Caro General Geraldo Sachipengo Nunda. Recordando os tempos idos de 1974 e 1975, para já não falar de outros voos anteriores, continuo a ter dúvidas sobre se ainda existe em si alguma coisa dos tempos do Centro Evangélico de Sapessi, município da Nharêa, e também da sua actividade militar e política entre 1974 e 1992.
Por Orlando Castro
Será que enquanto Chefe do Estado Maior das Forças Armadas, se esqueceu da Angola profunda, daquela onde o povo, o seu povo, o nosso povo, é gerado com fome, nasce com fome e morre pouco depois com fome?
Será que se esqueceu que o seu actual presidente (José Eduardo dos Santos), a sua Constituição, o seu regime, considera um crime contra o Estado ter opiniões diferentes das oficiais? Será por isso que tem de ser escravo de barriga cheia? Lembra-se que o Mais Velho dizia que era preferível morrer livre do que viver escravo?
Embora já o devesse ter feito há muito tempo, não será altura de se interrogar das razões que levam a que em Angola uns poucos tenham muitos milhões, e muitos milhões não tenham nada?
Quando o Senhor General diz que são prioridades das FAA a preparação operativa, combativa e de educação patriótica, transmitindo a vontade e a determinação do Exército de vencer os obstáculos e constrangimentos para que os efectivos disponham de melhores condições, está a dizer o que pensa ou apenas a recitar uma encomenda superior?
Ainda hoje me custa a acreditar que tenha sido sincero quando manifestou a sua satisfação pela morte de Jonas Savimbi. Compreendo que o tenha feito, não fosse o MPLA arrepender-se das mordomias que lhe dera, dá e dará enquanto se mantiver fielmente controlado pelo regime.
Em tempos escrevi que o General Geraldo Sachipengo Nunda estava muito bem onde está, mesmo tendo sempre consigo os louros de ter traído Jonas Savimbi, a UNITA e o povo que ela representava. Quero, contudo, acreditar que estava e estou enganado. Isto porque ainda hoje me custa a acreditar que ao ver o seu, o nosso, povo a caminhar para a escravatura, nada faça.
O regime angolano do MPLA é, de facto e de jure, um exemplo de tudo quanto contraria a democracia. Prende e mata inocentes, inventa tentativas de golpe de Estado, descalça-se para contar até 12 mas confunde os pés. Não deixa, contudo, de satisfazer as verdadeiras democracias para quem é melhor, muito melhor, negociar com ditaduras.
Nunca é exagero perguntar: Em alguma democracia séria, em algum Estado de Direito, se vê o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas dizer, em plena campanha eleitoral, que um dos candidatos – mesmo que seja o actual presidente da República – marcou a sua postura “por momentos de sacrifício e glória”, permitindo “a Angola preservar a independência e soberania nacionais, a consolidação da paz, o aprofundamento da democracia, a unidade e reconciliação entre os angolanos, a reconstrução do país, bem como a estabilidade em África e em particular nas regiões Austral e Central do continente”?
Não. Nas democracias – como o Senhor General sabe – seria impossível o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas ter manifestações públicas deste género, tomando partido por um dos candidatos. Em democracia, os militares são apartidários.
Mas como Angola não é uma democracia, muito menos um Estado de Direito, o Chefe Estado Maior das Forças Armadas, General Geraldo Sachipengo Nunda, fez isso mesmo, campanha em prol de um dos candidatos, no caso – obviamente – José Eduardo dos Santos.
E voltará a fazê-lo em 2017 (se houver eleições) e em qualquer outra altura, assim determine o presidente Eduardo dos Santos, legitimado pelo facto de estar no poder desde 1979 sem nunca ter sido nominalmente eleito?
Talvez não. Quero acreditar que não.
Embora não vá à missa do general António “Zé” Maria, bem gostava que fosse verdade a tese que ele defende, através dos Serviços de Inteligência e Segurança Militar (SISM), de que o General Nunda privilegia a formação e promoção de oficiais provenientes da UNITA, com o suposto objectivo de controlar efectivamente o exército e, desse modo, facilitar a tomada do poder pela via militar.
É claro que os generais “provenientes” (das FALA), como são chamados nas FAA, juram a pés juntos que isso é mentira. E é pena que seja mentira.
Em Junho de 2014, o Maka Angola escrevia: «Na última reunião do Conselho de Estados-Maiores, que decorreu no Comando da Marinha de Guerra de Angola, em Luanda, o conselheiro do CEMGFAA, general Isidro Peregrino Chindondo Wambu, tomou a palavra e manifestou a sua indignação. “Chefe, precisamos de saber se, nas FAA, ainda estamos juntos ou não” – assim intimou Wambu o seu superior, general Nunda. A resposta do general Nunda foi pedir paciência ao seu conselheiro. Nunda falou sobre a gravidade das intrigas que visam a instabilidade política no seio das FAA e referiu-se à ausência, no encontro, dos seus promotores. “O caso já está na mesa do presidente da República”, concluiu o CEMGFAA.»
Dizia ainda o Maka Angola: «Três generais têm merecido atenção especial por parte do SISM, nomeadamente o general Wambu, conselheiro do general Nunda; o general Arlindo Samuel Kapinala “Samy”, presidente da Comissão Superior de Disciplina Militar (CSDM) do EMGFAA; e o general Vasco Mbundi Chimuco, actual conselheiro do comandante do Exército para Obras e Infra-Estruturas do EMGFAA. O general Wambu, antigo chefe da secreta militar da UNITA, integrou as FAA em 1992, ao abrigo dos Acordos de Bicesse. Por sua vez, os generais Samy e Chimuco foram dois dos mais importantes cabos de guerra de Jonas Savimbi, até à sua morte em combate, no Moxico, em 2002. O general Samy desempenhou o cargo de chefe do Estado-Maior Adjunto do Alto Estado Maior General da FALA, ao passo que o general Chimuco foi o comandante da Região Militar 57, no Moxico. Ambos ingressaram nas FAA na sequência dos Acordos do Luena, datados de 2002.»
Pois é Caro General Geraldo Sachipengo Nunda. Recordo-me de, em 1975, Jonas Savimbi me ter dito que “Angola não se define – sente-se”. Curiosamente, lembra-se?, o Senhor General assistiu à conversa. O seu, o nosso, povo não quer que o senhor General o defina, mas tão só que o sinta.