MAIS VALE TARDE… SE FOR PARA VALER

O activista e jornalista Rafael Marques acusou hoje o Presidente angolano (igualmente Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo), general João Lourenço, de ter iludido o país com falsas promessas, levando a sociedade do sonho ao desespero e passando de Messias a Judas em cinco anos.

O director do site Maka Angola, em que denuncia vários casos de corrupção, interveio hoje no III Congresso Internacional de Angolanística, em Lisboa, lembrando que João Lourenço chegou à presidência em 2017, após quase quatro décadas de José Eduardo dos Santos no poder, permitindo aos angolanos sonharem com a possibilidade de uma Angola melhor.

“Augurava-se, como primeiro passo de mudança e de liderança, a reforma do Estado e a implementação de um novo modelo de governação, assente na separação de poderes”, apontou.

No entanto, a realidade veio a desacreditar as promessas de início de mandato de Lourenço e gorou as expectativas da população, sobretudo no último ano, em que os alicerces necessários à edificação de quatro pilares estruturantes para o futuro de Angola “vêm sendo sistematicamente destruídos”.

Esses pilares são: uma liderança que promova e una o país e os cidadãos em torno do Estado-Nação, a estruturação do Estado de Direito, uma economia próspera e uma matriz de educação, saúde e justiça que sirva todos os cidadãos.

“E os angolanos, depois de tanto sonharem, entraram agora em desespero”, lamentou Rafael Marques.

“A desestruturação política, educativa e moral da sociedade gerou uma mentalidade em que a figura do bom pai de família não é distinta da do gatuno e em que não há separação entre Estado e governo, dever e obrigação, individual e colectivo”, criticou, sublinhando que a sociedade angolana, “na ausência de um sistema de valores colectivo tem procurado sempre um messias, que na verdade só existe na bíblia”.

Ao não cumprir o seu papel enquanto promotor desse processo social colectivo, continuou, João Lourenço abriu as portas à actual crise de liderança. “Só assim foi possível termos um Presidente que, em cinco anos, passou de suposto Messias a aparente Judas”, reiterou.

Rafael Marques lembrou que João Lourenço iniciou o seu primeiro mandato com uma certa abertura política e económica, bem como o famoso combate à corrupção, mas perdeu-se no caminho.

Mas, “o Presidente não soube, ou não quis, reformar-se a si mesmo, processo obrigatório tendo em conta que ele foi uma criação directa do velho regime de José Eduardo dos Santos”, disse, acrescentando que opera de forma semelhante ao seu antecessor.

Deu como exemplo a detenção de quatro activistas no passado fim-de-semana no Huambo sob o “esfarrapado argumento de incitação à rebelião”, que comparou com o célebre processo dos “15+2” (um grupo de activistas angolanos que foram presos em Luanda, em 2015, quando discutiam um livro sobre métodos pacíficos de protesto).

“O actual Governo angolano, tal como nas longas décadas do regime de José Eduardo, continua a não se reger pelo princípio básico de qualquer governo democrático: servir o povo”, acusou o director do Maka Angola, afirmando que o Presidente angolano está cada vez mais “dependente do uso da força e da arrogância para manter o poder”.

Outro dos exemplos que deu, a propósito do desmantelamento do Estado de Direito foi a nomeação na semana passada de Carlos Alberto Cavuquila, condenado pelo Tribunal de Contas por desvio de fundos públicos.

“Ou João Lourenço perdeu a cabeça, ou tem uma agenda de hostilidade contra os angolanos, fazendo das instituições do Estado meros expedientes pessoais”, disse o activista, apontando a “mão do presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo”, que tem sido também alvo de denúncias de corrupção, por detrás desta nomeação.

Para Rafael Marques, “com a cobertura dos comportamentos prepotentes de Joel Leonardo, João Lourenço atravessou os limites do Estado de Direito e transformou-se ele próprio numa ameaça”.

No campo da economia, o activista falou da falta de liberdade económica efectiva, associada à insegurança jurídica e enriquecimento ilícito, lamentando que não tenha sido aproveitada a curta janela de oportunidade oferecida com a subida do preço do petróleo.

A decadência do ensino foi outro dos aspectos críticos que referiu, concluindo que “Angola continua adiada, por falta de uma transição real que devolva o poder aos cidadãos”.

Passar os jacarés do Kwanza para o Cunene não os torna vegetarianos, afirmou o Folha 8 várias vezes ao longo de vários anos. Outros só agora chegaram a essa conclusão. Mais vale tarde…

De facto, João Lourenço mostrou a todos (os que querem ver) que acabar com a corrupção (roubar o que é de todos para benefício de alguns é corrupção) no reino do MPLA continua a ser como acabar com as vogais na língua portuguesa. Essa peregrina ideia de querer pôr, em Angola, os corruptos a lutar contra a corrupção é digna dos bons alunos que o regime do MPLA formou e formatou ao longo de quase 48 anos.

O combate à corrupção em Angola apresenta resultados mais baixos do que seria de esperar? Essa de chamar combate à fantochada do reino do MPLA, desde 2017 sob o comando de um puro exemplar do que é o MPLA, João Lourenço, não passa de uma piada de belo efeito mediático.

O combate à corrupção não passa de um nado-morto porque, a existir de facto, levaria ao confisco de todos os bens do MPLA/Estado, ele próprio gerado, parido e alimentado pela corrupção.

Nenhum Governo angolano (sendo que todos eles foram do MPLA) até hoje estabeleceu, objectivamente, uma política de combate à corrupção, limitando-se apenas a enumerar um conjunto de considerandos vagos, de intenções simbólicas, de formas eufemísticas que mais não são do que atestados de menoridade a todos nós.

Mas do que é que estávamos à espera? Que os corruptos lutassem contra a corrupção que, aliás, é uma das suas mais importantes mais-valias? Mudar alguns corruptores não significa combater a corrupção porque esta é, há 48 anos, a mais segura estratégia para se ser milionário, para se ser dono de escravos.

Os angolanos, na generalidade e em teoria, são contra a corrupção, mas no dia-a-dia acabam por pactuar (até por questões de mera sobrevivência) com ela. Por isso continuamos sem saber como é que se pode combater algo que, em sentido lato, já é uma instituição identitária e genética do regime e do partido que o forma, o MPLA. Falha nossa, certamente.

João Lourenço já disse que viu roubar, participou nos roubos, beneficiou dos roubos. No entanto, garante que apesar disso tudo não é ladrão… Haverá melhor definição do que é há 48 anos o MPLA/Estado?

João Lourenço esbanja para seu proveito próprio (e respectivo séquito bajulador) dinheiro que é tirado do erário público? Esbanja. A Angola de João Lourenço é um dos países mais corruptos do mundo e com lugar de destaque mundial a nível da mortalidade infantil? É.

Na Angola de João Lourenço, 68% da população é afectada pela pobreza, a taxa de mortalidade infantil é das mais altas do mundo, apenas 38% da população tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico.

Na Angola de João Lourenço apenas um quarto da população tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade, 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, há falta de pessoal e carência de medicamentos.

Na Angola de João Lourenço 45% das crianças sofrem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos, que a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja o cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos.

Na Angola de João Lourenço o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder.

Folha 8 com Lusa

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