Os detentores do poder da República estão a regressar ao tempo das cavernas, comportando-se como siameses dos antigos senhores feudais, ao coisificarem o autóctone angolano. O Titular do Poder Executivo, que preside o Conselho de Ministros, quer, por isso aprovou, uma nova divisão administrativa do país, sem a existência de um estudo rigoroso, quanto às valências em termos de gestão, desenvolvimento sócio económico e humano, das actuais circunscrições territoriais do país.
Por William Tonet
Quando no longínquo ano de 1975, de bandeja, sem eleições democráticas, o MPLA/Agostinho Neto tomou o poder, traindo os Acordos de Alvor, com a cumplicidade dos portugueses capitães comunistas de Abril, capitaneados por Costa Gomes, Rosa Coutinho, Álvaro Cunhal, Almeida Santos, foi aí assassinado o sonho de um país, que deveria nascer, verdadeiramente, republicano. Infelizmente vingou a vertente mais danosa e dolosa do comunismo! Perdeu a cidadania! Para desgraça colectiva, o património mobiliário, imobiliário e financeiro passou sorrateiramente, sem escrutínio de terceiros, das autoridades coloniais para o MPLA, que os adoptou, não como pertença pública, mas partidocrata.
Aqui começou o grande vício da DIVISÃO, do de todos, para benefício exclusivo de UM, sendo o modelo da gestão financeira, a expressão mais abjecta e criminosa da privatização do dinheiro público.
A “corrupção militanton” é uma imagem de marca, alojada nos corredores do poder, com os mais altos índices de ladroagem institucional, iguais aos das organizações criminosas, que roubam aos pobres para alimentar os novos e selvagens “ricos ideológicos”. E uma das formas para a manutenção dos desvios é a criação de estruturas públicas fictícias, que não passam de verdadeiros “gasodutos financeiros”, para manutenção do poder.
Desde 11 de Novembro de 1975, a política implantada pelo MPLA, assentou na economia centralizada, destruindo todo o parque agro-industrial herdado, da economia de mercado colonial, impondo no campo social a divisão com a implantação das LOJAS DO POVO, para a maioria dos cidadãos pobres, abastecida com produtos de cesta básica e as LOJAS DOS DIRIGENTES, aprovisionadas com os melhores produtos, provenientes, exclusivamente, dos países considerados capitalistas (de dia, a propaganda do MPLA, mobilizava os populares, com a cartilha socialista, mas, à noite, negociava com o ocidente imperialista).
Esta discriminação social, acabou com o comércio retalhista (lojas e cantinas) de proximidade, nos musseques, moldando “ab initium”, o “modus operandi” da República Popular de Angola, criada sob o espectro da divisão de classes.
Os ditos revolucionários e libertadores, afinal tinham e têm até hoje, hábitos culinários ocidentais, numa clara demonstração do objectivo maior, não ser a de melhorar a vida e condição social dos pobres angolanos, mas a de substituírem-se aos colonialistas.
Os pobres, antes explorados pelo colonialismo português, mas com alguns ganhos, principalmente, os assimilados, passaram na RPA a ser discriminados, excluídos e confinados em bairros, onde, paulatinamente, foram assistindo à destruição, sob a retórica do poder popular, das infra-estruturas de saneamento, educação e saúde.
É hora de dar um basta nesta iniquidade, sob pena da actual divisão político-administrativa do território, proposta por João Lourenço, abrir as comportas para um maior endividamento do Estado, visando beneficiar os cofres da ideologia dominante (MPLA).
A Constituição impõe, no art.º 5.º (Organização do território), nos números 4: “A definição dos limites e das características dos escalões territoriais, a sua criação, modificação ou extinção, no âmbito da organização político-administrativa, bem como a organização territorial para fins especiais, tais como económicos, militares, estatísticos, ecológicos ou similares, são fixadas por lei”; 5: “A lei fixa a estruturação, a designação e a progressão das unidades urbanas e dos aglomerados populacionais”.
Estes propósitos fundantes, não estão na proposta de lei enviada à Assembleia Nacional, configurando uma banalização dos princípios estruturantes da alteração das unidades territoriais e o que elas devem comportar, para mudarem do estado; sanzala; comuna; município; província.
É preciso, um executivo emprestar higiene intelectual, na ousadia de alterações territoriais, começando por esclarecer, por exemplo, quais as infra-estruturas essenciais e imprescindíveis, para se sair de sanzala à comuna, desta a município e a província:
a) Quantos cidadãos de origem deve ter uma nova circunscrição; b) população; c) estradas terraplanadas; d) estradas asfaltadas; e) escolas, primárias, secundárias, ensino médio e ou universidades; f) centrais de tratamento de água; g) centrais eléctricas; h) pavilhões gimnodesportivos; i) indústrias; j) estruturas administrativas, etc..
Os verdadeiros patriotas, principalmente os com capacidade de intervenção pública, têm de deixar de lamentar, debaixo da água do chuveiro ou caneca, nas casas de banho, e vir a terreiro mostrar que a covardia e o medo, são um elixir para a consagração da discriminação e ditadura.
É hora dos legisladores, 47 anos depois, despirem as batinas partidocratas, assumirem-se como representantes das gentes, todas as gentes, dos vários povos e micro-nações, para defesa do sonho das liberdades democráticas.
É preciso mostrar, com patriotismo, o engodo de uma eventual DIVISÃO político-administrativa, quando, reconheçamos, não há ciência, nem modelos exemplificativos de capacidade de organização e gestão dos órgãos públicos e do território desde 1975, superiores aos herdados do período colonial.
