O Presidente da República, na sua magistratura, conseguiu decepcionar-me, profundamente, com a mais recente rotação (remodelação) ministerial, num momento em que o país vive, um momento sensível. O senhor Presidente tem ou tinha a obrigação, como historiador, de saber, só existir um só povo e uma só nação, no complexado e assimilado conceito do MPLA.
Por William Tonet
No país plural, somos, orgulhosamente, vários povos e micro-nações (Ovimbundi; Bakongo), que harmoniosamente, coabitam o mesmo espaço geográfico, como casa comum.
Nem os colonos portugueses, alguma vez, ousaram, repetidamente, utilizar um refrão falacioso, pois tinham plena noção de os Ovimbundus terem uma cultura diferente dos Kimbundus, estes dos Bakongos, que difere da dos Tchokwes, que é distinta dos Yanhaneka Umbi e por aí adiante.
Definitivamente, o MPLA não tem dimensão da geografia dos povos que dirige, mas o senhor, como Presidente da República, que tão violentamente, vulgarizou este partido e regime que lidera Angola há 44 anos, poderia ousar mais, mostrando ser diferente dos camaradas que catalogou de marimbondos.
Como autóctone fiquei frustrado com a banalização da pasta da Cultura, ao ser fundida com o Ambiente e Turismo, quando deveria ser um ministério. Como está, nem António de Oliveira Salazar, com a sua PIDE fariam igual…
Ingenuamente, acreditei, fosse o senhor, capaz de recrear o conceito histórico-cultural dos povos de Angola e dar-lhes a devida solenidade. Ledo engano.
A mente de assimilado, complexado imperou na configuração, deste departamento, porquanto quem montou a engenharia, não percebe nada, rigorosamente nada, das diferentes matrizes culturais angolanas, de longe diferente da portuguesa.
Fundir a Cultura no Ambiente e Turismo é uma heresia descomunal, senhor Presidente da República e, mesmo na crónica discriminação do MPLA, em relação aos homens da Cultura de outras tribos políticas, no seu partido existem quadros com competência e sensibilidade, para a função, como Luís Kandjimbo, Lopito Feijó, Virgílio Coelho, entre outros.
Nunca me senti tão ofendido e a minha tristeza é maior porque os homens da Cultura que se deviam mostrar indignados e fazerem um abaixo-assinado, mantém-se calados. Covardemente calados!
É hora de indignação geral. É hora de dizer basta a esta vulgarização e desrespeito pela cultura dos nossos povos.
É triste reconhecer, mas em 44 anos de poder o MPLA fez, em muitos casos, menos pela cultura angolana, que o colono fascista português, basta ver o que era o carnaval dos indígenas, com os invejados de Bonga e o que é o carnaval do MPLA imposto aos povos.
Mais, o MPLA acabou com o Kutonoka e nada fez de melhor, pelo contrário, só piorou, quando monstros da música angolana, foram lançados e tiveram uma vida digna, com base na expressão cultural, nas línguas angolanas, que fosse hoje, nunca passariam de projecto.
Felizmente, Elias Dia Kimuezo nasceu no tempo colonial, viveu da música e teve projecção, com a venda de discos e direitos de autor, tivesse nascido em 1975, como outros grandes artistas, como David Zé, Urbano de Castro e tantos outros, com a formação que tem (e tinham) e teria talvez ficado pelas praças como Man Ré e outros cancioneiros populares que morrem, desgraçadamente, de paludismo, no Maria Pia ou outro hospital público, autênticos viveiros de morte, mas tendo as suas músicas tocadas em todas as rádios e festas.
Mais senhor Presidente da República. Esta junção é tão esdrúxula, pois além de mostrar o desconhecimento total do proponente, ela aumenta os custos, face às distâncias das sedes internacionais, bem como a possibilidade de obtenção de financiamentos bonificados e patrocínios internacionais.
A sede da UNESCO fica em Paris (França) e é lá que se deverá dirigir quem dirige o pelouro da Cultura, tendo, obviamente, de ter ciência de tão importante sector, o Ambiente, que está enquadrada no PNUA (Programa das Nações Unidas para o Ambiente tem a sede em Nairobi (Kénia) e a da OMT (Organização Mundial do Turismo) está localizada em Madrid, Espanha, isso é um desgaste para a titular, se tiver de, na mesma semana estar presente em dois eventos, sem poder delegar.
