De acordo com o manifesto das cargas de exportação, obtido pela agência de informação financeira Bloomberg, Angola, o segundo maior exportador de petróleo da África subsaariana, vai exportar menos de metade do que disse ambicionar quando aderiu à Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), em 2007.
“O declínio da produção de Angola é o resultado de uma falta de investimento na exploração, mas também do abrandamento da aposta na exploração desses poços em declínio durante os últimos anos”, comentou o analista da consultora Wood Mackenzie focado na África subsaariana, Dominic Smith.
“O perfil de produção de longo prazo de Angola vai continuar a cair se o investimento não subir significativamente”, alertou ainda o analista.
A produção de petróleo em Angola caiu de forma notória a partir de 2016, quando as petrolíferas internacionais cortaram drasticamente o investimento na sequência da queda dos preços de 2014, prejudicando principalmente os países onde a operação é mais cara devido às dificuldades técnicas de bombear petróleo das águas ultra-profundas.
A Nigéria continua a ser o maior produtor da África subsaariana, com Angola em segundo lugar desde que ultrapassou a Líbia em guerra, mas com a recuperação do país, a segunda posição de Angola está agora ameaçada, escreve a Bloomberg, notando que a grande maioria da produção destes dois países é para exportação e não para refinação.
Para além da concorrência da Líbia, Angola enfrenta também a ameaça das alterações climáticas, com a Agência Internacional de Energia a defender num relatório deste mês que se os países quiserem cumprir o objectivo de emitir zero dióxido de carbono em 2050, terão de parar já os investimentos nos novos projectos de petróleo e gás.
Um cenário que é uma má notícia para Angola, cujo petróleo representa mais de 90% das exportações, mas também para Moçambique, que aposta nos projectos de gás para garantir a sustentabilidade das finanças públicas e o desenvolvimento económico.
No passado dia 12 de Abril, Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANPG) disse que Angola vai colocar em licitação nove blocos petrolíferos, nas bacias terrestres do Baixo Congo e do Kwanza, com uma capacidade de cerca de 500 milhões de barris de petróleo para exploração.
A ANPG procedeu nesse dia a uma apresentação do potencial petrolífero nas duas bacias, numa sessão promocional para investidores, que contou com a presença do ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, Diamantino de Azevedo.
Na sua intervenção, o ministro manifestou o optimismo quanto ao futuro do sector petrolífero angolano, garantindo que a estratégia de atribuição de blocos nos próximos anos, vai continuar “agressivamente”, para o aumento consistente do volume de actividades e investimento no sector, de forma a ser mitigado o declínio de produção e reservas de hidrocarbonetos do país.
“Com o foco em assegurarmos a sustentabilidade contínua de produção e das actividades do nosso sector, estamos aqui hoje para dar continuidade à nossa estratégia de concessões, e reiteramos o nosso compromisso em continuar a trabalhar conjuntamente convosco, os nossos parceiros, na melhoria do ambiente de negócio, criando as condições necessárias para continuarem a investir neste nosso sector estável, competitivo e com taxas de retorno atractivas ao investimento”, disse Diamantino de Azevedo.
De acordo com o director de negociações da ANPG, Hermenegildo Buila, os termos de referência, informação mais relevante para os investidores, estava dividido em termos flexíveis e termos fixos.
“Apelamos aos investidores para apostarem nos termos flexíveis, porque são estes que lhes vão posicionar na melhor ‘pole position’ com base nas nossas propostas. Os termos fixos vão estar no contrato, mas não serão objecto de negociação”, frisou.
De acordo com o programa, as empresas deverão submeter, até às 17 horas do dia 9 de Junho, as suas propostas, para no dia seguinte serem apresentadas publicamente, em Luanda, as propostas submetidas. No dia 10 de Agosto serão divulgados os resultados das empresas vencedoras, para posteriormente se entrar na fase negocial.
“Esperamos ter até o final do mês de Novembro todos os decretos de concessão publicados e as autorizações para a assinatura dos contratos de partilha de concessão”, indicou Hermenegildo Buila.