Mais grave, o orçamento público, foi sempre mal gerido, para servir uma minoria. As receitas arrecadadas, com as riquezas naturais e os impostos, fruto de uma gestão danosa, irresponsável estão algemadas e privatizadas a favor dos inimigos da democracia.
Com este sequestro, a maioria dos autóctones, alimentando-se nos contentores, sem serviços básicos de saúde, ante um eventual avanço da boçalidade de divisão territorial, muitos dos novos e antigos municípios e províncias, converter-se-ão em cemitérios a céu aberto, por isso cabe à oposição responsável e aos parlamentares patriotas do MPLA, impedir o suicídio prematuro de inocentes e o agigantar dos corruptos da vez.
DIVISÃO É A LÓGICA DO ROUBO COM A AFECTAÇÃO DIRECTA
O MPLA demonstrando falta de humildade e muita petulância, começou a engendrar a lógica da divisão em 1978.
O que mudou desde aquela data? Nada! Melhor, o pior cenário!
A nova administração pública não foi responsável, quando, emotivamente, Agostinho Neto decidiu, através do Decreto n.º 48/78, de 4 de Julho, proceder à primeira divisão político-administrativa do país, transformando a Lunda em duas: Lunda Norte e Lunda Sul.
A Lunda, era então, predominantemente, bolsa da pujante indústria diamantífera, capitaneada pela empresa privada DIAMANG de capitais belgas e portugueses, com capital da sede empresarial, no Dundo.
O primeiro presidente da República Popular de Angola, com a nova província (Lunda Norte) prometeu construir uma nova capital: LUKAPA, já que a Lunda Sul não carecia, por ficar com Saurimo, que atendia a Lunda, antes da divisão.
Hoje, passados 44 anos, tempo de maturação e de experiência, que poderia ser exibida, como justificativa, face a uma gestão responsável (vide, Dubai e Catar), se alguém, no juízo perfeito, pode mostrar evoluções, em todos sentidos, nas duas Lundas?
Não existem, salvo, o crime económico de nunca se ter erguido uma estrutura no Lukapa, com a agravante de se ter deixado apodrecer, em contentores, materiais e equipamentos de construção civil e pré-fabricados, avaliados em mais 200 milhões de dólares.
Muito dinheiro à época, desviados por corruptos partidários. Hoje, nem um palmo do projecto resiste.
E na tese da incompetência atrair, em 1980, através da Lei 3/80 de 26 de Abril, José Eduardo dos Santos, também, sem qualquer estudo de viabilidade, decide-se por uma nova divisão administrativa, com a criação da 18ª província: Bengo.
Bastante contestada, pelos indígenas locais, que reivindicavam pertença a Luanda, agravada pela falta de consulta popular e, fundamentalmente, ausência de estruturas sociais e públicas, nem como município a cidade tinha, mas a teimosia do partido no poder é imperial, danosa e dolosa.
Uma voz abalizada, como o ancião Mendes de Carvalho e a Igreja Católica, juntaram-se aos protestos e, tentando corrigir o erro inicial, foi criada uma nova Lei, a n.º 29/11 de 1 de Setembro, que desanexou os municípios do Dande, Icolo e Bengo (terra de Mendes de Carvalho) e Muxima (santuário da Igreja Católica).
Até hoje, o Bengo é o reflexo da incompetência do MPLA, ao não passar de uma rua e das estruturas, maioritariamente, implantadas, no tempo colonial, pela ex-Açucareira de Bom Jesus.
Mas a vaidade umbilical de estragar o país com experiências ruinosas, não impediu que, através da Lei n.º 32/11 de 5 de Outubro fossem criados dois novos municípios, um em Benguela: Catumbela e outro na Huíla: Cacula.
Em 31 anos, o que as populações destas duas circunscrições ganharam? Nada, infelizmente, numa clara demonstração de não ter, o MPLA pergaminho de boa gestão e governação de coisa pública, salvo o enriquecimento de meia dúzia de malandros.
E como não há duas sem três, lá vai a nova liderança do MPLA, cunhar também, impressões digitais em divisão territorial, criando duas províncias e 417 municípios, sem que tenha cunhado os critérios, para a competente criação.
E, assim, de derrota em derrota, até à derrota final, por falta de estratégia, sentido de Estado e humildade, o país é confrontado com mais um novo desafio, competindo aos deputados, de todas as bancadas, provar, não serem camaleões, em função do chefe.
Impõe-se mostrar aos eleitores, o compromisso assumido, para a edificação de um país diferente, uma vez, o bom jogador de xadrez não poder jogar mal dominó, sob pena de arruinar a réstia de capital político, que ainda possui.
Em momentos de crise, espera-se da bancada maioritária (MPLA), um sentimento patriótico de união com as minorias (UNITA, FNLA, PRS), com objectivo de atingirem, a maioria de 2/3, não para consolidar a ditadura, madrinha da nova colonização, mas para a derrubar e lançar as sementes de um projecto-país.
Angola está carente de um novo poder constituinte capaz de eleger, pela primeira vez, uma verdadeira e abrangente Assembleia Constituinte, visando elaborar uma nova constituição, mais do que impor a criação de novos municípios, quando os existentes são a mais clara demonstração da incompetência da actual gestão governativa, que não tem o pobre no centro do orçamento, para a construção de um país livre, justo, conciliador, de direito e democrático.