O Presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou hoje não ter novas informações sobre uma possível visita sua ou do primeiro-ministro a Angola, mas salientou que ambos têm “um primeiro semestre muito cheio” em termos de agenda, “até Setembro, Outubro”.
“N ão tenho nenhuma informação adicional. Sabe que estas programações de visitas, então num ano tão intenso e tão cheio como é este, da parte do senhor primeiro-ministro por um lado, e da parte do Presidente da República por outro, essa programação é complexa”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa.
O chefe de Estado, que falava aos jornalistas no final de uma visita ao Comando Aéreo, no Parque Florestal do Monsanto, em Lisboa, acrescentou: “Temos um primeiro semestre muito cheio. Entre chefes de Estado que vêm a Portugal e visitas ao estrangeiro, eu diria que até Setembro, Outubro, está muito cheio. Veremos”.
Marcelo Rebelo de Sousa foi também questionado sobre a decisão da operadora de televisão por satélite angolana Zap, de Isabel dos Santos, empresária, Presidente do Conselho de Administração da Sonangol e filha do seu homólogo (nunca nominalmente eleito e no poder há 38 anos) José Eduardo dos Sanyos, de interromper – como o Folha 8 ontem noticiou – a difusão dos canais SIC Internacional e SIC Notícias nos mercados de Angola e Moçambique.
O Presidente da República alegou ainda não dispor de informação sobre esse assunto: “Ainda não. Espero talvez entre hoje e amanhã [quinta-feira] ter, mas até agora ainda não tenho”.
Interrogado se falou recentemente com o Governo angolano sobre o estado das relações bilaterais, o chefe de Estado respondeu que “nas relações entre países há um princípio muito importante que é o da discrição”.
Reconheça-se que Marcelo Rebelo de Sousa é o político português mais habilitado (a par do primeiro-ministro António Costa) para não só cimentar como também alargar as relações com o regime de sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos. Marcelo sabe que – do ponto de vista oficial – Angola ainda é o MPLA, e que o MPLA ainda é Angola. Portanto… Siga a fanfarra.
Angola é um dos países lusófonos com a maior taxa de mortalidade infantil e materna e de gravidez na adolescência, segundo as Nações Unidas. Mas o que é que isso importa a Marcelo Rebelo de Sousa? Importante é saber de facto que a filha do presidente soma e segue, mesmo quando se sabe que o regime é um dos mais corruptos do mundo. Ou será por isso mesmo?
Aliás, muitos dos angolanos (70% da população vive na miséria) que raramente sabem o que é uma refeição, poderão certamente alimentar-se com o facto de a filha do presidente ser também dona dos antigos colonizadores, para além de assistirem um dia destes, ao vivo e a cores, ao beija-mão de Marcelo Rebelo de Sousa ao “querido líder”.
É claro que, segundo a bitola de Marcelo Rebelo de Sousa, continua a haver bons e maus ditadores. Muammar Kadhafi passou a ser mau e Eduardo dos Santos continua a ser bom. E que mais podem querer os bajuladores que enxameiam os areópagos políticos de Lisboa?
Portugal continua de cócoras perante o regime esclavagista de Luanda, tal como estava em relação a Muammar Kadhafi que, citando José Sócrates, era “um líder carismático”.
Será que alguém vai perguntar a Marcelo Rebelo de Sousa o que pensa dessa farsa a que se chama democracia e Estado de Direito em Angola?
Certo será que, nesta matéria, Marcelo Rebelo de Sousa continua a pensar da mesma forma que Cavaco Silva, José Sócrates, Passos Coelho, Paulo Portas ou António Costa, para quem Angola nunca esteve tão bem, mesmo tendo 20 milhões de pobres.
Custa a crer, mas é verdade que os políticos portugueses (com excepção dos do Bloco de Esquerda) fazem um esforço tremendo (se calhar bem remunerado) para procurar legitimar o que se passa de mais errado com as autoridades angolanas, as tais que estão no poder desde 1975.
Recorde-se que até o general secretário do comité provincial do MPLA para Organização Periférica e Rural, Bento dos Santos Kangamba, igualmente sobrinho do Presidente Eduardo dos Santos, elogiou a eleição nominal (coisa que em Angola nunca existiu) de Marcelo Rebelo de Sousa para Presidente da República de Portugal, apelando ao seu papel como “mediador” nas relações entre os dois países.
“Neste momento não temos que ter dirigentes com muito fogo-de-artifício entre os dois países e sim com calma e paciência para ultrapassarmos os problemas. Portugal não pode ser o país onde se criam problemas a Angola, mas onde se resolvem os problemas de Angola, espero esse papel de mediador dele”, disse o general num português que, compreensivelmente, teve de ser traduzido para… português pelos jornalistas.
Bento dos Santos Kangamba destaca, quando convém ao regime, a “política muito madura” em Portugal, que “beneficia a democracia” do país, tendo em conta as eleições que deram a vitória a Marcelo Rebelo de Sousa.
“Vamos bebendo a experiência de Portugal, de democracia aberta”, apontou, deixando o desejo de ver Marcelo Rebelo de Sousa realizar uma visita de Estado (leia-se de bajulação) a Angola.
“Seria um muito bom sinal. Não tem como os portugueses estarem contra Angola, não tem como os angolanos estarem contra os portugueses. Nós estamos condenados a viver juntos, a estar juntos, é a mesma língua, vivemos juntos, sãs as mesmas famílias, os nomes são iguais”, recordou o general do clã Eduardo dos Santos.
Angola e Portugal têm vivido vários momentos de estratégica tensão nas relações bilaterais nos últimos anos, que levaram mesmo o Presidente angolano a anunciar, em 2013, o fim da intenção de estabelecer uma parceria estratégica com o país. Nada como pôr o velho colonizador em ordem…
“Quando se ganham umas eleições em Portugal, a primeira ligação que se tem de fazer é conversar com os dirigentes angolanos e criar aquele ambiente muito forte entre irmãos”, disse ainda o general Kangamba, certamente ciente de que – mesmo com a crise petrolífera – quando Angola espirra Portugal apanha uma pneumonia.
De facto, como certamente Marcelo Rebelo de Sousa não se esquecerá de enaltecer, Angola é um exemplo do que de mais evoluído se conhece em termos de democracia, rivalizando – eventualmente – com a Coreia do Norte e com a Guiné Equatorial. Veja-se, por exemplo abonatório da tese regimental, que esta noção de democracia é cimentada pelos três mais sublimes dignitários do país: O Presidente do MPLA (José Eduardo dos Santos), o Titular do Poder Executivo (José Eduardo dos Santos) e o Presidente da República (José Eduardo dos Santos).
Folha 8 com Lusa