Na apresentação aos investidores, o responsável referiu que o contrato definido por lei no processo de licitação é o “contrato de partilha de produção”, com características específicas para o desenvolvimento dos campos terrestres.
Segundo Hermenegildo Buila, o risco de investimento no ‘onshore’ é mais reduzido que no ‘offshore’, contudo vão ser atribuídos incentivos a este investimento.
Para estas licitações em particular, prosseguiu, a ANPG criou uma obrigação para todos os investidores, tanto para os que vão participar como investidores e como operadores, ou seja, uma quota fixa de entrada de um milhão de dólares (840 mil euros).
“Tem a ver com uma quota de entrada, todas as empresas interessadas em participar nas licitações 2020 terão que pagar uma quota de entrada no valor de um milhão de dólares. O que torna o processo transparente e livre de quaisquer dúvidas, porque dará acesso a todos os investidores à mesma informação”, referiu.
De acordo com o director do gabinete de Dados da ANPG, Lumen Sebastião, o interesse manifestado pelas empresas é grande, principalmente pequenas e médias empresas, entre as quais nacionais, quer na vertente operadora quer na vertente parceira.
A intenção de licitação dos Blocos CON1, CON5 e CON6, na Bacia Terrestre do Baixo Congo e dos Blocos KON5, KON6, KON9, KON17 e KON20, na Bacia Terrestre do Kwanza, foi anunciada a 31 de Dezembro de 2020 pela ANPG, no âmbito da Estratégia de Atribuição de Concessões Petrolíferas 2019-2025.
Petróleo, petróleo e… petróleo
Certamente para apostar na diversificação económica, o verdadeiro “calcanhar de Aquiles” de Angola, o Governo continua a apostar (quase) tudo nas concessões petrolíferas (extra)ordinárias, desde que “devidamente fundamentadas”, como garantiu no dia 3 de Setembro de 2019 o ministro Diamantino Pedro Azevedo, reafirmando o compromisso do executivo com o aumento da produção de hidrocarbonetos.
Diamantino Pedro Azevedo, que na altura falava em Luanda na abertura da licitação das concessões petrolíferas das bacias de Benguela e do Namibe, assinalou que a estratégia governamental para o sector prevê a possibilidade de “lançar extraordinariamente” licitações não constantes do calendário previamente definido.
Terão de ser “devidamente fundamentadas e aprovadas pelo departamento ministerial responsável pelo sector dos petróleos”, acrescentou o governante, no primeiro de quatro “roadshows” que Angola estava a promover para apresentar aos investidores os blocos petrolíferos das bacias marítimas de Benguela e do Namibe, bem como o novo quadro jurídico-legal e as actividades inerentes ao processo de licitação.
“Estas licitações vêm dar corpo à estratégia de reforçar o lançamento da exploração por forma a materializarmos o nosso compromisso para a manutenção e crescimento da produção, bem como a sustentabilidade económica do país”, realçou o ministro. Foi a primeira licitação a ser realizada desde 2011.
O novo modelo de organização do sector angolano do petróleo, aprovado em Agosto de 2018, previa a criação da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANPG), que foi criada em Fevereiro de 2019 e assume já a função de concessionária nacional.
“Impulsionar e intensificar a substituição de reservas visando atenuar o declínio acentuado na produção de hidrocarbonetos” é um dos objectivos do Executivo para os próximos anos, tendo sido aprovada neste âmbito uma estratégia de concessões petrolíferas para o período 2019-2025 que contempla também estudo de novas áreas, referiu o mesmo responsável.
A estratégia supõe também a reavaliação de blocos devolvidos à esfera do estado e “incentivar a recolha de dados adicionais em zonas produtivas na bacia do Congo”.
Diamantino Azevedo assinalou que África representa 7% da produção mundial de hidrocarbonetos e Angola “contribui substancialmente para essa produção”, realçando que a aposta tem sido criar um ambiente de negócio atractivo, o reforço da transparência, o combate à corrupção e a desburocratização.
