QUEM SE RECORDA LEVANTE A MÃO (SE O CHEFE DEIXAR)

Recordas-te, meu velho, dos tempos em que vinhas de Lisboa e nos encontrávamos no Hotel Tuela, no Porto, para conversar sobre a nossa terra, umas vezes a sós, outras com o Alcides, com o Jeremias ou com o Tony? Recordas-te dos tempos em que éramos dos primeiros a saber quando algum de nós vinha da banda para nos contar como iam, ou não iam, as coisas?

Por Orlando Castro

Recordas-te dos tempos em que de vez em quando vocês mandavam de Lisboa alguma ajuda para pôr na linha os camaradas que nos queriam encostar à parede?

Recordas-te dos tempos em que te deslocaste propositadamente cá acima para me dar um abraço de solidariedade quando soubeste que eu recusara uma enormíssima promoção que tinha como contrapartida abdicar das nossas ideias e ideais?

Recordas-te dos tempos em que jantámos aqui no Porto com o nosso mais Velho e ele também me disse que valia a pena recusar promoções quando elas implicam a perda da consciência?

Recordas-te dos tempos, estes mais recentes, quando o Alcides e o Paulo tinham regressado há pouco tempo da mata e no átrio do Porto Palácio Hotel me deram um forte, demorado e comovido abraço?

Esse Velho amigo recordava-se disto e de muito mais. E nem sequer algumas “violentas” discussões entre nós afectaram a memória de ambos, nem a transformaram em vagas ideias selectivas. Uma delas, recordo, teve a ver com o comportamento do então representante da UNITA em Portugal, Isaac Wambembe, e de Carlos Lopes, então secretário da Economia e das Novas Tecnologias do então delegado da UNITA.

Em Julho de 2012, o ex-embaixador da UNITA em Portugal e Espanha, Isaac Wambembe, anunciou em Luanda a sua desvinculação deste partido e, é claro, o seu apoio ao MPLA.

Isaac Wambembe disse que não se revia na forma como o presidente da organização, Isaías Samakuva, tinha conduzido a organização e também “nos maus-tratos de que os quadros são alvo”.

Falando em conferência de imprensa, o médico de profissão, manifestou a sua disponibilidade para servir as comunidades, colocando-se à disposição do Estado angolano.

“Representei o partido com toda dedicação e sofri a pior humilhação humana”, disse, frisando que depois dos acordos de paz do Luena, em 2002, todos os seus colegas da missão externa foram reinseridos nas embaixadas e noutras actividades, menos ele.
“Consciente da grande tarefa que todos os angolanos devem desempenhar para ajudar no desenvolvimento do nosso país, revejo-me no projecto de sociedade apresentado pelo MPLA”, destacando o programa de combate à fome, à pobreza e às grandes endemias, cujos resultados disse Isaac estarem reflectidos positivamente no seio das populações.

Quando, em Março de 2009, vi e ouvi a intervenção no programa “Prós e Contras”, da RTP, de Isaac Wambembe na sua qualidade de delegado/representante da UNITA em Portugal, escrevi que foi nítida a percepção de que algo ia mal, muito mal, pessimamente mal, no partido fundado por Jonas Malheiro Savimbi.

Apesar de o programa ter sido montado para, com uma ou outra excepção que confirmou a regra, ser mais uma montra de apologia, por vezes demasiado subserviente, do regime angolano, a oportunidade poderia e deveria ter sido aproveitada para mostrar a outra face de Angola.

Não foi isso que aconteceu. E como me diziam alguns portugueses que ao meu lado assistiram ao programa, para além de tudo ser bom em Angola — inclusive a corrupção —, ficou claro que a UNITA não era alternativa e que — cito um deles: “Se calhar até deveria ter tido bem menos do que os 10% de votos que teve nas legislativas”.

Como escrevi na altura, se Isaac Wambembe era o melhor que a UNITA tinha para chefiar uma delegação, ou uma representação, em Portugal, o melhor era Isaías Samakuva encerrar por falência intelectual e política essa representação.

Numa altura em que a UNITA precisava de se reafirmar como séria e competente alternativa ao MPLA, assistiu-se ao seu ébrio suicídio. Aguinaldo Jaime, representante oficial do Governo angolano no programa (todos os outros protagonistas eram representantes oficiosos), teve aliás a elevação ética de não amesquinhar o seu compatriota da UNITA, o que poderia facilmente fazer se tivesse dirigido qualquer questão a Isaac Wambembe.

O problema não foi — apesar de ter sido — o facto de Isaac Wambembe mostrar que não sabia o que ali estava a fazer. A assistência afecta ao MPLA teve múltiplos orgasmos quando viu que, apesar de não estar em condições físicas e mentais, Isaac Wambembe teimou em falar.

Nem mesmo a insistência de outros elementos afectos à UNITA evitou que Isaac Wambembe levasse à cena aquela burlesca tragicomédia que, por ser de tão fraca qualidade, até mereceu a comiseração do próprio Aguinaldo Jaime.

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