Faltou este olhar felino, mas principalmente, um verdadeiro sentimento de angolanidade.
Não está em cheque a pessoa, aliás é quadro da JMPLA, logo não é estranha a indicação. Mas uma jovem com competência em biologia, que se desafiou na pesquisa e teve sucesso, pode correr o risco de ser, aos 30 anos de idade, “assassinada”, num gabinete onde a sapiência, por vezes, é um risco, pois nos governos do MPLA, as pessoas só sabem que entram, nunca como saem e, na maioria das vezes, humilhadas, sem aviso prévio.
Senhor Presidente, acredito que os não assimilados, os não complexados, o estejam a vilipendiar, nesta hora, porquanto não subestimam a Cultura da multiplicidade dos povos de Angola.
Não está em causa, repito, a eventual capacidade académica da jovem bióloga Adjany Costa, apenas o facto de a Cultura não poder ser tratada como cozido à portuguesa. O homem como preservador da cultura erguida da formação gregária que o identifica e o formata, na sua dimensão étnica, sociológica, linguística e, obviamente cultural, considera ofensiva essa sarrabulhada e, gosta de lombi e árvores.
A árvore como fruto da semente, lançada pelo homem visando gerar alimentos, ar, beleza e harmonia, nada tem a ver com a cultura, tendo ela valor cultural.
Elas são a fonte de respiração, são as nossas sombrinhas no interior e, também, o tecto da maioria das embalas (tribunais consuetudinários), têm como vê o seu valor cultural, mas não são cultura.
Misturar a Cultura no Ambiente e Turismo é matar parte daquilo que queremos ser, enquanto povos viventes num mesmo espaço cultural.
Presidente, como historiador se ler as obras de Homero, o grande poeta grego, verá que ele mistifica a cultura grega em dois poemas Ilidia e Odisseia, lá, qualquer dirigente, sedento e orgulhoso da sua cultura, pode encontrar um aroma diferente, aliado a inteligência e educação dos povos, escravos da sua cultura.
Por favor Presidente, não misture alhos com bugalhos. Poderia, colocar o Ambiente na Agricultura, para que este ministério obrigue cada agente florestal, no derrube de uma árvore o plantio de duas.
Presidente, nós já temos várias Angolas, numa Angola neocolonizadora, subjugadora que, agora, quer com a omissão geral assassinar o que resta do interior das Angolas profundas, a favor da Angola das elites. Não faça isso, seja, pelo menos, neste quesito, por 24 horas, Presidente de todos angolanos e povos.
Não me orgulho dessa Angola que tem vergonha das línguas angolanas, que elege uma estrangeira, como única e língua nacional, que abomina as culturas angolanas, elegendo uma cultura nacional de viés ocidental, em defesa de um micro segmento “assimilado”, desde o tempo colonial, complexadamente identificado, que aloja, ainda nas conservatórias de registo civil, um livro de nomes portugueses, excluindo os nomes angolanos e africanos. Vergonhosa e criminosa atitude institucional.
Sei, ser cultura, implantada, infelizmente, por Agostinho Neto, no MPLA, rejeitar o diálogo, as ideias e as sugestões dos outros, na lógica do confronto e imposição.
Eu não me converti ao “antimepelismo”, mas seguramente, não defendo, no todo ou em parte, nenhum partido presunçoso, que pensa ser Angola, uma coutada partidocrata, indiferente ao reconhecimento de erros, maldades e, quando chega a hora, da hora, sempre levanta a luz vermelha da baioneta ao invés da luz branca das liberdades e da democracia.
Senhor Presidente, oiça uma vez, pelo menos, as mulheres e homens de cultura do seu próprio partido.
Sei que um homem discriminado como eu, despojado da maioria dos direitos e garantias fundamentais, pelo seu partido, sem direito a qualquer reforma; militar e pública, que ainda sobrevive, nesta selva urbana, não colherá, a sua sensibilidade, mais a mais, não sendo bajulador do seu numeroso exército, mas oiça. Seja humilde e corrija o erro, como angolano.