MONDLANE ARRASA PAULO RANGEL

“O ministro Paulo Rangel mentiu ao mundo.” Venâncio Mondlane desmente contactos do ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros de Portugal com o Vaticano. Paulo Rangel, obviamente, mantém o que disse.

Venâncio Mondlane acusa Paulo Rangel de ter mentido, quando disse numa entrevista à TSF que tem mantido contactos discretos com o Vaticano sobre a situação em Moçambique. Em declarações à Rádio Observador, o candidato presidencial moçambicano oficialmente derrotado revela que contactou directamente o cardeal D. Matteo Zuppi, presidente da Conferência Episcopal italiana e um aliado muito próximo do Papa em quem ele confia como seu enviado nalgumas situações internacionais, incluindo agora a situação em Moçambique.

“Procurei saber junto de D. Matteo se alguma vez o ministro dos Negócios Estrangeiros tinha contactado o Vaticano e ele disse que absolutamente isso nunca aconteceu. Portanto, o ministro dos Negócios Estrangeiros mentiu aos portugueses e mentiu ao mundo”, acusa Venâncio Mondlane.

“Sinto muito. Notei que ele deu aquela entrevista como resultado de uma pressão muito forte, ele precisava de um expediente de autojustificação e, para tal, acabou até dizendo coisas que são inverdades”, reforça o candidato, que regressou a Maputo na semana passada e se autoproclamou “presidente do povo”, invocando que os resultados oficiais terão resultado de fraudes no processo eleitoral.

Venâncio Mondlane ficou ainda mais desagradado depois de saber que o ministro iria à tomada de posse de Daniel Chapo, agendada para esta quarta-feira em Maputo. Considerou que se trata de “uma pequena afronta” ao Parlamento português e insistiu: “A credibilidade de Paulo Rangel está cada vez mais colocada em causa.”

“O Parlamento aprovou uma resolução que recomenda que o Governo não reconheça os resultados. Se o faz, significa que o Governo está neste momento a demonstrar que quer estar de costas voltadas para o Parlamento”, afirmou Venâncio Mondlane à Rádio Observador.

Caso o ministro dos Negócios Estrangeiros peça um encontro, Venâncio Mondlane admite recebê-lo: “Nesta altura estou a receber a todos. Desde as raposas até aos cordeiros”. Mas não poupará nas críticas a Paulo Rangel: “Acho que devo dizer-lhe na cara todas as percepções que estou a ter aqui sobre o que eu acho que foi negativo da parte dele”.

Na verdade, Portugal vai legitimar a fraude eleitoral em Moçambique estando representado na posse de Daniel Chapo como novo Presidente de Moçambique pelo ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel.

Portugal, o país colonizador que – como fez em Angola com o MPLA – ofereceu Moçambique à Frelimo, disse que “tomou nota da proclamação do Conselho Constitucional de Moçambique sobre a conclusão do processo eleitoral, que indica Daniel Chapo como Presidente eleito de Moçambique”.

Portugal acocora-se desde – é claro – que Moçambique fique nas mãos da Frelimo e Angola nas do MPLA. Seria diferente e, de facto, nas eleições tudo foi diferente, mas a fraude permitiu que tudo continuasse na mesma, tal como planeado por Portugal em 1975.

“O Governo português está disponível para trabalhar com o novo Presidente e com o Governo moçambicanos em prol do reforço dos laços estratégicos entre os dois países, na continuidade dos laços históricos de amizade entre os dois povos. Reafirmamos a vontade de Portugal em se manter como parceiro-chave, contribuindo para o progresso sustentável e a paz em Moçambique. Portugal é, e deseja continuar a ser, o principal parceiro de Moçambique em matéria de cooperação internacional”, dizem – com a monumental e criminosa hipocrisia que os caracteriza – o Executivo de Luís Montenegro e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Lisboa acrescenta que “Portugal lamenta profundamente os episódios de violência que marcaram o período pós-eleitoral em Moçambique, causando inúmeras perdas humanas e intensificando as tensões políticas e sociais no país. A paz e a estabilidade social em Moçambique são valores inestimáveis, que devem ser salvaguardados na fase de transição política que agora se inicia”. Traduzindo: a Frelimo é Moçambique e Moçambique é da Frelimo.

“Esperamos que o novo ciclo governativo reflicta um compromisso de inclusão, em espírito de diálogo, capaz de responder aos desafios sociais, políticos e económicos que o país enfrenta. Torna-se por isso essencial que as novas autoridades moçambicanas possam iniciar quanto antes um debate político inclusivo com as forças da oposição e representantes da sociedade civil que reforce a coesão nacional, garanta a estabilidade social e fomente o progresso e desenvolvimento do povo moçambicano. Nesse debate, afigura-se importante considerar a reforma do processo eleitoral moçambicano, seguindo as recomendações da União Europeia e da CPLP”, diz Portugal, julgando que os moçambicanos são matumbos. Tal como os angolanos, somos pobres mas não somos matumbos e temos memória.

Apesar das múltiplas vigarices reveladas por muitos observadores internacionais, as ordens eram claras. Assim, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) moçambicana anunciou a vitória de Daniel Chapo (Frelimo), e Portugal – tal como o MPLA – abriu as garrafas de champanhe.

O processo eleitoral de 2024 foi fortemente criticado por observadores internacionais, que apontam várias e graves irregularidades. Recorde-se que a Missão de Observação Eleitoral da União Europeia (MOE UE) às eleições gerais moçambicanas afirmou que constatou “irregularidades durante a contagem e alterações injustificadas” dos resultados eleitorais que precisam de ser esclarecidas.

“A MOE UE constatou irregularidades durante a contagem e alterações injustificadas dos resultados eleitorais a nível das assembleias de voto e a nível distrital”, lê-se num comunicado divulgado pelos observadores.

A Missão de Observação Eleitoral da União Europeia iniciou as suas actividades em Moçambique em 1 de Setembro de 2024 e destacou 179 observadores para o dia das eleições, tendo emitido uma declaração preliminar em 11 de Outubro, sobre o processo eleitoral.

“A MOE UE continuou a observar o processo eleitoral, embora os observadores da UE tenham sido impedidos de observar os processos de apuramento em alguns distritos e províncias, bem como a nível nacional”, lê-se.

No comunicado acrescenta-se que “como medida para contribuir para a confiança e integridade do processo eleitoral”, a MOE UE “reitera o seu apelo aos órgãos eleitorais para que conduzam o processo de apuramento de uma forma transparente e credível, assegurando a verificação dos resultados das mesas de voto”.

“A publicação dos resultados desagregados por mesa de voto não é apenas uma questão de boas práticas, mas também uma forte salvaguarda para a integridade dos resultados”, declarou a chefe da missão, Laura Ballarín, citada no comunicado.

“Tendo em conta as tensões sociais e a violência eleitoral registadas nos últimos dias, a MOE UE reitera a sua condenação dos assassinatos de Elvino Dias e Paulo Guambe [advogado de Venâncio Mondlane e mandatário do Partido Podemos, que o apoia, respectivamente], e apela à máxima contenção de todos e ao respeito pelas liberdades fundamentais e direitos políticos”, acrescenta-se no comunicado.

A MOE UE afirma ainda “que é da responsabilidade da administração eleitoral esclarecer as irregularidades e do Conselho Constitucional resolvê-las durante o processo de validação dos resultados, no respeito pela vontade dos eleitores”.

Folha 8 com Observador

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