Os três maiores partidos políticos angolanos: UNITA, MPLA, CASA-CE, realizaram os respectivos congressos, visando afinar a máquina para 2017, mas todos têm ciência de pairar no ar o clima da suspeição e desconfiança, inspirado na tese comunista de monopólio da sociedade.
Por William Tonet
Estes actores, infelizmente, cada um ao seu nível, não acreditam na lisura do processo preparatório, conduzido pelo MAT (Ministério da Administração do Território), em flagrante violação a Constituição, que delega o registo oficioso à Comissão Nacional Eleitoral, enquanto órgão independente.
Feliz, ou infelizmente, este MPLA, descaracterizado, na sua matriz, não mente, porque a batota está no seu ADN, logo é institucional.
Assim, exigir-se, como noutras latitudes, que o partido do regime, em nome da democracia, da transparência, do combate à fraude e da defesa da ética, tão ansiadas pelos cidadãos, não ande em contramão, seria uma mera ilusão.
O MPLA, perdão, este MPLA, descaracterizado, não mente, quando em causa está a ameaça de poder perder a manutenção do poder, não se coibindo de manchar as mãos de sangue.
O histórico, está aí e, mais presente por deter as rédeas do país.
Em 1964, Agostinho Neto é acusado de ter mandado enterrar vivo, o então vice presidente do MPLA, Matiás Miguéis, deixando-o com a cabeça de fora, sucumbindo depois de ter resistido, durante dois dias, na base de Brazzaville.
Este assassinato teve reflexos, na morte de Deolinda Rodrigues, por retaliação da FNLA, pois na altura, face às desavenças com Neto, Matiás Miguéis, tinha-se alistado na FNLA de Holden Roberto.
Em 1968, Agostinho Neto, por desentendimentos com o comandante Paganini, é acusado de ter inaugurado mais uma morte cruel, lançando-o, na companhia de outros camaradas, numa fogueira acesa, na Frente Leste, acusado de feiticismo.
Ninguém em sã consciência pode desmentir este facto, sob pena de ter de provar como terá sido o seu assassinato, o de Estrela, de Zigueró e demais camaradas. Cai, assim, por terra, a tese da primeira pedra, ter sido de Jonas Savimbi, que viria, só 20 anos depois, a converter-se, caricatamente, como o melhor aluno de Agostinho Neto, no quesito de matanças em fogueiras, quando fez igual no coração da Jamba, mandando queimar, também pelos fundamentos de Neto, homens e mulheres acusando-os de feitiçaria e tentativa de tomada de poder.
No ano de 1974, quando o MPLA/Neto estava dividido e fragilizado, em três grandes facções: Facção presidencial (de Agostinho Neto); Revolta do Leste (do Comandante Katuwe Mitue e Daniel Chipenda) e Revolta Activa (Pinto de Andrade e Gentil Viana), reunidos, no I Congresso democrático do MPLA, sob mediação de Kenneth Kaunda, em Lusaka, antevendo uma derrota histórica, Neto retirou-se antes das eleições, para Luanda, num magistral plano gizado por Nito Alves, apresentando-se como o líder do movimento, quando, na realidade, Daniel Júlio Chipenda foi o presidente democraticamente eleito, pela massa militante eleitoral, face ao quórum.
Ao chegar a Luanda, o presidente eleito (Chipenda) seria considerado faccionista, perseguido e banido, tendo sido assassinados grande parte dos seus seguidores.
Nesta mesma senda, por ironia do destino, dois anos depois: 1977, o homem que o havia salvo da guilhotina, em Lusaka (Nito Alves), para que pudesse proclamar a independência nacional, seria barbaramente assassinado sem direito a julgamento, com uma feroz perseguição a todos que fossem considerados nitistas, como eu, na flor dos meus 16/17 anos de idade ou do Joy, ainda mais novo, encarcerado na Casa da Reclusão com apenas 12 anos.
Foi a maior chacina política, cerca de 80 mil pessoas assassinadas, depois da II Guerra Mundial, protagonizada por Agostinho Neto, um líder obcecado pelo poder, um negro complexado, que utilizava e jogava com as minorias.
A FNLA de Holden Roberto também tem os seus fantasmas.
Como se pode verificar, mais do que levantarem as chamas e fagulhas do ódio, das acusações mútuas, as forças políticas, precisam de afastar os fantasmas do passado, reconciliarem-se com o presente e preparar, no hoje, as sementes corajosas da ética, da moral, da transparência, da honestidade, das liberdades e da grande avenida da democracia.
Temos de construir um futuro harmonioso, sermos capazes de impedir que quem hoje está no poder, tenha medo de uma transição pacífica, ordeira e positiva, como defende o líder da CASA-CE, Abel Chivukuvuku, e governe, de forma anti-patriótica, permitindo o roubo do erário público, a corrupção institucional, para que numa mudança, receando retaliações, consiga fugir do país, deixando os cofres vazios e o caos.
Que os políticos sejam capazes de unir forças, amnistiando os erros do passado, que sejam audazes para desconfiscar os bens dos adversários políticos e outros cidadãos e que procedam a devolução de oportunidades iguais para todos.
Eduardo dos Santos ainda pode, se visionário, ter um papel, nesta arquitectura.
Finalmente, depois de serem expulsos os espíritos negativos, os ódios, os recalcamentos, num grande Njango, se abracem, se irmanem, se conciliem, os irmãos de todas as cores e matizes políticas, inaugurando a nova aurora, que tanto carece, este sofrido e dilacerado espaço territorial: Angola, para que ninguém mais tenha medo dos fantasmas das perseguições e assassinatos, na alternância do poder, porque a nova bandeira terá as cores da JUSTIÇA, da LIBERDADE e da DEMOCRACIA.
Obrigado Carlos Pinho pela sua lúcida análise. Só um Angolano escreveria este texto. Esperamos continuar a ser dignos da sua leitura e das suas opiniões. Preferimos ser salvos pela crítica do que assassinados pelo elogio.
Continuam a só olhar para um dos lados da questão, esquecendo-se dos luso descendentes naturais de Angola. Muitos pretendiam viver no novo país embora não se identificando com qualquer dos três movimentos. Mas estes, por falta de líderes à altura, não perceberam a necessidade de adoptarem uma estratégia que fugisse à vingança pura e dura. Faltou a Angola um Mandela e estas quatro décadas mostram à saciedade essa falha. O presente texto enferma do mesmo mal e Angola continuará a arrastar-se penosamente em conflitos internos sejam ideológicos, sejam tribais, sejam rácicos, em vez de “se pegar o touro pelos cornos”. Enfim, aproximam-se outras quatro décadas com as recorrentes questiúnculas.