
No meu caso, costumo dizer que sou branco por fora e preto por dentro. Vou então alterar e substituir o preto por negro. Pouco importa se, na Angola profunda, o sentimento é de que os negros são os que estão no poder e que os pretos são os que continuam nas lavras à procura de mandioca para alimentar os filhos famintos. Se calhar deveríamos abolir do dicionário a palavra preto, explicando aos pretos das lavras que eles são também negros. Mas acrescentando que uns são mais negros do que outros.
Orlando Castro
A mulher foi convidada porque, supostamente, é competente, não porque é preta. Focar esse ponto vezes sem conta aludindo a um nebuloso fantasma preconceituoso e chamando ao barulho um trauma pós-colonial que Angola tem e teima em não resolver, é racismo na sua forma mais pura. Só não vê quem não quer.
Caro JC e JG
Aceito a legitimidade de vossas preocupações . Estamos numa revolução de conceitos. Se Francisca Van Dunem fosse negra seria complexada e não se esmeraria academica e profissionalmente. Ela assume a sua plenitude e com isso faz do marido um incentivo e não se colocou a reboque da sua notariedade, tão pouco optou por abraçar as mordomias que o regime negro de Angola lhe concederia para branquear o assassinato do seu irmão. Ele optou por trilhar, na adversidade, mas com dignidade o seu chão. Abraçou Portugal, que a adoptou na cidadania do seu ser e forjou-se como profissional portuguesa que é pese ter nascido em Angola. Caros JC e JG se Chica estivesse em Angola com a independência, competência e isenção que norteia nos seus actos, acreditem, os negros no poder, já a tinha, complexadamente, prendido, torturado e assassinado, como fizeram com seu irmão, José Van Dunem e cunhada Sitta Valles e agora prendem os jovens por lerem um livro sobre ditadura e absolvem um assassino, que matou um jovem que estava a colar cartazes do seu partido a CASA CE. Pois aqui a expressão não é por ser chique, mas sociologicamente, realista e contextual. No mais, sofismas não se discutem.
Um abraço do chefe Indigena
William Tonet