Só se pode ser do… Estado!

O presidente do Conselho de Administração da empresa de construção angolana Omatapalo, Carlos Alves, negou este domingo, em declarações à Lusa, ser uma “empresa do Estado” e beneficiar de adjudicações directas, como é acusada, mas antes uma “sua parceira”. Tem razão. Todos têm razão. Desde logo porque, num país que é governado há 45 anos pelo mesmo partido, em que o Estado e o MPLA são uma e a mesma coisa, como é que se pode acusar alguma empresa de ser do… Estado?

“N ão somos beneficiados em nada, somos sim um parceiro do Estado, como sempre fomos e seremos, e onde estamos assim o fazemos, não só em Angola, como noutros países. Sempre que é necessário responder a qualquer desafio, nós fazemo-lo”, disse Carlos Alves.

O responsável salientou que a empresa trabalha com quem quer os seus serviços e, tal como outras empresas nacionais e internacionais que têm capacidades, está sempre disponível e sujeita a ter contratações simplificadas.

“Mas, o processo de contratação simplificada não significa que seja adjudicação directa porque são feitas consultas e concursos”, explicou. Em linguagem comum, em Angola, é o mesmo que se passa com as “eleições”. Todos concorrem mas quem ganha sempre é o MPLA.

Além disso, Carlos Alves ressalvou que a Omatapalo é uma empresa que “tem capacidade instalada, capacidade de mobilização muito grande, cumpre as normas e regras e tem todas as certificações necessárias”, o que faz com que, quando existam obras de emergência que o Estado/MPLA precisa de fazer e que são investimentos de interesse, seja uma das empresas que possa ser consultada, tal como outras do mesmo sector.

O empresário, membro do Comité Central do MPLA, desde 2004, membro do Conselho da República e do Bureau Político do MPLA, que se tornou governador da Huíla, Luís Manuel da Fonseca Nunes, não diria melhor.

A título de exemplo, o administrador recordou que a Omatapalo executou, por contratação simplificada, a Arena de Luanda para o Mundial de Hóquei, em 2013, construindo três infra-estruturas desportivas, uma delas o pavilhão multiusos de Luanda com 12 mil lugares em nove meses. “Nenhum concorrente ou colega aceitou este desafio e nós aceitámos e fizemos com qualidade”, frisou.

Já sobre a ligação entre a actividade da construção civil e vários escândalos de corrupção em Angola que tem sido noticiada, o administrador rejeitou fazer comentários por “não ser conhecedor suficiente”, entendendo ser matéria da Procuradoria-Geral da República.

Carlos Alves admite ainda a entrada da empresa no sector mineiro. “Há conversações, sim, temos muitas minas em Angola e pode acontecer a qualquer momento, desde que seja uma mais-valia para nós, para o Estado e para os parceiros que possam integrar o projecto”, assumiu.

Dizendo que o interesse neste sector não é de hoje, mas de há “alguns anos”, o responsável referiu que a Omatapalo vai querer explorar esta área de negócio, devendo ser uma realidade “dentro de pouco tempo”, previsivelmente no início do próximo ano.

A empresa está a trabalhar e a analisar vários projectos, tendo tido reuniões sobre a possibilidade de integrar alguns, mas ainda não há nada concretizado, garantiu.

Carlos Alves disse estar a estudar os investimentos em que pode apostar capacidade, em que pode melhorar o desempenho e o que é mais interessante para o grupo. “Estamos sempre disponíveis e analisamos todos os projectos que possam trazer mais-valias ao grupo e ao Estado”, ressalvou, acrescentando que a área mineira tem um “potencial enorme”, daí o interesse da Omatapalo e de outras empresas, acrescentou.

Mas, além desta nova área de negócio, a Omatapalo tem investido noutras, apesar de o seu principal ramo de actividade ser a construção civil, nomeadamente no sector agro-pecuário, industrial, metalomecânica e ambiente.

“Estamos a investir fortemente na área das madeiras e carpintaria, área na qual pensámos duplicar a capacidade instalada da empresa até final do ano. Pensamos ter uma unidade completa em Luanda para produção de mobiliário de escritório e sofás, entre outros produtos, para isso, estamos a adquirir novas instalações que nos vão permite ter essas capacidades”, adiantou.

