ZORRINHO ELOGIA (DES)GOVERNANÇA DO MPLA

O papel de Angola na cooperação, solidariedade regional e promoção do desenvolvimento sustentável foi destacado, em Luanda, pelo co-presidente da Assembleia Parlamentar Paritária (UE), o socialista português Carlos Zorrinho, na abertura da Assembleia Parlamentar Paritária da OEACP-UE.

Por Orlando Castro

Carlos Zorrinho, deputado português, realçou, igualmente, o Acordo de Facilitação de Investimento Sustentável, recentemente assinado entre a União Europeia e Angola, resultante do empenho da organização parlamentar em criar parcerias para o progresso.

“É um acordo que incorpora uma visão comum para promover o investimento, o crescimento económico e a solidariedade ambiental, contribuindo activamente para a vontade expressa por Angola de diversificar a sua economia”.

Durante a sua intervenção no Parlamento angolano, no acto que contou com a presença da vice-Presidente da República, Esperança da Costa, o deputado socialista apontou outros ganhos já conquistados pela organização, além dos sectores do petróleo e do gás, na sequência do consentimento do Parlamento Europeu para a ratificação do texto pela União Europeia, na sua sessão plenária de 7 de Fevereiro.

“Espero que está boa prática possa servir de exemplo para futuras colaborações entre a União Europeia e os Estados da Organização África, Caraíbas e Pacífico, e permitir mais e mais sustentáveis investimentos em áreas como a energia verde, as cadeias de valor agro-alimentar, a inovação digital, as pescas, a logística e as matérias-primas essenciais, apenas para dar alguns exemplos”.

Na primeira sessão da Assembleia Paritária entre a Organização dos Estados de África, Caraíbas e Pacífico (OEACP) e a União Europeia (UE), Carlos Zorrinho lembrou aos parlamentares a necessidade da materialização do Acordo de Samoa, que anuncia uma nova era na colaboração e parceria entre as nações que o integram.

“É uma era de compromisso com o progresso mútuo, o desenvolvimento sustentável e a prosperidade partilhada. Hoje, quando nos reunimos ao abrigo deste acordo histórico, creio poder falar em nome de todos ao afirmar que o fazemos, e o fazemos com muita determinação”, sublinhou.

A organização, disse Carlos Zorrinho, conta agora com uma Assembleia Parlamentar Paritária e três Assembleias regionais grandes a assumirem-se como plataformas de debate, diálogo, de aprofundamento da compreensão mútua, mas também do escrutínio e do aconselhamento na definição das prioridades das políticas e dos projectos.

BAJULAR E ELOGIAR, ELOGIAR E BAJULAR

Alguém alguma vez ouviu Carlos Zorrinho dizer que 68% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é das mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Alguém o ouviu dizer que apenas 38% da população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico?

Alguém alguma vez ouviu Carlos Zorrinho dizer que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade? Alguém o ouviu dizer que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?

Alguém alguma vez ouviu Carlos Zorrinho dizer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos? Alguém os ouviu dizer que, em Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos?

Alguém alguma vez ouviu Carlos Zorrinho dizer que, em Angola, o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder?

Alguém alguma vez ouviu Carlos Zorrinho dizer que Angola é um dos países mais corruptos do mundo e que tem 20 milhões de pobres?

Ninguém ouviu Carlos Zorrinho dizer qualquer coisa que possa irritar o partido que desgoverna Angola há 48 anos. Dir-se-á, e até é verdade, que esse silêncio é condição “sine qua non” para cair nas graças dos donos do dono do nosso país, até porque todos sabemos que nenhum negócio se faz sem a devida autorização de João Lourenço.

Os angolanos da casta superior que dirige o reino há 48 anos (o MPLA) acreditam que se justifica que Carlos Zorrinho agradeça (mesmo que a despropósito) ao Presidente João Lourenço. Se o MPLA dizia que José Eduardo dos Santos era o “escolhido de Deus”, há políticos portugueses que devem dizer que João Lourenço é o próprio “Deus”. Portanto, por acção ou omissão, eles dizem.

Por uma questão de memória e de respeito pela verdade, recorde-se que, em 2012, o líder da bancada do PS mostrou que o seu partido é especialista em confundir a estrada da Beira com a beira da estrada.

Carlos Zorrinho, na linha de Francisco Assis e Sérgio Sousa Pinto, defendeu que o deputado socialista Ricardo Rodrigues demonstrou “sentido de responsabilidade” ao demitir-se da direcção do grupo parlamentar, depois de ter sido condenado num processo em que roubou os gravadores aos jornalistas da revista Sábado.

Carlos Zorrinho deveria defender que Ricardo Rodrigues merecia uma medalha pelos bons serviços prestados ao partido e não, num manifesto acto de hipocrisia política, renunciar também às suas funções de representação da Assembleia da República no Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) e ao lugar de suplente no Conselho Superior de Informações.

“Estamos perante uma posição do deputado [Ricardo Rodrigues] que fez aquilo que se impunha e que nós registamos como mais uma demonstração de grande sentido de responsabilidade”, declarou o presidente do grupo parlamentar do PS.

Ora, ora! O que Ricardo Rodrigues precisava era – na altura – que o PS se unisse para o ajudar a chegar mais longe, eventualmente a presidente da ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social), e não que Zorrinho elogiasse a sua atitude.

Carlos Zorrinho esqueceu-se que Ricardo Rodrigues apenas deu mais uma demonstração inequívoca de que em Portugal não há falta de liberdade… nem que seja para afanar os gravadores dos jornalistas?

Carlos Zorrinho não se recorda que Ricardo Rodrigues explicou na altura que “tomou posse”, de forma “irreflectida”, dos dois gravadores porque foi exercida sobre ele uma “violência psicológica insuportável”?

Carlos Zorrinho esqueceu-se que, na própria Assembleia da República, Ricardo Rodrigues, acompanhado pelo então líder parlamentar e posterior candidato à liderança do partido, Francisco Assis, e por um outro membro da direcção do grupo, Sérgio Sousa Pinto, justificou a sua “tomada de posse” (não como deputado mas como tomador de posse de gravadores alheios) pelo “tom inaceitavelmente persecutório” das perguntas e pelos “temas e factos suscitados, falsos e mesmo injuriosos”?

“Porque a pressão exercida sobre mim constituiu uma violência psicológica insuportável, porque não vislumbrei outra alternativa para preservar o meu bom nome, exerci acção directa e, irreflectidamente, tomei posse de dois equipamentos de gravação digital, os quais hoje são documentos apensos à providência cautelar”, justificou na altura Ricardo Rodrigues, certamente convicto que este ou qualquer outro Zorrinho estaria sempre solidário consigo.

Carlos Zorrinho deveria, aliás, reafirmar que foi graças também a esta original forma de “tomar posse” do que é dos outros, que Portugal, é um exemplo em matéria de liberdade de imprensa…

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