Para Portugal, Angola é (e sempre foi) o MPLA

A UNITA pediu hoje ponderação na preparação da visita do primeiro-ministro português, António Costa, a Angola, recordando que o país já está em pré-campanha para as eleições gerais previstas para Agosto e receando a conotação com um apoio ao partido no poder.

Por Óscar Cabinda (*)

Bem lembrado embora, como sempre, seja chover no molhado. António Costa, igualmente líder do PS (partido irmão do MPLA na Internacional Socialista) para além de vir a despacho junto de sua majestade o dono do país vai, como está estabelecido nos “acordos de bajulação” assinado por todos os partidos portugueses com assento parlamentar (a excepção é o Bloco de Esquerda) e o regime de Eduardo dos Santos, dar cobertura ao MPLA.

A posição da UNITA foi transmitida hoje à Lusa pelo seu porta-voz, Alcides Sakala, depois de o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, ter admitido, em Luanda, que “foi mandatado pelo presidente Eduardo dos Santos” para organizar a visita de António Costa que poderá ocorrer ainda nesta Primavera.

“Nós entendemos que é preciso muita, muita ponderação, porque se de um lado a cooperação entre Estados é necessária, por outro lado Angola está a viver um período de pré-campanha”, disse Alcides Sakala.

A UNITA pretende desde já salvaguardar que as visitas – além do primeiro-ministro, também se prevê a posterior deslocação oficial do Presidente da República – “não configurem um apoio político ao partido no poder”, num momento que é, defendeu, de “uma espécie de Governo de gestão” em Angola.

“É preciso muita ponderação relativamente a esses programas que eventualmente se venham a preparar, de visita ao nosso país. Angola está numa fase de transição e vivemos já um período muito intenso de pré-campanha”, advertiu o porta-voz da UNITA.

“Queremos evitar o que aconteceu com o doutor Cavaco Silva em 1991, que, enquanto primeiro-ministro [português], foi utilizado pelo MPLA, apresentando-o num comício, no Moxico”, recordou – e bem – Alcides Sakala.

As eleições gerais em Angola estão previstas para Agosto próximo e o cabeça-de-lista do MPLA, partido no poder desde 1975, será o actual ministro da Defesa Nacional, general João Lourenço. No poder em Angola desde Setembro de 1979 sem nunca ter sido nominalmente eleito, José Eduardo dos Santos já não será candidato do MPLA nestas eleições.

“Não colocamos em causa as relações entre os dois Estados, obviamente, mas os timings têm que ser devidamente ponderados”, concluiu o deputado e porta-voz da UNITA.

Recorde-se que, de acordo com o guião recebido dos dirigentes do MPLA, Augusto Santos Silva manifestou a sua satisfação pelos resultados da sua visita, reiterando as relações “muito densas e ricas” entre os dois países, nas áreas político-diplomática e económica.

Segundo o chefe da diplomacia portuguesa, a sua visita a Angola visou fazer a síntese de vários encontros sectoriais, de preparação para a visita do primeiro-ministro, que por sua vez criará as condições para a visita de Estado do Presidente da República português.

“O que nós acertámos basicamente nas conversas havidas, quer a nível dos dois ministros das Relações Exteriores, quer depois na minha conversa na audiência que o Presidente da República me concedeu, o que nós conviemos foi que marcaríamos a visita para a primeira data possível. A minha expectativa é que a visita do primeiro-ministro de Portugal a Angola se realize ainda nesta Primavera”, referiu.

Tal como Cavaco Silva, José Sócrates, Passos Coelho e Paulo Portas, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa são agora, reconheça-se, os políticos indicados para não só cimentarem como também alargarem as relações de bajulação com o regime. Ambos sabem que – do ponto de vista oficial – Angola ainda é o MPLA, e que o MPLA ainda é Angola. Portanto… Siga a fanfarra.

Angola é o país lusófono com a maior taxa de mortalidade infantil e materna e de gravidez na adolescência, segundo as Nações Unidas. Mas o que é que isso importa a Marcelo Rebelo de Sousa e a António Costa? Importante é saber de facto que a filha do presidente soma e segue, mesmo quando se sabe que o regime é um dos mais corruptos do mundo. Ou será por isso mesmo?

Aliás, muitos dos angolanos (20 milhões) que vivem na pobreza e que raramente sabem o que é uma refeição, poderão certamente alimentar-se com o facto de a filha do presidente vitalício ser também dona dos antigos colonizadores, para além de assistirem ao beija-mão de Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa ao “querido líder”.

Os pobres em Angola estão todos os dias a aumentar e a diminuir. Aumentam porque o desemprego aumenta, diminuem porque vão morrendo. Mas a verdade é que esses angolanos não contam para Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa, tal como não contam para António Guterres que cá veio pedir a bênção do “escolhido de Deus” para chegar a secretário-geral da ONU.

Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa sabem que o presidente angolano está no poder desde 1979 sem ter sido nominalmente eleito. Mas isso pouco ou nada importa… pelo menos por enquanto.

É claro que, segundo a bitola de Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa, há bons e maus ditadores. Muammar Kadhafi passou a ser mau e Eduardo dos Santos continua a ser bom. E que mais podem querer os bajuladores que enxameiam os areópagos políticos de Lisboa?

Portugal continua de cócoras perante o regime de Luanda, tal como estava em relação a Muammar Kadhafi que, citando José Sócrates, era “um líder carismático”. Talvez um dia Portugal chegue à conclusão que, afinal, Eduardo dos Santos também é um ditador.

Será que alguém vai perguntar a Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa o que pensam desse eufemismo a que se chama democracia em Angola?

Certo será que, nesta matéria, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa continuam a pensar da mesma forma que Cavaco Silva, José Sócrates, Passos Coelho ou Paulo Portas, para quem Angola nunca esteve tão bem, mesmo tendo 70% dos angolanos na miséria.

De facto, como há já alguns anos dizia Rafael Marques, os portugueses só estão mal informados porque querem, ou porque têm interesses eventualmente legítimos mas pouco ortodoxos e muito menos humanitários. Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa não escapam à regra.

Custa a crer, mas é verdade que os políticos portugueses (há, é claro, excepções) fazem um esforço tremendo (se calhar bem remunerado) para procurar legitimar o que se passa de mais errado com as autoridades angolanas, as tais que estão no poder desde 1975.

(*) Com Lusa

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