A Frente para a Libertação do Estado de Cabinda – Forças Armadas de Cabinda (FLEC-FAC) reivindicou hoje a morte de quatro soldados das Forças Armadas Angolanas (FAA) na região de Buco-Zau, Cabinda. Registe-se que, segundo os donos de Angola, em Cabinda não há guerra…
Em comunicado, o braço armado do movimento independentista de Cabinda indica que os quatro soldados foram mortos ao início da manhã de hoje quando uma patrulha das FAA se deparou com um grupo de combatentes da FLEC-FAC na área de Micuma, na região de Buco-Zau.
“A FLEC/FAC recolheu os corpos dos quatro soldados das FAA mortos, assim como recuperou quatro armas de assalto AK-47”, adianta o comunicado.
A FLEC/FAC reitera que “Cabinda é um território em guerra” e que as campanhas de desinformação das autoridades ligadas a Luanda “põem em perigo a vida dos estrangeiros no território”.
“O Chefe da Casa Militar do Presidente da República de Angola, deve relatar a verdade à comunidade internacional sobre a situação de segurança no Protectorado Português de Cabinda”, diz a FLEC/FAC, que exige que as empresas exploradoras de ouro a operar na região de Buco-Zau, na área de Mongo Mbucuco, “suspendam imediatamente as suas actividades ilegais”.
De acordo com a FLEC/FAC, a presença em Cabinda dessas empresas “é contrária à proibição de toda a exploração na floresta do Maiombe”, tanto mais que “é estritamente proibida a circulação de qualquer veículo motorizado na floresta de Maiombe”.
A organização adverte que “qualquer presença de tractores e camiões, no presente e no futuro, ilegalmente autorizada pelos angolanos, vai ser severamente sancionada”. Avisa a propósito que todas as viaturas que sejam escoltadas por tropas angolanas serão um alvo militar para as forças da FLEC/FAC.
“Nós não podemos garantir a segurança daqueles que exploram as nossas riquezas. Cabinda é zona de guerra embora não tenhamos a cobertura mediática”, finaliza o tenente-general Ricardo Danda wa Danda das FAC.
A FLEC mantém há vários anos uma luta armada pela independência do território, de onde provém grande parte do petróleo angolano, alegando (e bem) que o enclave era um protectorado português – tal como ficou estabelecido no Tratado de Simulambuco, assinado em 1885 – e não parte integrante do território angolano.
O Governo angolano recusa reconhecer a existência de soldados mortos resultantes de acções de guerrilha dos independentistas, ou qualquer situação de instabilidade naquela província do norte de Angola, sublinhando sempre a unidade do território.
Seja qual for o ponto de vista da análise, é matéria de facto que Portugal honrou desde 1885 até 1974 o compromisso assumido com os cabindas, razão pela qual em matéria constitucional incluiu Cabinda na Nação portuguesa, fazendo-o de forma autónoma e bem diferenciada de outras situações coloniais, como foi o caso de Angola.
De facto, e ao contrário das teses unilaterais dos descolonizadores que tomaram o poder em Portugal em 1974, no artigo da Constituição Portuguesa referente à Nação Portuguesa sempre constava, sempre constou , que o território de Portugal era, na África Ocidental, constituído pelos Arquipélagos de Cabo Verde, de São Tomé e Príncipe, Forte de S. João Baptista de Ajudá, Guiné, Cabinda e Angola.
Na Lei Orgânica do Ultramar (designação que substituiu a referência às colónias), de 1972 (portanto, dois anos antes da Revolução de 1974), diz-se de forma clara que o território português se compunha das províncias com a extensão e limites que constarem da lei e dos tratados (Simulambuco, obviamente) ou convenções internacionais aplicáveis.
Apesar de alguma amnésia colectiva, sempre apetecível quando toca a não assumir responsabilidades, muitas das gerações que ainda hoje estão no activo da política portuguesa, aprenderam a completa e inequívoca separação, tanto jurídica como administrativa, que a Constituição reconhecia com força de lei para o território de Cabinda.
Recorde-se, sobretudo aos que teimam em que uma mentira dita muitas vezes acaba, mais cedo ou mais tarde, por se tornar verdade, que até meados do século passado, por exemplo, quem viajasse de avião ou navio e que passassem por Cabinda a caminho de Luanda, ou ao contrário, passavam por uma alfândega, o que só é entendível à luz de serem dois territórios distintos.
Aliás, o Governador-Geral de Angola ou um Secretário Provincial sempre de deslocaram a Cabinda na data do aniversário do Tratado para presidir, junto ao monumento de Simulambuco, às cerimónias que reforçavam e validavam o que fora assinado pelas autoridades portuguesas de então.
É certo, igualmente, que em 1955, para facilitar a administração do território, Cabinda foi considerada como um distrito de Angola. Apesar disso, e reconhecendo que de facto se tratava de um mero expediente administrativo, Portugal reafirmava que Cabinda não era Angola, citando a esse propósito que se mantinha o articulado que constava da Constituição.
O general Silvino Silvério Marques, que foi Governador-Geral de Angola, entre 1962 e 1965, afirma que o ministro Silva Cunha, (a propósito da preparação do Estatuto Político-Administrativo da Província de Angola de 1963) por ordem do chefe de Governo, António de Oliveira Salazar, indagou o Governador-Geral de Angola no sentido de saber se concordava que Cabinda, administrada então como distrito de Angola, passasse a ter um estatuto especial de autonomia.
Ouvido o Conselho Económico-Social de Angola, Silva Cunha recebeu uma resposta negativa, situação que assim se manteve durante os 13 anos da guerra colonial.
Ou seja, ficou visível que a administração de Cabinda como um distrito de Angola era uma situação meramente burocrático-administrativa, nunca tendo Portugal alterado o espírito a e letra do Tratado de Simulambuco.
Em tudo, aliás, a situação de Cabinda relativamente a Angola era na altura da Revolução de 1974 similar, ou até coincidente, com a dos protectorados belgas do Ruanda e do Burundi em relação ao Congo Belga. Estes tornaram-se independentes…
Folha 8 com Lusa
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