O Governo do MPLA, responsável pela existência de 20 milhões de pobres em Angola, lançou hoje a segunda edição do Prémio Nacional dos Direitos Humanos, para a nomeação de quatro categorias, cuja inscrição decorre até 31 de Janeiro, informou hoje o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos.
Segundo a secretária de Estado para os Direitos Humanos, Ana Celeste Januário, em Abril do próximo ano serão anunciados os vencedores dos prémios nas categorias personalidade do ano (provavelmente o Presidente da República, João Lourenço), pesquisa em direitos humanos (provavelmente o Presidente do MPLA, João Lourenço), acções comunitárias e humanitárias (provavelmente o Titular do Poder Executivo, João Lourenço) e cultura da paz e da cidadania (provavelmente o herói nacional do MPLA responsável pelos massacres de 27 de Maio de 1977, Agostinho Neto).
A governante referiu que o valor dos prémios é mais simbólico do que material “porque trata-se de um prémio em matéria de direitos humanos”.
“É assim que os nomeados terão direito a um troféu, uma estatueta, como símbolo do prémio, uma gratificação pecuniária, um certificado de premiação para cada categoria, assinado pelo ministro da Justiça e dos Direitos Humanos”, informou a secretária de Estado, sublinhando que o valor pode variar entre 300 mil kwanzas (640 euros) e um milhão de kwanzas (2.135 euros).
A governante do MPLA sublinhou que há limitações à candidatura de entidades públicas, “porque a ideia do prémio é sobretudo premiar acções da sociedade civil”, sendo outra limitação a relevância temporal dos temas a serem apresentados.
“Por exemplo, se um cidadão tem uma pesquisa feita em 2010 e que já não tenha uma relevância em 2022 ou em 2023, provavelmente, o júri não iria considerar ou estaria numa avaliação baixa, sendo que estamos em 2022 e deve haver alguma relevância para o momento”, explicou com um raro brilhantismo intelectual Ana Celeste Januário.
Para as candidaturas está disponível o endereço electrónico premios@minjudh.gov.ao para qualquer cidadão que queira “candidatar-se a si pessoalmente ou alguma instituição, uma pessoa colectiva, uma associação ou uma pessoa individual que conheça, que mereça o mérito”.
Essa de “candidatar-se a si pessoalmente” é digna de um prémio. Isto porque pode “candidatar-se a si pessoalmente” na pessoa de João Lourenço, por exemplo.
Para as regiões onde não é possível submeter a candidatura por endereço electrónico, o acto pode ser realizado através da sede dos comités locais dos direitos humanos, estando o anúncio dos vencedores previsto para Abril do próximo ano.
Na primeira edição, criado em 2020 por decreto presidencial, foi vencedor na categoria de personalidade do ano Maria Teresa Manuela, comissária africana dos Direitos Humanos e dos Povos, pelo seu trabalho desenvolvido em matéria dos direitos humanos em Angola e além-fronteiras.
Nas categorias da pesquisa e da cultura da paz e cidadania, os dois prémios foram vencidos pelo Centro de Direitos Humanos e Cidadania da Faculdade de Direito da Universidade Católica de Angola, pelo trabalho em matéria científica e de promoção de paz, que desenvolveram ao longo do período.
A categoria de acções comunitárias e humanitárias teve como vencedora a Associação de Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), com um projecto desenvolvido no sul de Angola.
Integram o corpo de júris instituições parceiras que não estão necessariamente vinculadas às instituições do Estado, frisou a governante, nomeadamente o Sindicato dos Jornalistas de Angola, o Conselho de Igrejas Cristãs de Angola ou o Sindicato Nacional de Professores do Ensino Superior.
Os júris também contam com a presença dos mais resistentes representantes dos angolanos que há mais tempo conseguem viver sem… comer. Até agora os júris anteriores não conseguiram contar com a presença desses cidadãos porque – consta – quando estavam quase, quase mesmo, a saber viver sem comer… morreram.
