O Presidente João Lourenço felicitou no dia 4 de Agosto de 2019 o médico angolano Filomeno Fortes pela sua eleição como director do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) de Portugal. (Quase) todos os angolanos – mesmo os que o MPLA não considera angolanos – se juntaram às felicitações. Filomeno Fortes dá hoje uma entrevista ao Jornal de Angola onde, espante-se, afirma que “é preciso investir mais na Saúde”. Quem diria?
Numa nota postada na sua conta Twitter, o chefe de Estado angolano, igualmente Presidente do MPLA (partido no Poder desde 1975) e Titular do Poder Executivo, considerou que a eleição representou o reconhecimento da dedicação de Filomeno Forte aos estudos e ao trabalho e que “este é o caminho do sucesso”.
“Parabéns ao prof. Doutor Filomeno Fortes pela conquista, ao atingir por mérito o prestigiado lugar de director do Instituto de Medicina Tropical de Portugal”, escreveu o Presidente João Lourenço.
A eleição de Filomeno Fortes, especialista em doenças tropicais e coordenador do doutoramento em Ciências Biomédicas da Universidade Agostinho Neto, em Luanda, ocorreu depois de um concurso internacional em que teve como outro finalista o médico brasileiro Roberto de Andrade Medronho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Na apresentação pública da sua proposta de acção para o IHMT para o período de 2019-2023, Filomeno Fortes defendeu o reforço do prestígio nacional e internacional do instituto, bem como as parcerias com os PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa).
Filomeno Fortes já desempenhou vários cargos em Angola, incluindo os de director nacional de Controlo de Endemias, chefe do Departamento de Controlo de Doenças da Direcção Nacional de Saúde Pública e director do Programa de Controlo da Malária.
A nível internacional foi nomeado, em 2012, secretário-geral da Federação Internacional das Doenças Tropicais.
Filomeno Fortes é o primeiro estrangeiro a assumir a direcção do IHMT, instituição que coordena todos os programas de saúde a nível da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), cuja presidência rotativa foi agora assumida por Angola.
Fundado em 1902, o Instituto dedica-se ao ensino e à investigação da saúde pública, medicina tropical, ciências biomédicas e epidemiologia, com especial incidência na ligação com os países de língua oficial portuguesa.
Tem também um programa de mestrados, doutoramentos e pós-graduações com cerca de 500 alunos, mais de metade dos quais frequentam as aulas à distância e com recurso às tecnologias de informação e comunicação.
A maior parte dos alunos são brasileiros, moçambicanos e angolanos, mas o IHMT tem estudantes de mais de 20 nacionalidades. O organismo fornece ainda consultas de medicina tropical.
Malária e outras doenças… regimentais
Uma equipa de investigadores em Portugal descobriu que o parasita malária e a bactéria ‘E.coli’ evitam a sua destruição através da modulação de proteínas receptoras da célula hospedeira. Enquanto isso, em Angola a malária continua a ser a principal causa de morte e a incompetência dos governantes o principal problema.
Num artigo publicado em Setembro de 2018 na revista científica “Scientific Reports”, os investigadores explicam que até agora sabia-se que várias bactérias e parasitas se servem da maquinaria da célula hospedeira para seu proveito, evitando a sua própria destruição, ou fagocitose, sem que em muitos dos casos se saiba exactamente como e que agora foi descoberto o mecanismo pelo qual estes microrganismos subvertem a fagocitose da célula hospedeira.
“O sistema imunitário tem como função defender as células de agentes patogénicos externos ao organismo. A primeira linha de defesa é operada por células como os macrófagos, os neutrófilos e as células dendríticas, cuja função é fagocitar (“fagos” = comer e “citos” = célula), ou, por outras palavras, internalizar e destruir os agentes patogénicos” adiantou a equipa de investigadores do Centro de Estudos de Doenças Crónicas (CEDOC-NMS|FCM) da Universidade Nova de Lisboa e do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), liderada por Duarte Barral (CEDOC-NMS|FCM).
A fagocitose é o englobamento e digestão de partículas sólidas e micro-organismos por células, processo que nos humanos está ligado directamente ao processo imunológico.
Duarte Barral explicou num comunicado que o estudo representa “um valioso contributo para o crescente conhecimento não só das estratégias usadas por estes microrganismos, mas também dos mecanismos de defesa das nossas células contra eles”.