Na metalomecânica, sector que já explora, a empresa angolana está a construir uma nova unidade em Luanda, dado a unidade principal estar instalada no Lubango, distante da capital.

Já na agro-pecuária, a Omatapalo está a “intensificar” o investimento na Fazenda Mumba, dedicada à produção de carne de corte, para a ter em pleno funcionamento em 2030, disse o empresário. Em processo negocial está também a integração da empresa num consórcio para a construção da refinaria de Cabinda.

Em Portugal, onde a empresa está em expansão e tem em carteira vários projectos imobiliários, Carlos Alves revelou estar a criar um centro de investigação e de start-up. Devendo ficar sedeado em Matosinhos, no distrito do Porto, este centro, ainda em fase de projecto, terá como foco a inovação, ambiente e tecnologia, referiu.

Apesar de um “assinalável crescimento” em Portugal, o administrador é peremptório em dizer que o país onde a empresa mais factura “é obviamente” Angola.

A Omatapalo é maioritariamente detida pelo actual governador da Huíla, Luís Manuel da Fonseca Nunes. Constituída na Huíla, em 2003, por José Cordeiro, Manuel Henriques, Adilson Henriques, Rui Vieira e Luzia Rosa, a estrutura accionista da Omatapalo foi-se alterando ao longo dos anos. Em 2012, Luís Manuel da Fonseca Nunes adquiriu 64,6% da Omatapalo através da sua empresa Socolil Lizena e assumiu a presidência do Conselho de Administração.

Passados três anos, em 2015, o cidadão português Carlos Alberto Loureiro Alves criou, em Malta e como proprietário único, a sociedade anónima Highways Investment. Em 2016, a Highways adquiriu 33% da Omatapalo, enquanto a Socolil consolidou a sua posição com 65% do capital. Os restantes 2% ficaram com a Omatapalo Engenharia e Construções.

Criada em 1990, a Socolil é uma empresa familiar detida em 60% por Luís Nunes e em 40% pela sua mulher, Maria Nunes.

A 12 de Setembro de 2018, o presidente João Lourenço nomeou Luís Nunes para o cargo de governador da Huíla. A partir dessa data, Luís Nunes passou a fazer parte das Pessoas Expostas Politicamente (PEP). Três meses depois da sua nomeação, a 20 de Dezembro do mesmo ano, Luís Nunes renunciou formalmente, em Assembleia-Geral, ao cargo de PCA da Omatapalo, sendo substituído por Carlos Alves.

A Omatapalo – Engenharia e Construção, SA foi fundada em Agosto de 2003, na província do Huíla. E foi nesta província que Luís Manuel da Fonseca Nunes, natural de Caconda, o 12º governador da província da Huíla, se forjou como um empresário que gere um grupo com 12 empresas ligadas aos sectores agro-industrial, da madeira, metalurgia, construção e engenharia civil.

Pioneiro na constituição de associações empresariais no país, impulsionado pelo então comissário provincial da Huíla, Lopo do Nascimento, quando o país se abriu para a economia de mercado, foi um dos mentores da primeira feira nacional agro-pecuária do país, inaugurada pelo então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, em 1986. Este evento impulsionou a criação da Associação Agro-pecuária Comercial e Industrial da Huíla, em 1991.

Para além de empresário e fazendeiro, Luís Manuel da Fonseca Nunes lidera a Cooperativa de Criadores de Gado do Sul de Angola e faz parte do Comité Central do MPLA, desde 2004. É membro do Conselho da República e do Bureau Político da referida formação política.

Lançou-se no ramo empresarial em 1986 e criou a sua primeira empresa três anos depois, o grupo Socolil, que emprega mais de três mil pessoas, estimando-se que acumule uma fortuna superior a mil milhões de dólares.

Folha 8 com Lusa

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One Thought to “Só se pode ser do… Estado!”

  1. Entre uma empresa do estado, ou parceira do estado, a diferença é inferior ao salto de uma pulga. Agora que esta empresa tem sido bastante beneficiada, em detrimento das demais, isso não é segredo para ninguém

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