GRAVES VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS
As forças de segurança angolanas cometeram graves violações dos direitos humanos, incluindo dezenas de execuções ilegais, com recurso à força excessiva e desnecessária. Não. Desta vez quem o diz não é o Folha 8. É o relatório da Amnistia Internacional (AI) 2021-2022, que acrescenta que a “a polícia violou os direitos à liberdade de expressão e manifestantes pacíficos enfrentaram prisões e detenções arbitrárias”. Tudo normal, portanto.
Crise económica e social e violações de direitos humanos alimentaram o “aumento de protestos em todo o país”, enquanto “as forças de segurança intensificaram as operações em todo o país visando impedir as manifestações”, diz a AI.
Uma nota de destaque vai para as comunidades pastoris que tiveram as suas terras desapropriadas para uso da agricultura comercial e enquanto, diz a AI, “o Governo respondeu inadequadamente para garantir comida e água para as vítimas de desapropriação de terras, seca e deslocamentos”.
As províncias do Cunene, Huíla e Namibe continuaram a enfrentar condições climáticas extremas, sintomáticas das mudanças climáticas e “a seca prolongada resultou em escassez de comida e água”.
A organização de defesa dos direitos humanos conclui que, “consequentemente, muitas pessoas e gado morreram, enquanto outras procuraram refúgio na Namíbia”.
O relatório 2021/2021 revela que o “desvio de fundos estatais reduziu a capacidade do Governo em aliviar as dificuldades económicas generalizadas e lidar com o sector de saúde que enfrentou muitas dificuldades”.
Neste aspecto, os relatores da AI indicam que a Covid-19 e as suas restrições agravaram os efeitos de décadas de serviços subfinanciados.
“Um clamor público do Sindicato dos Médicos ficou sem resposta”, segundo a AI, que confirma que “em média, dezenas de pessoas morreram todos os dias em Hospitais de Luanda”. É claro que os altos dignitários do regime se tiverem uma bitacaia vão aos hospitais europeus ou norte-americanos.
No capítulo da liberdade de expressão, além da repressão a activistas pacíficos, a AI diz que “os ataques à liberdade de imprensa continuaram ao mesmo tempo que as autoridades suspenderam as licenças dos canais de televisão privados”.
Morrem crianças à fome num país onde não há… fome
Numa altura em que até um relatório do Ministério da Saúde indicava que em 2020 duas crianças morreram por hora devido à fome, aumentando paralelamente o número de pobres que, antes da pandemia de Covid-19, eram 20 milhões, Angola corre o risco de se transformar num não-país ou de assistir a uma violenta implosão social.
Por muito que isso custe ao MPLA, o aumento de mortes de crianças por desnutrição (fome em bom português) no país deve-se à falta de políticas sociais sustentáveis e ao desprezo a que estão votadas as associações que trabalham com as comunidades mais empobrecidas.
Um relatório da Direcção Nacional de Saúde Pública (DNSP) sobre a desnutrição no país revelou que, nos últimos seis meses de 2020, em média, duas crianças com menos de cinco anos morreram em Angola a cada hora devido à fome. Certamente, como parece ser o desígnio nacional do MPLA (o único partido que governa o país há 47 anos), essas crianças faziam parte do tal colossal conjunto de angolanos que estariam a tentar aprender a viver sem… comer.
O relatório estimava que, no total, 8.413 crianças morreram de um universo de 76.480 que deram entrada nos hospitais públicos do país.
Para o líder da organização “Construindo Comunidades”, padre Jacinto Pinto Wacussanga, o quadro descrito pela DNSP “podia ser muito mais grave do que se pode pensar”. E não é por falta de alertas que o Presidente da República, igualmente presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo, olha para o lado e assobia. É, isso sim, pelas criminosas políticas económicas e sociais que o seu governo leva a cabo.
O conhecido padre dos Gambos, na Huíla, diz que por falta de comida, “as crianças da região são alimentadas com frutos silvestres e com raízes”. Será que João Lourenço sabe que são crianças angolanas? Será que sabe que lidera um país rico e que nem nos piores tempos da colonização acontecia tal coisa?
Segundo o documento da DNSP, do total dos menores que procuraram hospitais, 11 por cento faleceram, 11 por cento abandonaram o tratamento, seis por cento não tiveram resposta ao tratamento e 72 por cento tiveram alta.