“Futuramente, este conhecimento poderá ter importância no desenvolvimento de novas estratégias para combater infecções provocadas por este tipo de microrganismos”, adiantou.
Num estudo anterior, os investigadores tinham já demonstrado que o parasita da malária ‘Plasmodium berghei’, e a bactéria ‘E. coli’, ao infectarem as células do hospedeiro levam ao aumento da expressão de proteínas da célula hospedeira, cuja consequência é a inibição da fagocitose e consequentemente da destruição dos parasitas.
Duarte Barral, salienta que “é interessante que uma bactéria e um parasita tenham evoluído independentemente estratégias semelhantes de escapar à sua destruição, provavelmente por ser a forma mais eficiente de o conseguir; isto revela um conhecimento profundo dos mecanismos celulares por parte dos microrganismos, resultado de milhões de anos de co-evolução”.
Malária, Jornal de Angola e Filomeno Fortes
Em Abril de 2012, o Jornal de Angola (esse órgão de referência mundial) escrevia que as autoridades sanitárias angolanas previam iniciar, a partir de 2015, o processo de pré-eliminação da malária, a doença tropical que mais óbitos provoca no país. Em manchete escrevia: “Malária em Angola em vias de extinção”.
O coordenador do Programa de Luta contra a Malária (Filomeno Fortes) explicou então que a probabilidade de Angola iniciar o processo de pré-eliminação da doença reside na contínua redução de casos da doença. Notável.
Filomeno Fortes, que falava à margem da reunião extraordinária da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) sobre saúde, frisou que as autoridades angolanas e os seus parceiros estavam empenhados em baixar, cada vez mais, o índice de mortalidade por malária no país.
“A manter-se este nível de redução, a partir de 2015 podemos pensar na possibilidade da pré-eliminação da doença no país”, sublinhou (com os resultados que se conhecem) Filomeno Fortes.
O médico disse então que, há dez anos, o país registava 20 mil óbitos por ano, mas actualmente (2012) o número baixou para uma média de seis mil, devido ao esforço desenvolvido pelo Executivo (como acontece desde 1975) no sector da saúde, que estabelece a redução de casos de paludismo entre as populações.
Filomeno Fortes disse acreditar que, em 2013, iria haver uma diminuição da mortalidade por malária, cuja cifra deve fixar-se em cerca de quatro mil óbitos por ano.
O médico revelou haver falsos diagnósticos de malária devido à existência de certos vírus que provocam sintomas semelhantes aos causados pelo paludismo.
“Realizámos estudos que comprovam a existência de alguns vírus que provocam quadros clínicos parecidos com os da malária, como febres, dores de cabeça e articulares”, acentuou Filomeno Fortes. Sobre este assunto, salientou que, por não haver capacidade para a realização de um diagnóstico diferencial, certos técnicos de saúde continuam a diagnosticar falsamente esses casos como malária.
O presidente da reunião de peritos da SADC, Augusto Rosa Neto, disse que foi aprovada a assinatura de um memorando de entendimento para a criação de laboratórios supranacionais de referência, em centros regionais de excelência.
“Neste momento, existem laboratórios na África do Sul, Zimbabwe e Botswana, que vão atender os casos de malária, tuberculose e VIH/Sida dos países membros da SADC”, informou.
Os laboratórios nacionais vão continuar a funcionar normalmente, mas os que não têm condições para realizar exames podem enviar para os países membros que dispõem de capacidade.
O Lesoto, as Ilhas Maurícias e as Seychelles são os três países da SADC que já não registam casos de malária, enquanto Moçambique é aquele que regista o maior índice de casos. Na altura, a directora nacional adjunta de Saúde Pública de Moçambique, Rosa Marlene, apontou como causas principais a situação epidemiológica e as questões ecológicas resultantes do clima.
“Moçambique é uma região que tem grandes rios e muita água na costa. Por essa razão, já tivemos dez milhões de pessoas infectadas com malária. Neste momento, estamos com três milhões de casos”, sublinhou a responsável moçambicana.
A doença é uma das principais causas de morte em Moçambique, razão pela qual tem sido prioridade do governo coordenar os métodos de prevenção e de cura.
“Este encontro tem vantagens porque, para conseguirmos eliminar a malária, as acções têm de ser concertadas e, com a troca de experiências e informação, podemos chegar a melhores soluções”, acrescentou Rosa Marlene.