Observadores terão um árduo e penoso trabalho

A Comissão Nacional Eleitoral (CNE) credenciou já mil observadores nacionais e internacionais, para as eleições gerais de 23 de Agosto, entre os quais o ministro das Relações Exteriores de Angola. O itinerário turístico e gastronómico está a ser ultimado pelo MPLA.

Georges Chikoti foi hoje credenciado como coordenador da comissão de acompanhamento dos observadores internacionais. Não está mal. Um ministro a acompanhar os (supostos) observadores de modo a que, por exemplo, nenhum deles seja apanhado no meio do capim pelos carnívoros kissondes.

O governante angolano realçou a forma organizada como está a decorrer o processo de credenciação, salientando que a comissão que coordena vai acompanhar e criar condições para que os observadores internacionais sejam devidamente acomodados e realizem o seu trabalho de observação. Isso incluirá certamente roteiros turísticos e gastronómicos de alto gabarito.

“Acho que o processo está devidamente bem preparado, bem organizado, acho que agora restam a realização das próprias eleições, mas penso eu que em termos da sua própria organização a Comissão Nacional Eleitoral fez o seu trabalho”, disse o ministro. E fez bem, senhor ministro. E fez muito bem, ou não fosse uma sucursal do regime.

Por sua vez a porta-voz da CNE, Júlia Ferreira, considerou positivo o processo, iniciado no domingo, de credenciamento dos observadores nacionais e internacionais, a decorrer neste momento.

Júlia Ferreira disse que não estão credenciados mais observadores nacionais por debilidades internas de algumas organizações.

“De todo o modo temos estado a criar facilidades, temos estado a trabalhar até aos fins-de-semana no sentido de possibilitar que, num tempo considerado razoável, nós consigamos finalizar esse processo, porque depois pretendemos também fazer a formação, a capacitação dos observadores e queremos todas essas tarefas que a CNE planificou sejam feitas em tempo útil”, disse.

Dava jeito ser em tempo útil. Isso dava! Mas se não pude também não haverá problemas se as tarefas de capacitação dos observadores terminarem já depois das eleições. Para o que eles vêm cá fazer estará sempre bem.

O processo de credenciamento prevê só de elementos nacionais até 3.000 pessoas, hoje foram credenciados elementos de igrejas e altos funcionários e dignitários do Ministério das Relações Exteriores na qualidade de observadores nacionais.

Angola vai realizar eleições gerais a 23 de Agosto deste ano, com seis formações políticas concorrentes – MPLA, UNITA, CASA-CE, PRS, FNLA e APN – contando com 9.317.294 eleitores em condições de votar. Os que não estiverem em condições de votar, tal como em 2008 e 2012, poderão mesmo assim votar desde que seja no MPLA.

A CNE constituiu 12.512 assembleias de voto, que incluem 25.873 mesas de voto, algumas a serem instaladas em escolas e em tendas por todo o país, com o escrutínio centralizado nas capitais de província e em Luanda.

Na lista do MPLA, no poder em Angola desde 1975, entregue à CNE figuram convites a dirigir a partidos como PS, PSD, PCP e CDS-PP, de Portugal, mas também ao PT, do Brasil, ao partido comunista chinês, ao PSOE, de Espanha, ao PAICV, de Cabo Verde, à FRELIMO, de Moçambique, à SWAPO, da Namíbia, e à Internacional Socialista (da qual faz parte), entre outras forças políticas da República do Congo, do Vietname, do Zimbabué e da Suécia.

Para confirmar que PSD, CDS-PP e PCP são impolutas, honoráveis e equidistantes organizações, recorde-se que estes partidos rejeitaram no dia 8 de Janeiro de 2016 um voto de condenação apresentado pelo Bloco de Esquerda sobre a “repressão em Angola” e com um apelo à libertação dos activistas então detidos. Neste caso o PS absteve-se.

Este voto do Bloco de Esquerda, porém, contou ainda com o apoio de seis deputados socialistas (Alexandre Quintanilha, Isabel Moreira, Inês de Medeiros, Isabel Santos, Pedro Delgado Alves e Wanda Guimarães), além do representante do PAN (Pessoas Animais e Natureza).

O PCP (irmão gémeo do MPLA) demarcou-se totalmente desta iniciativa do Bloco de Esquerda, apresentando uma declaração de voto na qual se advertiu que outras forças políticas “não poderão contar” com os comunistas “para operações de desestabilização de Angola”.

“Reiterando a defesa e a garantia das liberdades e direitos dos cidadãos, cabe às autoridades judiciais angolanas o tratamento de processos que recaiam no seu âmbito, de acordo com a ordem jurídico-constitucional, não devendo a Assembleia da República interferir sobre o desenrolar dos mesmos, prejudicando as relações de amizade e cooperação entre o povo português e o povo angolano”, lê-se na declaração de voto apresentada pela bancada ortodoxa, marxista, leninista, norte-coreana e bolivariana do PCP.

Por outro lado, com a abstenção do PSD e do CDS-PP, a Assembleia da República de Portugal aprovou um voto apresentado pelo Bloco de Esquerda condenação pela morte de três activistas curdas e feministas Sêvê Demir, Pakize Nayir e Fatma Uyar na sequência de uma operação militar turca.

Para além de pôr de joelhos e de mão estendida políticos como José Sócrates, Passos Coelho, Paulo Portas, Jerónimo de Sousa e Cavaco Silva, José Eduardo dos Santos juntou agora ao seu séquito e de forma oficial o primeiro-ministro António Costa e, ao que tudo indicia, o próprio Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Com todo este suporte bajulador, Eduardo dos Santos primeiro e João Lourenço a seguir enchem o peito e a garantem que os angolanos não vão deixar que “os mentirosos, os demagogos e os caluniadores cheguem ao poder”.

“Aqueles que teimam em fomentar agitação, instabilidade e negar o que toda a gente tem diante dos olhos terão a devida resposta nas urnas”, avisou José Eduardo dos Santos. E se não for nas urnas eleitorais será nas urnas funerárias.

Mas, afinal, quem são os mentirosos, demagogos e caluniadores? De uma forma geral são todos aqueles que não alinham no MPLA. São, por isso, todos aqueles que – entre uma panóplia de razões – não querem que Angola seja um dos países mais corruptos do mundo, que tenha o maior índice mundial de mortalidade infantil, que tenha 20 milhões de pobres.

Folha 8 com Lusa

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