“Continuamos a trabalhar nas condições para garantir o reforço da estabilidade contratual e o compromisso com os nossos parceiros com vista à reformulação do sector produtivo que inclui medidas como a separação da concessionária (ANPG)”, reforçou.
Esta reafirmação da importância do sector para a economia nacional, constitui a seu ver “evidência inequívoca” de que o país está “no caminho certo”.
Angola chegou a atingir uma produção recorde de um milhão e 900 mil barris de petróleo por dia, em finais de 2008, recordou na altura a administradora da ANPG, Natacha Massano.
Um dos motivos para o declínio da produção desde 2009, como salientou o presidente da ANPG, Paulino Jerónimo, foi precisamente a falta de licitações para novos blocos.
A actividade petrolífera em Angola começou em 1910, no “onshore” da bacia do Cuanza, tendo a primeira descoberta de “offshore” acontecido na década de 1960.
Natacha Massano sublinhou então que um dos grandes problemas da indústria petrolífera em África está relacionado com as incertezas na regulamentação, corrupção e transparência do sector, pelo que Angola “está a trabalhar no sentido de criar condições propícias para que a indústria continue a crescer num ambiente saudável e apropriado aos investidores”.
Surge neste contexto a ANPG, “cuja missão é gerir de forma eficiente e responsável os recursos de petróleo e gás do país e garantir o rendimento do estado”, continuou a mesma responsável.
“Precisamos de impulsionar a actividade de exploração em Angola. A exploração é a base da produção, é importante expandir o conhecimento geológico, para realizar a substituição e preservação das reservas” e incentivar o investimento, disse.
Segundo Natacha Massano, as autoridades angolanas estavam optimistas quanto ao potencial da bacia do Namibe, embora Namibe e Benguela não tenham tradicionalmente actividade petrolífera.
“Acreditamos que estamos perante um novo paradigma da história da produção petrolífera em Angola”, reforçou.
A Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, criada ao abrigo do Decreto Presidencial nº 49/19 de 6 de Fevereiro, é uma pessoa colectiva de direito público, do sector económico ou produtivo, que goza de personalidade e capacidade jurídica e é dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial.
A ANPG tem por objecto a regulação da actividade de exploração do petróleo e gás, sendo a Concessionária Nacional que tem por finalidade regular, fiscalizar e promover a execução das actividades petrolíferas, nomeadamente as operações e a contratação, no domínio dos petróleos, gás e biocombustíveis.
A mesma está sujeita à superintendência do Titular do Poder Executivo, exercida pelo Titular do Departamento Ministerial responsável do Sector dos Recursos Minerais e Petróleos.
A ANPG pretende ser numa entidade de referência internacional, promovendo um ambiente de negócio de excelência e local de escolha para os investidores, maximizando a criação de valor para o Estado através de uma gestão eficiente e responsável dos recursos de petróleo e gás.
Com a estratégia de atribuição definida para as concessões de 2019, o Governo de Angola e a ANPG esperavam, sobretudo, expandir o conhecimento geológico do país em áreas que, embora com pouca actividade de exploração, têm um significativo potencial petrolífero; comprovar o sistema petrolífero de ambas as bacias marítimas (Benguela e Namibe), designadamente da do Namibe; substituir as reservas produzidas; e incentivar o investimento neste sector de actividade, por forma a que se mantenha como um dos motores da economia e do desenvolvimento económico do país.
O regime legal e contratual existente em Angola, associado à evolução legislativa registada ao longo dos últimos anos, teve um impacto significativo na indústria e na relação dos operadores petrolíferos com o país e com as suas autoridades, tendo originado uma nova dinâmica no sector. Estas alterações criaram maior dinamismo na gestão do processo de concessões; maior flexibilidade contratual e fiscal; maior estabilidade contratual e maior eficiência na cadeia das operações petrolíferas.
Folha 8 com Lusa