Além da falta de alimentos em vários lugares, aquele órgão do Ministério da Saúde de Angola reconhecia a ocorrência de rupturas constantes de stock de produtos terapêuticos nos centros de saúde, atraso na planificação e o número insuficiente de pessoal capacitado para tratar a desnutrição aguda. É claro que os filhos dos dirigentes, e de outros ilustres acólitos do MPLA, vivem noutro mundo, eventualmente por pertencerem a uma casta superior e não terem o estatuto de escravos como acontece com estas crianças.
Em Abril de 2020, o secretário-geral das Nações Unidos, António Guterres, alertou no Relatório Global de Crises Alimentares que o mundo arriscava-se a derrapar para uma tragédia de fome “de proporções bíblicas” devido à pandemia de Covid-19.
“Se nada for feito, o número de pessoas em risco de insegurança alimentar aguda no mundo pode mesmo quase duplicar este ano e chegar aos 265 milhões de vítimas, face aos 135 milhões de 2019”, lia-se no documento que, numa lista de 35 países, alertava para a situação de Angola.
“A insegurança alimentar aumentou devido à seca nas províncias do sul e o afluxo de refugiados da República Democrática do Congo”, concluiu o relatório, que indicou que essa situação estava a afectar mais de 562 mil pessoas.
A ONU concluiu que “mais de 8 por cento das crianças com menos de cinco anos sofriam de desnutrição grave e perto de 30 por cento tinham problemas de crescimento”.
Recorde-se, mais uma vez e tantas vezes quanto for necessário, que o Presidente João Lourenço mentiu quando, em entrevista à RTP, disse que não havia fome em Angola, retratando que o que havia, apenas aqui ou ali, era uma ligeiríssima má-nutrição.
Provavelmente João Lourenço deve ter feito estas declarações à RTP depois de um frugal e singelo almoço, do tipo trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas, e várias garrafas de Château-Grillet 2005.
Compreende-se (isto é como quem diz!), que tenha arrotado esta (e outras) mentira em solidariedade com os nossos 20 milhões de pobres que, por sua vez, arrotam à fome e morrem a sonhar com uma refeição.
Em 2018, os próprios dados governamentais davam conta que Angola tinha uma taxa de desnutrição crónica na ordem dos 38 por cento, com metade das províncias do país em situação de “extrema gravidade de desnutrição”, onde se destacava o Bié, com 51%.
As províncias do Bié com 51%, Cuanza Sul com 49%, Cuanza Norte com 45% e o Huambo com 44% foram apontadas, na altura, pela chefe do Programa Nacional de Nutrição, Maria Futi Tati, como as que apresentavam maiores indicadores de desnutrição.
“São cerca de nove províncias que estão em situação de extrema gravidade de desnutrição, sete províncias em situação de prevalência elevada e duas províncias em situação de prevalência média”, apontou Maria Futi Tati, em Junho de 2018.
Um relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) indicava que, em Angola, 23,9% da população passava fome.
Em Angola, segundo a FAO, “23,9% da população passa fome”, o que equivale a que “6,9 milhões de angolanos não tenham acesso mínimo a alimentos”.
Falar hoje de fome em Angola é propagar uma mentira para a qual apenas contribuiu o anterior rei-marimbondo mas que, como garante João Lourenço, já “faz parte da história”. Vejamos. O ex-ministro da Agricultura e Florestas de Angola, Marcos Alexandre Nhunga, disse no dia 12 de Setembro de 2018 que o país tem alguma “população considerável que não passa fome como tal”, mas que “se encontra numa situação difícil”.
Sendo, na altura, Marcos Alexandre Nhunga ministro de João Lourenço, tinha com certeza toda a razão. Mesmo assim… “Não passa fome como tal”? Ou passa fome ou não passa, dizemos nós. Essa coisa de “fome como tal” não existe. Queria o ministro dizer que passa fome às segundas, quartas e sextas e come qualquer coisa às terças, quintas e sábados? E que “como tal” aos domingos faz jejum?